Politica

Termos direita e esquerda não servem ao mundo atual

Diário da Manhã

Publicado em 29 de janeiro de 2017 às 00:11 | Atualizado há 3 semanas

A partir de uma observação social, descobrimos alguns conceitos que estão arraigados na sociedade e que encontram uma fundamentação científica a partir do estudo dos fatos sociais. Como exemplo, temos os termos políticos “direita” e “esquerda”.

A evolução dos conceitos políticos nos levam a acreditar que tais termos estão em desuso, vez que nenhum indivíduo pode ser assim rotulado. Na atual era, os procedimentos individuais é que devem ser entendidos para se buscar a formação de uma definição procedimental que aponte a tendência do ente político, enquanto agente de direitos.

A história recente tem demonstrado que estes procedimentos políticos estão restritos apenas a um conceito genérico, visto que hoje em dia, as posições político-partidárias têm se manifestado em forma de tendências, tanto conceituais quanto individuais.

A era Trump põe fim à globalização. A política mostra-se a cada dia mais restrita, levando-se em conta o local e cultura do povo e seu protecionismo enquanto sociedade.

Josef Stalin era radicalmente esquerdista, assim como Adolf Hitler representava a direita radical. Ambos geriram governos ditatoriais e cruéis, e neste ponto acharam seu lugar comum. Baseados nessas percepções é que fomos buscar embasamento para a tese de que, mais do que rótulos políticos, prevalecem as tendências.

Análise pontual

O professor da PUC Wilson Ferreira da Cunha, graduado em História e Antropologia em Moscou pela Universidade da Amizade dos Povos, cientista político, faz uma análise pontual sobre o tema.

Autor do livro Introdução à Ciência Política, conhece muito bem a história russa e soviética, vez que se formou na Rússia. Wilson Ferreira analisa que Vladimir Putin não representa mais o mundo socialista, o que precipuamente vem dar fundamentação à tese em debate.

Ele explica que a Rússia adotou o sistema capitalista liberal desde Gorbachev (1991). Vladimir Putin é um resquício da KGB (a CIA russa), pois foi um agente espião russo dentro da Alemanha. Isso explica a causa de uma gestão autoritária, totalitária, que é herança cultural do czarismo russo. “Todos os dirigentes socialistas foram ditadores, autoritários, totalitários – e a Rússia viveu oito décadas de socialismo, o que foi muito ruim para a população russa. Tanto que não houve defensores do socialismo soviético, quando da dissolução da União Soviética. Todo o povo russo foi a favor do desmanche total, desde Gorbachev. Mas Putin, alheio a tudo isso, administra como se fosse um novo Czar (rei). E ele tem o apoio da população porque a economia melhorou. Podemos dizer que há uma democracia com características ditatoriais. Ele manda e desmanda como se fosse o dono do país”.

Sobre a era americana Trump’ o professor diz que deveremos aguardar para ver como será esta administração. “Existe uma histeria da imprensa mundial. Trump não é político. Ele é um empresário de sucesso, bem como toda sua família. Portanto ele entrou nisso para eliminar o político profissional. Esta foi a sua proposta, e sobre esta proposta é que foi eleito. Há uma tendência mundial nesse sentido, como também observamos no caso de Dória em São Paulo. A proposta de Trump foi trazer de volta a ‘grande américa’, exemplo para o mundo inteiro”.

O professor Wilson Ferreira analisa ainda que o sistema democrático republicano é exemplo para o mundo inteiro do que seja “capitalismo liberal”. O presidente americano tem muito pouco poder na verdade, porque nos Estados Unidos quem manda são os outros poderes – não é o Executivo. Portanto, qualquer ação que ele faça, depende do legislador, consubstanciado em deputados federais e senadores. Porém, algumas medidas imediatas ele pode tomar, como já está tomando. Mas isto não influencia no sistema capitalista americano. “Trump é republicano”, explica, “e os republicanos nos Estados Unidos são maioria tanto no Senado quanto na Câmara. É óbvio que o americano não vai governar contra os Estados Unidos. Em primeiro lugar eles ressaltam e valorizam o dólar, as empresas e a economia americana, tanto que uma das primeiras coisas que pregou foi a proteção à indústria americana”.

