Presos trabalhando na construção de novo fim
Diário da Manhã
Publicado em 14 de março de 2018 às 23:21 | Atualizado há 7 anos“Embora ninguém possa voltar atrás e fazer um novo começo, qualquer um pode começar agora a fazer um novo fim.” Esta frase está num quadro da área de tecelagem do setor industrial da Penitenciária Odenir Guimarães (POG), e o autor dela é Chico Xavier.
A pessoa que colocou este quadro no local foi muito feliz em seu gesto. Fato que pode ser comprovado nas centenas de presos que trabalham nessa indústria nas atividades de tecelagem, confecção de uniformes e serviços gerais. Afinal, o trabalho e a educação representam os meios mais importantes para se promover a ressocialização do preso.
Esses dois instrumentos de remição de pena – um dia a menos na pena a cada três trabalhados ou 12 horas de estudos formais ou capacitação profissional – representam a oportunidade para o preso fazer acontecer o que Chico Xavier diz no final de sua frase: “…qualquer um pode começar agora a fazer um novo fim”.
Só que, para uma maior reconstrução de “um novo fim”, o caos que reina nos presídios precisa ser eliminado. Esse caos é tão diabólico que, em 2012, o então ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, fez uma revelação assustadora: “Do fundo do meu coração, se fosse para cumprir muitos anos em alguma prisão nossa, eu preferia morrer”. Outro relato seu está relacionado à escola do crime que existe nos presídios: “Quem entra em um presídio como pequeno delinquente muitas vezes sai como membro de uma organização criminosa para praticar grandes crimes”.
Esse “pequeno delinquente” a que se refere Cardozo não pode ser colocado numa mesma cela em que estão os bandidos profissionais, os quais devem ser combatidos do mesmo modo em que atuam. A separação dos presos ocasionais dos presos profissionais infelizmente ainda não acontece em nossos presídios. Em 2007 no Pará, por exemplo, uma adolescente 15 anos, detida por tentativa de furto, ficou numa cela com 30 homens e lá foi torturada e estuprada.
Esse “novo fim”, cuja materialização envolve o poder público e a sociedade de modo geral, pode tirar o Brasil do ranking negativo de pessoas encarceradas, cuja passagem pelos presídios só as empurram para os braços do mundo do crime. O Brasil até junho de 2016, conforme dados do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias, tinha 726.712 presos, fato que coloca o país em terceiro lugar nesse ranking sinistro, tendo à sua frente a China e os Estados Unidos, ambos respectivamente com 1.649.804 e 2.145.100 presos.
Estive nesse setor industrial do POG dias atrás, acompanhando o presidente da Amma, Gilberto Marques Neto, que esteve no local a convite do promotor de justiça Marcelo Celestino, que é autor de um projeto que busca a utilização de presos do regime aberto para trabalharem na manutenção de parques e jardins públicos de Goiânia. Projeto este em fase viabilização (bem próximo de acontecer). Senti um lampejo de esperança vendo centenas de homens e mulheres trabalhando nas mais diversas atividades.
Esse gesto da Prefeitura de Goiânia, de buscar a utilização de presos para cuidar de parque e jardins públicos, mostra engajamento social dela, mostra sua vontade em ajudar na ressocialização dos presos, mostra sua vontade em ajudar muitos presos a construírem um novo fim para a vida deles. Se há presídios europeus fechados por falta de presos e alguns até sendo transformados em hotéis, é porque lá as ações de ressocialização realmente foram colocadas em prática, ou seja, não ficaram apenas no papel.
(Sinésio Dioliveira, jornalista e assessor de imprensa da Amma)
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