Cultura

Sem tempo ruim

Diário da Manhã

Publicado em 27 de janeiro de 2017 às 00:59 | Atualizado há 8 anos

É… Os últimos acontecimentos do mundo não estão para brincadeira. E Serjão Loroza, mesmo com todo alto-astral que transparece nos palcos da vida, sabe bem disso. Sua receita para seguir em frente? Inspirar-se nos movimentos da capoeira para esquivar dos golpes cotidianos. Parece que consegue. Está sempre feliz, pronto para a próxima festa. Mas, diversão, arte e cultura, para o artista multifacetado, devem ser levados a sério. “A gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte (risos)”, disse o cantor, ator e multi-instrumentista, em entrevista ao DMRevista, na qual esbanjou bom humor.

Amanhã, ele, que coleciona papéis no cinema (foi o Gordo de Carandiru), na TV (fez novelas como Da Cor do Pecado”e integrou séries como A Grande Família e Vai Que Cola) e no teatro (este ano vai rodar o País com a peça Caô), chega a Goiânia mostrando todo swing que tem para fazer música. Como uma das atrações do Deu Praia, Loroza promete fazer um show bem “maneiro, morô?” e cheio de MPB e funk (tanto o americano quanto o carioca), marcado para iniciar a partir das 18 horas.

No evento, que hoje recebe o show do baiano Saulo, Loroza vai mostrar ainda muito do samba enraizado nas suas origens e que o tornaram um torcedor ávido da escola de samba carioca Império Serrano. Mas este ano ele não irá desfilar. Nem poderia, está prestes a encarar uma agenda frenética de shows no carnaval. Na conversa com o DMRevista, brincou que terá que entrar em forma, para aguentar o batidão.

Destacou ainda que nos dias de folia se prepara para mostrar um novo trabalho, lançado em uma turnê internacional, que passou por diversos locais da Europa, o Loroza Brass Band. O projeto trata-se uma banda só com instrumentos de sopro.

Além disso, pretende viajar o País com uma peça que está produzindo, Caô. Sim, seu talento é que é de peso. E com a mesma espontaneidade, temperada pelo sotaque e gírias cariocas, o artista conversou com DMRevista sobre seus planos, origens, samba, crise política, entre vários outros assuntos. Confira trechos da conversa a seguir.

 

ENTREVISTA SERJÃO LOROZA

 

DMRevista- O que preparou para o show de amanhã?

Serjão Loroza- Vai ter as músicas que gosto e estou acostumado a fazer. Muita música brasileira dançante. Vai ter um pouco de MPB, samba, funk dos anos 70, funk music brazuca, carioca. É muito misturado. É uma zona, no melhor sentido da palavra (risos). A intenção é divertir, alegrar mesmo.

 

DMRevista- Você já lançou três discos solos e integrou grupos como o Monobloco. Como estão seus projetos musicais?

Serjão Loroza- Tem o Loroza e Us Madureira, minha banda percussiva, que reunimos uma galera de várias escolas de samba. Inclusive, a gente gravou nosso DVD aí, em Goiânia, no Oscar Niemeyer. E agora  estou lançando o Loroza Brass Band, um trabalho novo com instrumentos de metal, de sopro, onde toco baixo e canto. Na verdade, lancei esse trabalho em uma turnê na Europa e no carnaval vamos fazer algumas ações com ele. É um trabalho que não tem guitarra, violão, não tem piano ou teclado. São os metais mesmo fazendo as linhas harmônicas. É maneiraço. A primeira vez que vi isso foi em uma viagem que fiz para Dinamarca. Em Copenhague vi uma banda semelhante a essa e pensei em fazer aqui no Brasil, com o swing e a pegada brasileira. E ano passado a gente estreou este trabalho na Europa e agora estamos aqui no Brasil. Qualquer dia vamos fazer aí (em Goiânia) também.

 

DMRevista- Você gosta muito de carnaval. Como está sua agenda nos dias de folia? Vai desfilar em alguma escola?

