A mãe dos políticos: entre o sofrimento e a glória
Welliton Carlos da Silva
Publicado em 14 de maio de 2017 às 14:17 | Atualizado há 2 semanasA figura da mãe na política é essencial. É dela a responsabilidade de humanizar o gestor e legislador público. A partir de sua relação de afeto, torna o político mais ou menos suscetível a determinadas causas ou orientações.
Na política de Goiás, ela ocupa lugar central, ora como fomentadora da educação dos filhos ora como aquela que transmite uma missão ao seguidor. Gercina Borges ocupa as duas categorias: mãe de Mauro Borges, ela legou ao marido Pedro e ao filho o DNA político. Filha de Antônio Martins Borges e Maria da Conceição Borges, Gercina teve no pai a primeira figura para se espelhar. Ex-senador e intendente de Rio Verde, Antônio Borges legou para a filha ensinamentos que ela acabou repassando para o filho Mauro Borges.
Gercina foi atuante na gestão do filho, principalmente como orientadora. Sugeriu nomes para a equipe – caso de Iris Rezende – e defendeu o mandato do filho até mesmo durante a crise da legalidade e no próprio regime militar. Segundo Mauro Borges, em entrevista ao DM, em 2007, a mãe o tranquilizou em um dos momentos mais difíceis de sua vida: “Ela chegou e disse: “Meu filho, viemos morrer com você”. Aquilo foi tudo naquela hora”. Poucos minutos depois, o então governador Mauro Borges recebia o decreto de intervenção federal.
O ex-governador se referia à mãe como responsável por dar aos parentes um conjunto de valores morais. Foi de Gercina a ideia de institucionalizar uma política assistencialista em Goiás. E logo depois que o filho ganha as eleições, em 1961, ela é chamada pela nora Lourdes Estivallet para opinar sobre ações tendo em vista os servidores públicos, como o natal da criança ferroviária pobre ou a distribuição de enxoval para mães e crianças e realização de cerimônias de casamento.
Gercina Borges e Mauro Borges: mãe influenciou até nas escolhas de quem participaria do governo de Mauro, que venceu as eleições em 1960
Esta tradição assistencialista é analisada na tese de doutorado de Tereza Favaro: “Em outras palavras, vincula-se a assistência social ao trabalho filantrópico, voluntário e solidário, carregada da pesada herança assistencialista guiada pela lógica do favor, do apadrinhamento, do clientelismo e do mando”.
Além de interferir na realidade social, a mãe passa a ser, portanto, dinamizadora das carreiras dos filhos e até mesmo dos maridos – como ocorreu com Pedro Ludovico, que se casou com a filha de um senador influente.
A mãe de Iris Rezende aparece em sua trajetória bastante discreta, mas é um engano: ela conquistou Campinas, bairro de Goiânia, para o filho. Dona Genoveva, casada com Filostro, foi ativa na eleição para vereador. Genoveva ajudava o pai, oleiro, mas sempre esteve próxima de Iris e seus irmãos.
Sem apego a esta tradição política de Gercina, a mãe do atual senador Ronaldo Caiado garantiu estrutura suficiente de educação – e muita estrutura. Enviou o filho para as melhores universidades e legou ao médico uma herança que possibilitou conforto material e investimento em sua carreira política. Dentre as heranças, consta na Justiça Eleitoral, que Caiado teria recebido fazendas em Mara Rosa, Crixás e Mozarlândia.
A mãe de Iris Rezende aparece em sua trajetória bastante discreta, mas é um engano: ela conquistou Campinas, bairro de Goiânia, para o filho. Dona Genoveva, casada com Filostro, foi ativa na eleição para vereador. Genoveva ajudava o pai, oleiro, mas sempre esteve próxima de Iris e seus irmãos. Como dona de casa, ocupou seu tempo dando ao filho o básico: alimento e vestimenta. Quando Iris completou a adolescência, ela começou a intermediar os conflitos dele com o pai, precavido com as ações políticas do filho.
Marconi Perilo e a mãe Maria Perillo: relacionamento mais distante quanto aos temas políticos e maior presença na motivação dos estudos e trabalho
A mãe do atual governador de Goiás, Marconi Perillo, é também do primeiro grupo e ajudou o filho na base e formação moral. Maria Pires Perillo era dona de casa e o marido Marconi Ferreira atuava como comerciante quando o filho começou a se envolver com a política. A infância começou em Palmeiras de Goiás, cidade do interior.
