Opinião

O Universo de Steven e Trump

Diário da Manhã

Publicado em 10 de março de 2017 às 02:28 | Atualizado há 8 anos

“Vocês não podem atacar a quem não entendem” diz inconformado o personagem do desenho “infantil” Steven Universo em um dos episódios veiculados. O garotinho nomeado Steven, grita na esperança de que isso impeça suas guardiãs, as Crystal Gems, (para mais detalhes recomendo sem constrangimento render-se aos encantos dessa animação) de agredir o personagem Titio Avô (Uncle Grandpha), o qual faz participação especial no episódio. Elas sentem-se ameaçadas com a presença do curioso visitante, pois ele parece trazer consigo infindáveis surpresas

Steven Universe mora em Beach City e todo esse cosmos situa-se na cabeça da animadora Rebecca Sugar, uma norte-americana. Já conhecido por todos nós é o fato de que em 20 de janeiro de 2017, Donald John Trump assumiu o cargo de presidente dos Estados Unidos da América, lar de Sugar e em conseqüência, berço dessa ideia chamada Steven.

Curioso pensarmos que a frase destacada no início deste artigo seria tão recomendável ao líder político mencionado e aos seus apoiadores. Há aqueles que acreditam na máxima sobre a melhor forma de ataque ser uma poderosa defesa, Trump parece encaixar-se nesse grupo. Apesar do discurso recente em que adotou um tom considerado mais ameno, suas medidas intransigentes em relação à imigração e a construção do muro na divisa com o México, são provas do incômodo representado pelos estrangeiros na concepção do presidente.

Bauman, sociólogo polonês falecido neste ano, fala sobre a persistente insegurança fruto da instabilidade provocada pelo mundo líquido moderno. De nada tem-se certeza absoluta, uma vez que tudo está em ininterrupta reconfiguração. No livro 44 cartas do mundo líquido moderno, Zygmunt Bauman menciona que os estrangeiros são as válvulas de escape para esse pavor moderno, em via de pouco saber-se a respeito deles, por isso faz-se conveniente odiá-los ou temê-los.

Os surtos nacionalistas atuais têm então seu embasamento, embora injustificável. O isolamento é preferível no lugar do entendimento e do estabelecimento de conexões, esse é o fundamento da mixofobia, ou medo de misturar-se. Esquece-se que os grandes cozinheiros na busca do prato ideal misturam centenas de ingredientes, de origens e sabores diversos. Às vezes é preciso ousar na utilização de elementos contrastantes e surpreender-se com um bom resultado.

A construção das próprias nações, as quais alguns procuram exaltar-se de uma forma não muito adequada, é efeito do acolhimento de centenas de povos procurando ou construindo um princípio comum. Não é possível identificar uma origem única nas raízes familiares de cada um de nós. Diante desse cenário vemos a necessidade de confrontar a normalidade, o padrão, o costumeiro com o sujeito ou substância estranha que pode vir a agregar.

Toda possibilidade é envolta por um risco e sem ele, por muitas ocasiões, deixamos triunfarem os entraves do progresso ou do crescimento pessoal. O presidente de uma nação é o mais indicado pra provar verdadeira tal filosofia e instigar o seus compatriotas a ultrapassarem a zona de conforto fazendo o mesmo.

Retornando a Bauman, ele relata que uma das grandes perdas da humanidade tomando uma atitude oposta é a capacidade de tolerância e a valorização do inesperado. Dessa maneira torna-se cada vez mais impossível aproveitar plenamente a vitalidade, variedade e pujança da vida urbana.

O desenho Steven Universo transmitido pelo canal de TV a cabo Cartoon Network tem como público alvo crianças, mas dispõe de ensinamentos básicos ignorados por adultos, ponto final. Isso representaria uma esperança quanto à geração futura, se não fosse por aqueles que a guiam, aqui cabem tristes reticências.

 

(Leticia Ribeiro de Brito, 21 anos. Cursa o quinto período de Jornalismo na Universidade Federal de Goiás. Aspirante a cronista e articulista.)

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