Serjão Loroza- Na verdade é pancada. São muitas emoções, como disse o rei. O rei Momo (risos), no meu caso. Na verdade, faço algumas coisas no Rio e também fora do Rio. Fortaleza, Brasília, Manaus… É muita coisa, tem que arrumar um personal trainner para conseguir cobrir todos os compromissos (risos). Meu preparo físico não tá dos melhores, e não tem jeito, acaba ficando (em forma), só por causa da correria, né? Nem vou sair em nenhuma escola. A minha escola de coração é a Império Serrano, que está no grupo de acesso. E acaba não dando tempo de sair. Mas, de qualquer forma, acho maneirão. O Rio tem uma característica, depois do Monobloco, de carnaval de rua bem forte. Sem corda, para o povo mesmo. Mas também tem o carnaval mais espetáculo, mais visual, que passa na TV, que é uma outra coisa que é legal também. Me amarro em carnaval. Curto tudo.

 

DMRevista- Você tem uma ligação muito forte com a Império Serrano, né? Como começou esta história?

Serjão Loroza- Nasci no subúrbio, na favela, no Morro de São José, que é colado na Serrinha (comunidade carioca onde nasceu a escola). E automaticamente o samba está muito presente nas nossas vidas. Por ser mais próximo da nossa casa, acabei criando uma identidade com a Império Serrano. Depois fui ficando mais velho e entendendo o porquê. A Império Serrano talvez seja uma das escolas, ditas grandes do Rio de Janeiro, que mais dão valor ao samba de raiz. Faz um samba menos comercial. Tem até o samba Bumbum Bate Prugurundum, de 1982, que já fazia uma crítica às escolas de samba que vão se tornando uma empresa. Onde o operário, que era para ser a grande estrela, acaba virando um detalhe (risos). E a Império Serrano busca dar moral para quem tem que dar moral mesmo, rapaz. Pô! Porque são esses caras que fazem o carnaval acontecer. São estrelas de pequena grandeza, que, se bobear, ficam invisíveis durante a festa.

 

DMRevista- Por isso nunca aceitou ser puxador de nenhuma escola?

Sérgio Loroza- Não critico quem faz… Na verdade, não me considero nem a altura deles. Porque é uma cultura tão arraigada, no coração da comunidade. Tecnicamente acho que até conseguiria, mas acho mais maneiro eles. Gosto de ver eles (risos). Porque esses caras da comunidade acabam ensinando pra gente, músicos de grande técnica, cheios de teoria, um monte de coisa. E tudo cai por terra quando um cara, que sem saber o que é um dó, maior ou menor, abre a boca e sai aquela maravilha. E me faz voltar um pouco para o passado, onde tudo começou… Esse desejo, essa vontade, volta tudo quando tu olha para o cara que está ali de coração, corpo e alma, sem entender muito bem que está sendo utilizado por uma indústria séria. Mas, enfim, acho maneiraço isso.

 

DMRevista- Entre cantar e atuar, qual é a sua maior paixão?

Serjão Loroza- Para a gente que é artista, atuar ou compor ou cantar, tudo faz parte do mesmo ofício. Costumo dizer que é produção artística. Me considero artista muito mais que cantor ou ator. Artista é aquele que é capaz de trabalhar com arte. Por exemplo, na música, tô fazendo arranjo para o Brass Band, então posso fazer o arranjo que quiser fazer. Na TV tenho que ser convidado para fazer alguma coisa. Não tenho muita autonomia para poder decidir e falar: agora quero fazer um drama, um personagem intenso. No teatro tem mais possibilidade de criação. Inclusive, este ano estou escrevendo uma peça, que vai rodar o Brasil e estou querendo chegar com ela em Goiânia. Chama-se Caô. Aguarde! Mas a música é a minha banquinha mais próxima, porque posso fazer o meu CD, meu show e posso entrar nesse mercado, como vendedor de CD, vendedor de show. Agora para fazer um filme, por exemplo, depende de uma indústria muito grande. É muito mais complicado, no entanto, o prazer para mim, seja dizendo: “Ser ou não ser”, ou “dó, ré, lá, si, dó, é a mesma coisa. É um prazer muito grande trabalhar com o que a gente gosta.