Maria Perillo morreu aos 74 anos, quando tratava de um câncer no Hospital Santa Helena. Mais velho dos filhos, Marconi começou a trabalhar aos 14 anos a partir do incentivo da mãe, que deseja que ele conciliasse as atividades com os estudos.
Mulheres fortes: as tragédias enfrentadas pelas mães
Wilder Morais com a mãe costureira, dona Maria Angélica: sofrimento até o filho tornar-se megaempresário na construção civil
Em entrevista ao Diário da Manhã, em 2005, Iris recordou de sua mãe Genoveva como mulher sofrida e profundamente religiosa. Desde a morte do irmão, assassinado em Cristianópolis, ela intensificou sua presença nos cultos da Igreja Cristã Evangélica – linha pentecostal que nortearia a vida de Iris, como uma das principais heranças da mãe.
Após o assassinato, Genoveva passou a doutrinar Iris com forte convicção conservadora. A partir daí o ex-governador sempre se posicionou como político religioso e próximo das questões da igreja. Evitou se posicionar como político exclusivo deste segmento, mas foi cotado para ser candidato a presidente em 1989 pela bancada evangélica que se organizava no Congresso Nacional.
“É impressionante a mãe do Pedrinho. Se existe alguém que merece ir para o céu, é ela. Peça fundamental na vida dele. Trabalhava dia e noite. Era incrível”, diz Sidney Aratake, médico que atendia Taquaral na época em que o senador era conhecido como Pedrinho
A vida da mãe do senador goiano Wilder Morais (PP-GO), Maria Angélica, daria também um filme por conta de uma tragédia e um final feliz. A família teve a “jornada do herói” e muitos percalços – a começar da morte de um dos irmãos do senador, em um acidente na fazenda onde moravam. Costureira, ela juntou o pouco que tinha com o que ganhava o marido peão para tentar ajudar Wilder nos estudos, já que este decidiu mudar para a cidade grande. Maria Angélica não tinha casa: se mudou 24 vezes.
Ela enfrentou o drama da morte de Weis, aos 5 anos, na Fazenda Soledade. O filho queria cortar uma bananeira quando se feriu e morreu. “Eu corri atrás e minha mãe me segurando. Saímos correndo com ele, mas acabou morrendo”, recorda a mãe do atual senador.
Antes Maria ajudava na lavoura. Em Taquaral passou a ser costureira tendo em vista o sonho do senador ser engenheiro civil. “É impressionante a mãe do Pedrinho. Se existe alguém que merece ir para o céu, é ela. Peça fundamental na vida dele. Trabalhava dia e noite. Era incrível”, diz Sidney Aratake, médico que atendia Taquaral na época em que o senador era conhecido como Pedrinho. Mesmo adulto, o senador usou a mãe como consultora: em um momento marcante, Wilder optou em sair de uma construtora para iniciar seu próprio e arriscado negócio. A mãe comunicou cautela ao filho, mas disse para ele seguir adiante nos sonhos.
MENINÃO ATLETA
Os filhos costumam ser custosos também. Alguns menos, outros mais. O vice-governador José Eliton gastou muito esparadrapo da mãe Mirtes Guimarães Figuerêdo. A ex-primeira dama de Posse, na região Norte de Goiás, acompanhou os muitos esportes e brincadeiras de José Eliton até que ele definitivamente resolvesse entrar para a política.
Em um perfil da mãe do vice-governador, publicado em 2010, no Jornal Opção, o jornalista Nilson Gomes narrou a relação da mãe com o filho: “Antes da Vaquejada, os hematomas de Júnior tinham outro motivo, o bicicross. Dona Mirtes perdeu a conta de bandeide, esparadrapo, mertiolate, gaze e outro apetrechos de farmácia gastos nos braços, pernas, ombros e tudo quanto é lugar do corpo do atleta”.
Conforme a mãe, José Eliton era consciente e mesclava as questões sociais e políticas com a devoção pelo esporte. Ao cursar direito na PUC, em Goiânia, ainda chegou a entrar no time de vôlei da universidade. Para a mãe, José Eliton continua o “Júnior”, que pode tornar-se governador a partir de 2018.