Com relação à conjuntura brasileira, Wilson afirma que as posições da esquerda estão representadas pelo PT, PCB, PCdoB, PSol e outros mais. “Estes partidos se diziam de esquerda, apoiadores dos governos Lula/Dilma. Mas nestes 13 anos de governo, se revelaram apoiadores do empresariado brasileiro, e para surpresa de todos foi revelada uma corrupção jamais vista em todo o mundo. Então esta esquerda tradicional e histórica não tinha por característica a corrupção, mas isso aconteceu dentro de todos os ditos partidos de esquerda. Significa que a esquerda brasileira entrou no jogo do poder, usufruindo do dinheiro e empresas públicas, falindo o país, tendo se igualado à direita brasileira tradicionalmente corrupta”.

“Direita e esquerda é uma noção oriunda da revolução francesa, que hoje em dia, depois do Mikhail Gorbachev, após a derrocada do socialismo em geral, ficou na história, no passado, embora muita gente utiliza os termos como se a direita fosse coisa do conservador, moralista, e a esquerda do progressista”, explica. “Isso não é verdade. Há que se pontuar e examinar cada região, cada governo de cada cidade e de cada país. Então, dependendo da ação desse agente público, poder-se-á defini-lo ele como progressista, reacionário, conservador, moralista ou liberal. Afirma que é termo
“direita e esquerda” já está vencido, tendo caído em desuso.

“Deve-se raciocinar quais são as posturas daquele dirigente em determinados assuntos. Por exemplo: ele pode ser liberal na economia, conservador na ética, na moral, ser contra o aborto, contra casamentos homossexuais. Esses são termos modernos. O fato é que como agente público ele deve atender às características do município, do Estado ou da União. Na verdade nenhum agente público governa sozinho. Se ele governasse sozinho, seria necessário retirar a palavra democracia e implantar a ditadura. Por isso o governante representa a vontade, os interesses imediatos da cidade, do estado ou da nação. E esses interesses, se o governante não for demagogo, ele terá que agir em nome da coletividade, da maioria. Isso inclui tomar medidas amargas, vislumbrando benefícios a longo prazo para a sociedade, ou tomar medidas demagógicas, populistas, que irão promover apenas a futura eleição dele mesmo.

E completa: “É por isso que podemos dizer que a democracia é vulnerável, pois entra todo mundo no processo eleitoral (antes só Deus entrava, até Maquiavel). “Maquiavel é considerado pai da política, porque até então ela era divina. Ele trouxe a política para os humanos. Aí vieram os conflitos, pois os conflitos existem para estabelecer o consenso ou o dissenso. Na democracia precisamos de dissenso, de contradições, controvérsias, senão não há democracia e sim totalitarismo, ditadura. Se falarmos de um sistema democrático federativo republicano, o poder é exercido via eleição. Estabelece-se uma democracia e o poder é redimensionado segundo um novo filósofo: Montesquieu. Ele dividiu o poder em três partes: Legislativo, Executivo e Judiciário, exatamente para os países novos das américas terem o que se denominou de ‘balance of power’, ou seja, o equilíbrio de poderes, onde um poder não imiscuir na competência do outro”.

O professor Wilson Ferreira explica que essa divisão existe nas repúblicas democráticas modernas. Então, se vislumbrarmos o poder nos três níveis: municipal, estadual e federal, quem assume o poder tem uma característica de governante democrático para res publica, ou seja, coisa pública. Deste modo, ele vai ser um gestor público na administração, seja, municipal, estadual ou federal nestes três níveis, e nesse sentido, dependendo da ação dele como governante, poderemos situá-lo como estadista ou não. “Aí entra todo tipo de caráter, de preconceito, de acordo com as pessoas que estão vivendo naquela região”, completa.

O cientista afirma que também há pessoas que não são corruptas no sistema brasileiro, desde a sua fundação em 1500. Há identificadas pessoas honestas desde a colonização, império e república brasileiras.

Deste modo, devemos pontuar qual o momento histórico que estamos abordando, pois não há que se falar em ‘golpe’, onde uma presidente foi retirada por uma manobra golpista.