 

DMRevista- Sempre foi mais difícil para atores negros conseguirem bons papéis, mas vê melhoras neste sentido?

Serjão Loroza- Ser artista é uma coisa muito difícil no Brasil, independente de qualquer coisa. Ser negro no Brasil é uma coisa difícil, independente de qualquer outra coisa (risos). Agora ser artista e negro é muito mais difícil ainda (risos). Mas, de certa maneira, acabei alcançando uma cidadania que não tinha antes. Só por ser artista. Mas o caminho é longo, tem uma série de coisas que a gente já conseguiu vencer né. Costumo dizer que não é o bastante, mas nós já fizemos bastante coisa. Agora existe uma carência de autores negros que podem escrever histórias sobre negros. E de diretores negros, porque são eles que geralmente escalam atores para os papéis. Tem vários atores negros bons, mas às vezes eles não têm a possibilidade de se mostrar, porque são poucos os personagens para negros.

 

DMRevista- Na política estamos vivendo dias difíceis. Muitos artistas têm se manifestado. Outros preferem não opinar. Como você se posiciona?

Serjão Loroza- É… Tá muito complicado, principalmente a sociedade que entrou em uma divisão, que parece um pouco tola. Porque, na verdade, deveria ser nós, o povo, contra os corruptos, independente de coloração partidária. Acho que é isso que eles (os políticos corruptos) querem mesmo. Que a gente se deslumbre e fique tudo separado mesmo. Sou daqueles que buscam uma igualdade social, um menor desnível social, pelo menos assim. Então automaticamente as pessoas me veem mais como esquerda. Eu nem sei se sou mesmo. Mas o que acho mesmo é que o Brasil é muito bom em MMA, né? Que tem vários campeões, vários cinturões. No entanto, a gente não é o país do MMA, do Street Fighter (risos), e sim da capoeira. E na capoeira a gente precisa sempre assimilar o golpe (risos). Então, de qualquer maneira, golpe ou não (e na minha opinião acho que foi um golpe), é assimilar o golpe e partir para frente, para poder continuar a luta. Porque senão fica no vacilo de ficar esperando as coisas e não dialogar. Então acho que a gente tem que ir para frente, não tem mais jeito. Os livros do futuro que dirão o que aconteceu. Precisamos caminhar, enquanto país, enquanto sociedade e enquanto mundo. A situação na França, Inglaterra, nos Estados Unidos também está complicada. O mundo está passando por uma mudança estrutural e isso influencia na nossa vida cotidiana. Mas temos que partir para cima.

 

DMRevista- Como convida os goianos para o show amanhã?

Serjão Loroza- Olha, vai dar onda, morô? E vai dar praia. Vai ser maneiro. Peço que neguinho vá com espírito de diversão, porque a gente vai se divertir pra caramba. As pessoas acham que diversão, cultura, arte é uma coisa secundária. E não é não! É muito importante. Até porque a gente não quer só comida. A gente quer comida, diversão e arte (risos). É o momento de a gente extravasar e ganhar energia para enfrentar todas as diversidades que a vida traz. Vamos celebrar.

 

A gente não é o país do MMA, do Street Fighter  e sim da capoeira. E na capoeira a gente precisa sempre assimilar o golpe. Então, de qualquer maneira, golpe ou não (e na minha opinião acho que foi um golpe), é assimilar o golpe e partir para frente, para poder continuar a luta”

 

Show do Serjão Loroza no deu Praia

Quando: Amanhã, a partir das 18h

Onde: Av. Americano do Brasil, Parque Areião, Setor Marista (ao lado do quartel do Bope)

Ingresso: R$ 60 reais (feminino) / R$ 80 reais (masculino)

Vendas: Clube Crossfight Marista (Rua 1145, St. Marista) e Tribo do Açaí

 

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