Cotidiano

E o fedor voltou

Diário da Manhã

Publicado em 30 de setembro de 2018 às 00:25 | Atualizado há 2 semanas

Todo ano é a mesma his­tória. No segundo semes­tre, com o calor intenso e poucas chuvas, o odor insuportá­vel na região do bairro Goiânia 2 fica mais forte, incomodando todo mundo que circula e mora próxi­mos à Estação de Tratamento de Esgoto de Goiânia (ETE), à indús­tria de processamento de alimen­tos Cargill-Unilever, entre outras empresas e ao Rio Meia Ponte.

Desta vez, em pleno início da primavera, o mau cheiro tomou conta, de forma insuportável nos últimos dias na região Norte de Goiânia. Do fim de tarde ao nascer do dia fica difícil respirar, deixan­do todos indignados com as auto­ridades em relação ao mau cheiro que se repete todo ano com mais intensidade neste período.

Da indignação surgiu na inter­net, mais especificamente em gru­pos do WhatsApp, um movimento dos moradores do Goiânia 2 e bair­ros da região próxima a ETE e da empresa Cargill-Unilever. Os mo­radores criticam as autoridades por receberam as denúncias e não to­marem nenhuma atitude concreta para eliminar o problema existente há mais de 15 anos na região.

A aposentada Maria Helena, 55 anos está indignada com a falta de ação do poder público diante de um crime que, segundo ela, está sen­do cometido, repetidas vezes, ano a ano. “Já são muitos anos que con­vivemos com esta situação. É insu­portável o mau cheiro. A gente nem consegue dormir direito. Os diver­sos órgãos fiscalizadores vem aqui, olham e não acontece nada. A Câ­mara Municipal de Goiânia faz uma CEI e nada. A Delegacia de Prote­ção ao Meio Ambiente faz inquéri­to e nada. O Ministério Público tam­bém move ação e nada. A Agência Municipal de Meio Ambiente e a Se­cretaria Estadual de Meio Ambiente também não tomam nenhuma pro­vidência. Aí eu pergunto: O que está por trás desta paralisia?”, questiona a moradora indignada.

Em entrevista ao DM, o enge­nheiro civil Tiago Maranhão, 27 anos, que mora no setor Goiânia 2 há 18 anos afirmou, que na verda­de, o fedor ocorre todo dia às vezes com mais ou menos intensidade. “Nos últimos cinco anos parece que o cheiro fez foi piorar. É um odor que incomoda muito. Eu já cheguei a sair de casa só pra fugir do cheiro. Também já cancelei festa de aniver­sário porque era impossível realizar alguma comemoração com aquele cheiro horrível”, afirma.

Nas redes sociais, várias pessoas postaram mensagens indignadas com a falta de ação do poder pú­blico diante de um crime contra o Meio Ambiente que vem afetando a vida dos moradores de toda a região.

Na última terça-feira, o Movi­mento Cidadania Plena apresen­tou um manifesto contra a em­presa Cargill-Unilever. No texto do abaixo assinado, com tradução para o inglês o Movimento prome­te “protestar contra a empresa Car­gill-Unilever que está poluindo o ar de Goiânia, cidade brasileira. Os gases tóxicos têm provocado mui­to mal a população. Pedimos ajuda para divulgar nossas ações contra esta empresa para que seja inter­rompida a poluição do ar”, frisam, prometendo manifestações suces­sivas e permanentes em frente a empresa, tanto presencialmente como de forma virtual.

Candidatos nestas eleições tam­bém gravaram vídeos e postaram nas redes sociais prometendo, se eleitos, lutar para acabar com o mau cheiro insuportável nesta época do ano na região Norte onde está o bairro Goiânia II. Em um post uma moradora observa: “Já percebi que na direção da indústria, duran­te o dia, uma ou duas (ou nenhu­ma) torres de chaminés são ativas, e na madrugada é possível visua­lizar muito mais torres ativas, dis­pensando muito mais fumaça que durante o dia…e concidentemen­te, temos mais mal cheiro duran­te à noite, durante a madrugada e pela manhã”, observa a moradora.

Histórico de ações sem objetivos atingidos

 

Já foram realizadas, nestes últi­mos 15 anos, muitas ações e inves­tigações sobre a procedência do mau cheiro mais concentrado nes­ta época do ano na região, sempre envolvendo a falta de tratamento de esgoto no Rio Meia Ponte, as ativi­dades da ETE e da empresa Cargill –Unilever. Audiências públicas, re­uniões, Inquéritos, e outras ações como manifestações dos morado­res não conseguiram convencer as autoridades a tomar atitudes em re­lação a algo errado e que tem que ser resolvido de forma mais ágil em prol do bem estar da comunidade.

Neste ano foi realizada uma Comissão Especial de Inquérito na Câmara Municipal de Goiânia que também não conseguiu impe­dir que o mau cheiro continuasse. Os dados da Cei que responsabili­zaram a Saneago, ETE, e empresas que descartam irregularmente de­jetos no Rio Meia Ponte, serviram de embasamento para uma in­vestigação mais profunda da De­legacia Estadual de Repressão à Crimes Contra o Meio Ambien­te (DEMA). O delegado Luziano Carvalho concluiu o inquérito há cerca de 2 meses responsabilizan­do a Saneago e a ETE pela falta de tratamento do esgoto que polui o Rio Meia Ponte, mas não houve elementos, segundo o delegado, para acionar as empresas.

“O tratamento do esgoto no Rio Meia Ponte na região é feito só de forma primária, o que contri­bui para o mau cheiro nesta épo­ca do ano onde ocorrem menos chuvas. Com os elementos que ti­nha em mãos apresentados pela CEI e com o trabalho de investi­gação que fizemos, a gente con­cluiu que a Saneago é a princi­pal responsável pelo mau cheiro e pela poluição no Rio Meia Pon­te por não fazer o tratamento de esgoto de forma adequada. Ago­ra é com a justiça. Não podemos fazer mais nada”, diz o delgado.

Ao todo, cerca de 40 bairros de Goiânia são afetados pelo mau cheiro na região próxima à ETE e a empresa Cargill-Unilever . “É um odor tão forte que parece en­xofre”, afirmam alguns moradores. Muitos falam que a culpa vem da Estação de Tratamento de Esgo­to (ETE), outros apontam que é a Cargill-Unilever, e tantos outros dizem que são as empresas que jo­gam os seus resíduos no Rio Meia Ponte. E mesmo com tantas ações, e mais de 15 anos de investiga­ção, o fedor continua. Fica então a pergunta feita por uma indigna­da moradora no início desta maté­ria. O que está por trás deste mau cheiro na região Norte de Goiânia?

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