Jornadas de Junho – 5 anos depois aborda a importância das manifestações de 2013
Redação
Publicado em 10 de julho de 2018 às 21:40 | Atualizado há 2 semanasPassados exatos cinco anos das manifestações de rua que chacoalharam o Brasil em 2013, um dos movimentos mais originais, complexos e incompreendidos de nossa História ganha novo olhar e interpretações com o lançamento do livro Jornadas de Junho – 5 anos depois. Didática, densa e recheada de episódios curiosos, a pesquisa da jornalista Tiana Maciel Ellwanger traz uma série de reflexões originais sobre o que foram os protestos, suas representações, memórias, e sobre como eles mudariam para sempre os rumos do País.
Em 2013, as manifestações tiveram como faísca o aumento de 20 centavos na tarifa do transporte, mas logo incorporaram pautas mais amplas, como a violência policial, os altos investimentos em eventos esportivos, a precariedade dos serviços públicos e a corrupção. Depois de mais de 20 anos sem ir maciçamente às ruas, multidões de brasileiros ocuparam o espaço público de centenas de cidades, sem convocação de partidos, lideranças políticas ou veículos de imprensa. Queriam ser ouvidos e mais bem representados. Foi uma surpresa para todos, sem exceção: governos surfavam em altos índices de aprovação, serviços eram relativamente bem avaliados e a economia estava longe de uma crise.
“Junho de 2013 sacudiu e incendiou o País de forma inédita, espontânea e surpreendente. É um movimento extremamente complexo, multifacetado, silenciado e mal compreendido até hoje. Em plena Copa das Confederações, o País do futebol se interessou mais pelo que acontecia nas ruas do que pelos jogos. Acredito que mergulhar em profundidade nas muitas camadas desse movimento, relacioná-lo com o que veio antes e depois, e pensar no contexto em que as insurgências eclodem nos permite compreender melhor a história recente do País e a própria contemporaneidade”, avalia a autora, que também é mestre em Comunicação e Cultura e especialista em História do Brasil.
MEMÓRIA DE 2013 É TRANSFORMADA PELOS ACONTECIMENTOS DOS ANOS SEGUINTES
Reflexões sobre a memória de 2013 e os gatilhos recentes para lembrar os protestos compõem um dos capítulos da publicação. “Nossa memória está muito mais relacionada ao presente do que ao passado. O que aconteceu nos últimos anos certamente influencia e transforma as memórias de 2013. É muito comum ver pessoas confundindo as Jornadas de Junho com os protestos pelo impeachment em 2015 e 2016, por exemplo. Em um dos tópicos, relaciono justamente as interseções e, principalmente, as diferenças entre os dois movimentos”, revela a autora. “Da mesma forma, mais recentemente, o movimento dos caminhoneiros e de empresários do transporte trouxe novamente narrativas comparando 2018 a 2013. O livro foi para a gráfica antes desta greve, mas em julho de 2013 também houve protestos de caminhoneiros, bloqueios de estradas e até mortes relacionadas, como agora. Mais uma vez, há interseções, mas muitas diferenças também. Um dos objetivos do livro é, junto com o leitor, pensar como acontecimentos ocorridos nesses cinco anos – entre eles as manifestações após a execução da vereadora Marielle Franco no Rio de Janeiro –, aproximam-se e distanciam-se das Jornadas”, detalha Tiana. “Marielle é considerada uma voz de 2013 e, no livro, auxiliada por quem estava próximo dela, refletimos sobre essa relação entre 2018 e 2013”, complementa.
Em Jornadas de Junho – 5 anos depois, a pesquisadora aborda ainda as consequências da chamada pós-verdade – com a avalanche de notícias falsas que se disseminam mais rapidamente do que as verdadeiras e influenciam rumos do Brasil e do mundo, a exemplo da eleição do presidente norte-americano Donald Trump – e do filtro bolha, que nos isola ideologicamente de quem pensa diferente a partir do direcionamento individualizado de informações feito pelas redes sociais e sites de busca. Nesse contexto, Tiana traz reflexões sobre nossa democracia e possíveis ameaças a ela.
O livro também relaciona a chamada Primavera Brasileira a outros movimentos ocorridos no mundo na última década – a exemplo da Turquia, Tunísia, Espanha, Portugal, Grécia, Estados Unidos e Chile –, além de pensar as diferenças e semelhanças com movimentos históricos, como Maio de 68 e a Revolta das Barcas, em 1959, no Rio de Janeiro. Há ainda uma abordagem menos factual, que trata da solidariedade, da ressonância e dos afetos envolvidos nas manifestações. As coberturas da mídia corporativa e da mídia ativista também são abordadas em profundidade no segundo capítulo, a partir da análise de 45 edições do Jornal Nacional e de aproximadamente 30 horas de transmissões ao vivo do coletivo Mídia Ninja entre junho de 2013 e fevereiro de 2014.
OPINIÕES SOBRE O LIVRO
“Uma percepção fina, atenta aos detalhes e às sutilezas, se une à sagacidade e argúcia de quem busca enxergar amplo e estabelecer relações complexas. Por isso, o trabalho vai além das manifestações e nos presenteia com uma bela reflexão sobre o jornalismo, a memória social e os dilemas políticos dos tempos em que vivemos”. (Ana Paula Goulart Ribeiro, professora da Escola de Comunicação da UFRJ e responsável pela redação do livro Jornal Nacional: a notícia faz história).
“Tiana traz um livro cheio de esperança contra esse nosso momento de desencanto e pós-verdade. Há nestas páginas inteligência e amor. E devem ser lidas assim. É um privilégio abrir um livro com tanta promessa”. (Marcio Tavares d’Amaral, professor emérito da UFRJ e autor de diversos livros, entre eles Os assassinos do sol: uma história dos paradigmas filosóficos).
“Contextualizando histórica e socialmente as manifestações que tiveram lugar no Rio de Janeiro, a autora produz uma história do tempo presente, que se funda sob ruínas de passos desencontrados e descompassos pela vida que continua moldando uma história em movimento. Sem dúvida, tal como a autora reconheceu, essa reflexão histórica produz mais do que uma referência à memória do período: desvenda vários véus sobre as manifestações, procurando compreendê-las em toda a sua complexidade. Que as Jornadas de Junho, vistas inicialmente como ruínas de um tempo por vezes incompreensível, possam ser melhor compreendidas, a partir desse livro, para que sob as ruínas floresçam a esperança de dias menos sombrios. (Marialva Barbosa, professora da Escola de Comunicação da UFRJ e professora de Jornalismo aposentada da Universidade Federal Fluminense. Autora de História da Comunicação no Brasil e História Cultural da Imprensa–1900-2000).
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