“Ser inteligente é ser honesto”
Diário da Manhã
Publicado em 13 de fevereiro de 2018 às 22:09 | Atualizado há 2 semanas“Tem muito segredos e histórias na cidade de Goiás. E as pessoas só vão lá para comer pastel!”, exclama indignado Joaquim Graciano, mostrando certa impaciência com o fato do passado não ter tanto valor atualmente. “Americano do Brasil era um dos homens mais inteligentes do Brasil. E é pouco lembrado”, continua ele, que contra o esquecimento históricos tem feito a sua parte: é autor de mais de cinco livros sobre a história do Estado. Agora, aos 83 anos, lança a obra “Resgatando a História de Goiás–Crônicas do Passado e Presente”. Nela, conta, de forma direta, simples e “sem firulas”, sobre um passado que, apesar de não parecer, em muito implica as situações vivenciadas no presente.
Muitos dos assuntos da obra são contados a partir da biografia do autor, que cruza com diversos acontecimentos memoráveis e, remetem e contextualizam os locais onde passou parte da vida: a cidade de Goiás, Bela Vista e Goiânia. Ao contar suas raízes, é que inunda o leitor de informações, que comprovam certo pioneirismo deste Estado, como o fato de Goiás ter tido o segundo hospital público do Brasil, o Hospital São Pedro de Alcântara, estabelecido em 1825.
Os primórdios de Goiânia, onde se podia nadar no Lago das Rosas e Botafogo também são relembrados. Assim, o autor alfineta o que chamamos de progresso mostrando preocupação ambiental. Em outros trechos, a exemplo do que exalta a solidariedade goiana, diz: “quando um avião queria aterrissar à noite, todos os carros partiam para o aeroporto, para iluminar a pista e facilitar o pouso do avião”. E por aí vai.
Como o escritor tem muito o que contar, pois viu a capital aos poucos, transformar-se numa metrópole, na vida escolar, acadêmica e profissional. Pois frequentou locais emblemáticos na história de Goiânia. Estudou no tradicional Lyceu de Goiânia, formou-se na Faculdade de Direito, da UFG, na Rua 20, no Centro. Enquanto estudante, engajou-se no movimento estudantil, como secretário geral do Centro acadêmico XI de Maio da Faculdade de Direito.
Lecionou português no Ginásio Municipal de Goiânia e Direito na Faculdade Anhanguera e Católica (agora PUC). Foi membro do Conselho Nacional de Desportes e Juiz do Tribunal de Justiça da Federação Goiana de Futebol e auditor e conselheiro Substituto do Tribunal de Contas por mais de 40 anos.
Mas foi uma experiência como jornalista antigo Diário de Notícias, de Alfredo Nasser, (hoje o Diário da Manhã) que lhe trouxe a preferência pelo jeito simples de escrever. Aos 83 anos, ele conta que não digita mais na sua velha companheira a antiga olivetti. São suas netas que digitam enquanto ele dita. “Nao escrevo a mão porque depois de velho a letra vai ficando miúda e a gente tem que traduzir o que escreveu”, revelou sorrindo.
Apesar da visão frágil, sua memória e humor estão afiados. E tem projetos de escrever novos livros de caráter histórico. E aos 83 anos não acha que ser velho é desvantagem e, nem se irrita–a exemplo de alguns vilaboenses–quando chamam a cidade que nasceu de Goiás Velho. “O que é velho é bom. Não está me vendo? Cheguei aos 83 anos. Pouca gente chega”, esbraveja em tom descontraído.
Foi para saber mais sobre nova publicação e, ter o privilégio de ouvir as suas histórias, que o autor convidou o DMRevista para um bate papo descontraído no seu espaçoso apartamento, no Setor Oeste. Seu lar é cheio de fotos de família e telas, muitas pintadas por sua própria esposa, a artista plástica Mirna Costa. “Ela aprendeu a pintar com a Goiandira do Couto”, ostenta. Confira a seguir trechos desta conversa bem humorada e enriquecedora com Joaquim Graciano.
