Quem protege o cidadão?
Diário da Manhã
Publicado em 27 de junho de 2017 às 04:25 | Atualizado há 8 anosHá um clássico da literatura policial Goiana, escrito por um Coronel, cujo título é: quem vigia o vigilante? certamente inspirado em “A República” de Platão. O mote hoje já não é mais o vigilante, mas o vigiado, permanecendo a mentira que permite a sobrevivência do coletivo “organizado”. Mentiras fez o Brasil ser o que se tornou.
Os desvios conceituais de nossa legislação confinou o cidadão de bem a quatro paredes, restringindo seu direito de ir e vir tanto quanto diminuiu seu período de liberdade condicional em que pode ficar fora de seu presídio particular, aquele que outrora denominaram lar. Já não podemos mais ir onde queremos e menos quando queremos. Temos que nos limitar a lugares conhecidos e horários restritos não para evitar nos tornarmos vítimas, mas apenas para reduzir os riscos. O vigilante, olhos atentos do Estado já não nos protege, tão pouco garantem a si mesmo. Distorção legal, material e estrutural fez do vigilante um mero coadjuvante que precisa cuidar de si a tal ponto que já não carece de vigia. Enquanto isto salve-se quem puder na estrutura social capenga, cercada por grupos marginais que vão do criminoso comum ao de colarinho branco, dilapidando nossos bens, nosso patrimônio, nossa calma e nossas emoções. Eis o que nos tornamos: animais coagidos no labirinto de uma sociedade onde o criminoso vale mais que o trabalhador. Tudo em nome de um direito humano que luta e defende o direito daqueles que cada vez menos se parecem com legítimos humanos.
A propósito deste desabafo, repito aqui o que já dissera antes: defendi ardentemente a lei do desarmamento, acreditando estar nela a solução dos problemas de segurança pública ao nivelar todos os homens no mesmo patamar. A lei, como são todas as normas nacionais, não alcançou resultado, pelo contrário, fragilizou o bom cidadão que ficou exposto à sanha de marginais de um submundo obscuro antes ofuscado pelas sombras, agora sob os holofotes da ribalta onde se projetam os covardes e onde se acovardam os heróis. Que mundo estamos vivendo? O assunto virou tabu para nossas autoridades, “politicamente corretas” ou não. Sei agora: só a arma nivela os homens.
Não é sem propósito minhas considerações. Observando o mundo e os homens, cada vez me assusto mais. A cena que desencadeou esta verve parece corriqueira: o repórter, microfone na mão, anuncia calmamente mais um roubo ocorrido na cidade de Goiânia. Ao anunciar, a camara lentamente abre do Close para enquadrar um elemento mal ajambrado a quem o repórter se dirige: Porque você estava com a pistola, pergunta o repórter. O marginal, parecendo defender direito pétreo de sua inconstituição mental responde: para me proteger. Proteger contra quem? Contra a vítima que queira defender seu patrimônio, sua vida ou a vida de terceiro e não possuia um canivete? E se por acaso deparassem com uma viatura da ROTAM, pergunta o incauto repórter: Aí, meu irmão, o resultado seria diferente. Bravata, diria alguns. Distorção de caráter, diriam outros. Eu, na minha pequenez analítica concluo: nem um, nem outro. Trata-se de uma doença social, em que o caráter coletivo está alquebrado, combalido, viciado e distorcido. O criminoso não usa arma para matar, roubar e destruir. Não. Na sua mente psicótica a arma é instrumento de trabalho em que, legítimamente deve ser utilizada para sua proteção contra o cidadão trabalhador que não aceite o aviltamento de seus direitos. Por este mesmo princípio, a arma não deveria também servir para proteção do cidadão?
Pior de tudo não é tal demente acreditar nas palavras torpes que esbraveja. Pior é encontrar na sociedade aparentemente escorreita, pessoas de influência e dever social, defendendo tal paranóia. A doença não é do enfermo diagnosticado. Este está moribundo e a justiça poderia cuidar dele. A doença são os socialmente sadios que agem para adoecer o coletivo.
O problema de vivermos este estado mental coletivo doentio é a ruptura do sistema. Se todos entenderem que o ilegal é legal (perdoem o trocadilho), não haverá homem legal, mas seremos todos marginais. Marginais de nossa própria ombridade. Em assim sendo, necessário é mudarmos agora: abandonando de vez o que é utópico, percebendo a realidade e exorcisando o demônio da hipocrisia: marginal é marginal e cidadão é cidadão. Viver a mentira que construimos, só alimentará o monstro de nossa destruição. Não é sonho o que estamos projetando, mas mero devaneio decorrente de uma droga perigosa para nossos destinos: a doce senhora chamada ilusão.
(Avelar Lopes de Viveiros, cel RR PMGO)
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