Analisa que este governo caiu, entre outros motivos, pela corrupção que praticou e por ineficiência econômica, pois se a Dilma tivesse adotado as linhas gerais de Henrique Meirelles, do plano real e do ex-ministro da fazenda Joaquim Levi, não teria caído. Estaria tudo bem. “Dilma foi demagoga, agiu com proselitismo. Distribuiu dinheiro público para a população, para os empresários e para os funcionários públicos. Hoje nós temos 12 milhões de funcionário públicos nos três níveis: federal, estadual e municipal. Isso é uma característica socialista, ou seja, o estado é quem emprega. ‘Lula e Dilma só faltaram criar o Ministério ‘Empregobrás’, ou seja, nenhum brasileiro ficaria desempregado – e isso não existe no planeta”.

Wilson Ferreira também frisou que as questões de justiça, de igualdade e de inclusão foram noções utópicas pregadas por eles, e se mostraram ter sido um delírio que caiu por terra. “Esses treze anos foram a melhor aula de política prática de qualquer teoria política adotada no planeta: como não administrar um país. Isso eles fizeram com louvor. Tanto que a herança que Temer recebe é justamente essa: fazer o oposto do que eles fizeram”.

O cientista político também ressalta que Temer foi eleito junto com Dilma, na mesma chapa, ou seja, corre o risco de ser caçado judicialmente, por questões eleitorais que estão sendo analisadas no TSE. Mas conclui que ele está acertando: “Temos Henrique Meirelles como ministro, o que já é um ponto diferente, ou seja, Temer demonstra que está cuidando da economia, do dinheiro público, da inflação, ou seja, são critérios econômicos que se não forem levados em conta, arrasam qualquer nação.” E conclui: “Seria ideal inflação zero, dívida zero, mas não é assim que o mercado funciona. O mercado não funciona de acordo com vontades, porque existe um complexo mundo real como problemas reais a serem superados”.

Finalmente, analisa que Adolf Hittler representando a direita ou Lenin a esquerda já passaram e ficaram apenas na história. “A história existe para que os erros não sejam repetidos. Hittler e Lenin ficam na história como elementos incompetentes, ineficientes e loucos, que causaram genocídios intoleráveis. Este modo de governar deve ser descartado com meta humanitária inclusive. Eles ficam na história para nos dizer o que não devemos fazer”.

Categoria de análise

Luiz Signates é doutor em Ciências da Comunicação pela USP e professor de Comunicação e Cidadania do Mestrado em Comunicação na UFG.

Para ele, a noção de direita e esquerda tem uma validade como categoria de análise. Não terá validade se for feito destes termos uma gaveta para caber instituições ou pessoas. Entre direita e esquerda há toda uma sequência de nuances do ponto de vista conceitual que ainda operam funcionalmente para ajuizar sobre as questões políticas. Signates pontua que o sentido geral das definições direita/esquerda são as seguintes: na relação ou disputa capital/trabalho, que é uma disputa que permeia a sociedade inteira, em razão do sistema capitalista, chama-se de ‘direita’ aquelas posições políticas que privilegiam o lado do capital, o lado do proprietário, o lado dos grandes bancos em relação a outros interesses, quais sejam os da população, interesse dos trabalhadores, etc. O lado ‘esquerda’ são os atos políticos ou vontades políticas que privilegiam as relações de trabalho, interesses de trabalhadores, interesses da cultura, da população, em conflito com os interesses do capital.

Luiz Signates analisa que para julgar governos, partidos ou instituições, encontrar-se-ão dificuldades de encaixar todas a práticas e todos os atos políticos de uma pessoa, de uma instituição ou governo simplesmente de um dos lados. Então teremos governos que são originalmente de intenções de esquerda, como por exemplo os governos comunistas como a Coréia do Norte, e que se transformaram em grandes ditaduras sanguinárias, massacrantes, e o apoio à ditadura, que é uma característica tida como de direita. Portanto, existem governos de esquerda que adotam práticas de direita. Eis a razão da confusão e fusão dos conceitos. “A Coréia do Norte é um capitalismo de estado, como o é a China. Por essa razão, essas vontades, esses interesses, esses pensamentos de direita e esquerda se imiscuem, se misturam e se confundem, porque um mesmo governo ou governante pode ter ações, intenções ou pensamentos que sejam de direita mas que também sejam de esquerda.”