Maternidade política facilita início dos filhos
Uma das influências do deputado federal Daniel Vilela é inegavelmente o pai, ex-governador Maguito Vilela, que ajudou a estruturar sua carreira política. Mas a mãe Sandra Carvalho foi fundamental para sua eleição. Considerada uma das primeiras-damas mais carismáticas de Goiás, conseguiu repassar ao filho o prestígio e carisma. O recall da atuação da mãe auxiliou na disputa pela Câmara Municipal, Assembleia Legislativa e Câmara dos Deputados.
O atual presidente da Câmara Municipal de Goiânia, Andrey Azeredo, tem nos pais jornalistas o DNA. A mãe em específico, ex-apresentadora Raquel Azeredo, surgiu como novidade no cenário político em 2010. Foi eleita deputada estadual em 2003 pelo PMDB, mas acabou derrotada na eleição seguinte.
A vitória de Andrey nas eleições de 2016 ocorreu mais por persistência do próprio filho, que já havia sido derrotado nas eleições anteriores. A mãe auxiliou nas estratégias de campanha e no discurso, dando ao político um ‘know how’ eleitoral que ele não tinha.
Lincoln Tejota é outro que teve a mãe como mentora. Tanto o pai, Sebastião Tejota quanto Betinha Tejota, influenciaram a trajetória do filho. Ele aprendeu a fazer política com a mãe, quando assumiu o comandou da campanha, em 2006. Elegeu Betinha e nas eleições seguintes inverteu a ordem, recebendo apoio de Betinha.
Ex-vereadoras, Rose Cruvínel e Cida Garcez abriram mão da vida pública para apoiarem os filhos. Médica, Rose pavimentou a carreira do deputado Virmondes. Em 2016, o amor pela mãe falou mais alto do que a questão partidária. No PPS, ele declarou apoio ao delegado Waldir (PR) como candidato a prefeito. Sua mãe, Rose, estava na chapa do delegado. Na ocasião, o filho revelou o princípio que regia sua atitude: “Mas como um filho não vai seguir a sua própria mãe?”. Na Câmara para cumprir primeiro mandato, Sabrina Garcêz é também cria da mãe, que atuou por dois ciclos na casa municipal de leis. A forma de atuação é diferente, apesar das duas terem a mesma origem e grupos de apoio.
[box title=”Heroínas solitárias“]
Josephina Teixeira Ludovico de Almeida é quem responde pela carreira moral do filho Pedro Ludovico Teixeira, considerado o maior governador da história de Goiás. O pai, João Teixeira Álvares, deixou a mulher e os filhos pouco depois do seu nascimento, em 1891. Ele se mudou para Paris. Optou seguir a medicina na Europa. No interior goiano, Pedro escutava as histórias do pai civilizado e culto. Suportado pela mãe, ele mirou o pai.
Josephina vai segurar a barra e dar ao filho a maturidade necessária para ser um homem público de coragem e decidido a mudar os rumos de Goiás.
Anda mais heroína, todavia, foi Júlia Kubitschek. Em Minas Gerais, ela ficou viúva três anos depois no nascimento do ex-presidente Juscelino. Professora, Júlia teve que se desdobrar para cuidar do filho e de uma irmã.
Após a morte do pai de JK, ela preferiu não se casar mais. E enfrentou todas as dificuldades possíveis, inclusive passar fome. A luta até se tornar médico foi suportada por Júlia, que jamais deixou o filho ser diminuído por conta das dificuldades.
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Quando a mãe herda e passa a vocação para frente
A ministra do Tribunal de Contas da União (TCU), Ana Arraes, aprendeu com o pai, Miguel Arraes, a exercer as atividades políticas. Eleita para a Câmara dos Deputados a partir do legado do pai, ela conseguiu fazer o mesmo com o filho Eduardo Campos, ex-governador de Pernambuco que morreu em 2014 em uma acidente de avião.
Formada em direito, ela foi surpreendida com a morte do filho. Um ano depois, mostrou em palavras que permanecia mais mãe do que técnica do tribunal. Ao ser questionada como lidava com a morte do filho, falou da diferença entre superar e sobreviver: “Superando não estou. Estou sobrevivendo”. Apesar da influência, Ana chegou ao cargo pelas mãos do filho, então governador de Pernambuco, que se articulou junto ao ex-presidente Lula para que ocorresse a nomeação de Ana Arraes – jurista comum para o cargo que ocupa.
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