Entrevista Joaquim Graciano
CIDADE DE GOIÀS
Quando estou em Goiás, em cada esquina tenho a impressão que eu vou encontrar com um parente meu. A cidade exerce muita influência no meu trabalho. Mas a Goiás de hoje é tida como uma cidadezinha. Mas já foi uma cidade progressiva. Em meados de 1700, a legislação permitia ter senado, tínhamos senadores e deputados.Tinha companhia de teatro e de ópera. Tinha dois jornais diários. Inclusive um jornal feminino, chamado “A Rosa”, em que uma das redatoras foi Cora Coralina. Lá recebem o segundo hospital do Brasil e o primeiro concurso de Miss. Eu exploro muito Goiás nos meus livros. E falo de outros municípios. Minha literatura não é estanque. Um assunto puxa outro,
JEITINHO GOIANO
Nós goianos temos a cultura completamente diferente do resto do Brasil. Porque nós não somos litorâneos. Os litorâneos sofreram influência direta da Europa. E nós somos do interior mesmo, bem sertanejos. Então nossa cultura foi feita aqui mesmo.
ESTILO LITERÁRIO
Um escritor deve escrever para chamar atenção dos leitores. Sem ficar com firulas de falar bonitos. Tem que ser simples. A simplicidade cabe em tudo, principalmente na literatura. Não adianta escrever algo que ninguém entenda. Escrevo para o povo. Com a falta de leitura que se tem hoje, temos que dar graças a Deus de ter existido um Monteiro Lobato, que despertou o interesse da literatura nas crianças. Mas hoje é só Super Homem (risos).
MOVIMENTO ESTUDANTIL
Fui secretário geral do centro acadêmico XI de maio e fazia muita irritação. Vivia naquelas assembleias gerais. Fui representante dos estudantes goianos na UNE em diversas cidades. A Universidade Federal foi criada por estudantes. Eles começaram. Dr. Colemar Natal e Silva, que foi um dos maiores homens foi o primeiro reitor que enfrentou toda reação contra a faculdade, porque já tinha a Católica e não queriam deixar abrir a UFG não. Como estudante é sempre mais idealista, lutamos, lutamos, lutamos… Nós persistimos graças a alguns nomes, que teve peito de fazer, como Colemar Natal e Silva e Mauro Borges, que criaram a UFG, com a ajuda da Maçonaria, que também teve uma ajudazinha boa também.
VILA DE CORAÇÃO
O futebol goiano começou em Goiás Velho com a Associação Atlética União Goyana, que hoje é um bloco carnavalesco da cidade. Uns rapazes que tinham morado no Rio de Janeiro, voltaram para Goiás e começaram a jogar na Praça do Chafariz, mesmo. Inventaram um clube, mas o futebol morreu e continuou a escola de samba que existe até hoje. Agora, falando em futebol goiano, sempre torci para o Vila Nova, que reúne o uísque, a cachaça, o vinho e a cerveja, todas as classes sociais. Gosto dos times da massa, por isso sou Flamengo também.
PROJETOS FUTUROS
Ah… não paro de escrever. Estou escrevendo outro livro com mais histórias que vai se chamar “Goiás Para Principiantes e Veteranos” e outro que mistura a história de Goiás com a do Brasil. Me perguntam sempre onde eu tiro tanto fato novo. Gosto de contar coisas desconhecidas. Como, por exemplo, vocês sabiam que Pedro Ludovico levou um soco na cara? Quem deu foi o ex prefeito de Campinas. Por causa de uma dívida de telha. E saíram nos tapas, rolando no chão. Tem muita coisa que sei.
UM CONSELHO
Ser inteligente é ser honesto. A honestidade é pai e mãe de todo mundo. Todo desonesto é desmascarado um dia. Não seja ambicioso, não. Vai devagar que você consegue o que quiser, com trabalho e honestidade. Às vezes você pode ficar revoltado vendo um vagabundo lá em cima, porque foi safado, e você lá embaixo. Pode deixar que as coisas viram ainda. Então, é preciso sempre ter esperança e lutar pela honestidade. O Brasil está precisando de honestidade demais. A palavra nos jornais é ladroagem. O engraçado é que colocam a culpa no Lula (risos). O Lula está pagando o pato.
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