Semana de arte moderna
Diário da Manhã
Publicado em 16 de fevereiro de 2018 às 23:25 | Atualizado há 7 anosQuase cem anos (1922), neste mês de fevereiro, precisamente no dia 17, aconteceu em São Paulo uma verdadeira revolução nas artes, a Semana de Arte Moderna, que trouxe muitas polêmicas no universo literário, não só paulista como brasileiro. Ela causou espécie ao público conservador, uma vez que abalou os padrões culturais que imperavam naquela época. O último dia provocou vaias da plateia que aos gritos diziam “Foi, não foi”, numa imitação ao barulho dos sapos. A Semana realizou-se no Teatro Municipal, em São Paulo. Foram apresentadas obras – durante três noites – de escritores jovens como Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Sérgio Milliet e Plínio Salgado (ultraconservador) e o maestro e compositor Heitor Villa-Lobos. Também, no saguão do teatro foram expostos trabalhos de artistas plásticos, como Tarsila do Amaral, Anita Malfati (pintura) e Vitor Brecheret (escultura). Os motivos principais dessa Semana foram as críticas implacáveis a escritores e artistas que já eram consagrados nos meios acadêmicos, todos parnasianistas. O que ocorreu então? Isso fez com que dezenas de acadêmicos da tradicional Faculdade de Direito do Largo de São Francisco vaiassem os participantes. O interessante é que esses estudantes obtiveram o apoio de alguns elementos da colônia italiana de São Paulo, que identificavam o modernismo com o futurismo europeu. Este tinha ligação com o movimento fascista que começava a se movimentar na Europa. Graça Aranha, que abriu os trabalhos, respeitado escritor àquela época, disse no discurso de abertura estas palavras: “da libertação do nosso espírito sairá a arte vitoriosa”. E, acrescentou, “e os primeiros anúncios da nossa esperança são os que oferecemos aqui a vossa curiosidade, que são estas pinturas extravagantes, estas esculturas absurdas, esta música alucinante, esta poesia aérea e articulada. Maravilhosa aurora”. O público ainda não havia vaiado e se manteve em silêncio durante toda oração do escritor. Entretanto, tudo se modificou na noite seguinte quando Oswald de Andrade aos berros disse: “Carlos Gomes é horrível”, em alusão ao compositor lírico campinense. A plateia explodiu em vaias e gritos. Aí, um momento estranho quando Villa-Lobos regeu sua Sonata nº 2 para violoncelo e piano e o Trio Segundo, de casaca e chinelos, para um público estarrecido. Por sua vez, o poeta Sérgio Milliet declamou, enquanto os assistentes soltavam uma salva de relinchos e miados, como se fossem animais. Seus idealizadores foram Paulo Prado, sua mulher Marinette, ricos cafeicultores paulistas e o artista plástico Emiliano di Cavalcanti. Essa Semana teve o objetivo justamente de assustar a burguesia que vivia às custas de seus lucros. Na época essa turma foi patrocinada por um jornal conservador – Correio Paulistano – que pertenceu como órgão do Partido Republicano Paulista, e cujo redator político era Menotti del Picchia, outro astro dessa Semana, Semana esta que até hoje tem sido cantada e decantada pelos que cultuam a literatura brasileira.
(Luiz Augusto Paranhos Sampaio, membro da Academia Goiana de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás e Academia Catalana de Letras da União Brasileira dos Escritores. E-mail: luizaugustosam[email protected])
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