O professor parte da análise do PT e do PSDB: “Tanto um quanto o outro são originalmente partidos de esquerda. O PT é o partido dos trabalhadores, se vincula à esquerda trabalhista, como foi John Major (primeiro ministro britânico 1990-1997), que era um líder vinculado ao partido trabalhista na Inglaterra. O PSDB é social democrata. A social democracia foi uma alternativa ao socialismo combinado com o capitalismo. Caracterizou-se por ocupar uma posição centro-esquerda.

No Brasil, a polarização entre PT/ PSDB e as alianças que foram criadas fizeram com que o PT se aliasse mais com partidos de esquerda e o PSDB se aliasse mais com partidos de direita. Assim, o PSDB se tornou em relação ao PT um partido de direita. Por isso que esses conceitos são confusos. Por causa de alianças, o PSDB passou a adotar políticas originalmente de direita, por exemplo: privatização, que é política restritivamente de direita”.

Luiz Signates analisa que o PT não privatizou. Ao contrário, empilhou o Estado, que é uma política típica de esquerda. A esquerda entende, em sua maioria, que quem dá conta de fazer distribuição de renda, de beneficiar a população contra os interesses do capital é o Estado. Por essa razão, ele tem uma concepção de que o Estado tem que ser forte, para viabilizar no conflito capital x trabalho, uma relação de mais equidade e justiça.

“Já a direita pensa que o Estado tem que ser o menor possível, porque a iniciativa privada, os empresários, o capital, tem que se manifestar, além do que acreditar que se o Capital for deixado livre, as pessoas vão receber cada uma segundo sua competência, e vai haver uma igualdade social sem precisar da ação do Estado”.

“As concepções de sociedade, de Estado e de mundo a partir das colocações direita/esquerda são completamente diferentes.” ressalva. E completa que por essa razão é que essas categorias conceituais ainda são válidas para análise de processos políticos. O que não dá é para rotular: fulano é de direita, fulano é esquerdopata. Isso já acabou”.

Signates explica que os conceitos são válidos para análise, mas não são mais absolutos. Estão fragmentados. Por exemplo: uma pessoa pode ser de centro-esquerda mas não concordar com conceitos da esquerda tradicional. Essas tendência, quer sejam mais para a sociedade ou mais para o capital, mudam de pessoa para pessoa, dentro de uma mesma instituição, de tempos em tempos, como mudou para o PSDB, que era a esquerda do PMDB e hoje o PSDB é a direita do PMDB.

“Inicialmente no tempo do Santillo, quando Marconi Perillo ainda era novo, o PSDB era um partido de esquerda. Os intelectuais do PMDB discordaram das práticas de fisiologismo do partido e saíram para saíram para formar um partido de esquerda autêntico. Eles eram chamados “os autênticos do PMDB”.

Signates explica ainda que a globalização gerou uma interdependência muito forte entre todos os países e as instituições entre si. “Foi uma tentativa de mundialização do capital com uma transação cultural muito grande por causa da internet. Na verdade, não se perdeu a noção nem de nação nem de localização: nós somos localizados. Pertencemos ao nosso bairro, ao nosso estado, ao nosso país. Mas o capital se mundializou, e as relações culturais, por causa das redes sociais, se tornaram cada vez mais interdependente.

E profetiza uma nova era: “Isso até o Barack Obama. Com o Trump, ele parece começar a movimentar políticas que fecham os Estados Unidos, que é o grande poder mundial, para os processos de globalização. Por exemplo: de anteontem para ontem ele revogou o maior tratado multilateral do mundo que é o tratado do pacífico, que foi uma forma que os Estados Unidos achou de isolar a China, sua grande concorrente ao poder mundial. Agora Trump quer fazer relações bilaterais: de um lado Estados Unidos. Do outro, um outro país. Assim ele exerce mais poder e consegue trazer lucro para os Estado Unidos. É um presidente nacionalista, e poderá reverter muitos conceitos que estavam estruturados sob o processo de mundialização do capital. A história é complexa, como o são os conceitos, os quais estão sempre em mutação.

 

No Brasil, a polarização entre PT/PSDB e as alianças que foram criadas fizeram com que o PT se aliasse mais com partidos de esquerda e o PSDB se aliasse mais com partidos de direita” Luiz Signates   A política mostra-se a cada dia mais restrita, levando-se em conta o local e cultura do povo e seu protecionismo enquanto sociedade” Wilson Cunha

 

 

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