Opinião

A solidão pós-bebedeira e mão nas costas

Diário da Manhã

Publicado em 16 de outubro de 2018 às 00:33 | Atualizado há 6 anos

A migo sofredor, eis que o assoprador de apito assinalou no último domingo fim de jogo. Confesso que vai fi­car insustentável sem fu­tebol. Uma verdade irre­mediável, inquestionável: domingo à tarde, depois de curtir a ressaca, pensar em mudar de vida na so­lidão pós-porre, vai bem assistir o time do coração, nem que seja para proferir impropérios aos jogadores.

Já escrevi neste espaço: futiba é coisa séria, e o su­jeito, ao escolher um time, assume um compromisso pelo resto da vida.

A dor e a alegria, res­ponsáveis por alterar o es­tado de espírito do torce­dor durante 90 minutos, atenuam a falta da com­panhia de um solitário. Afinal, res­saca é sinônimo de solidão, e, para apimentar esta crônica, a bagunça quase diária que vos batuco, inda­go: qual é o momento em que tu sentes mais falta de alguém?

Sei que tal questionamento é, no mínimo, acanalhado, não há nada mais insuportavelmen­te inapropriado. Ainda mais em uma ressaca, caro leitor, o pior dia para aguentar o tranco e o tal mal-estar na civilização.

Eis um fato: um homem tem de beber, e procurar não dar mui­to espaço entre um gole e ou­tro, para sentir os efeitos da vida mundana e refletir sobre seus atos com parcimônia.

Sim, a pergunta que fiz não é de bom-tom, todavia a imagem que vi em minha janela, tomando por milhares de pensamentos acerca do esquema tático optado por Jair Ventura para a estreia no Paulistão diante da Ponte Preta, doeu-me de­mais da conta.

Mandei, até, às favas o timeco do Corinthians e esqueci nossa de­ficiência ali dentro da grande área. Jesus Santíssimo, rogai por mim!

Deixe eu lhe contar, amigo, o que motivo desta verborragia: uma balzaquiana nata, polaquinha, ca­belos loiros, corpo desenhado mi­limetricamente, como no clássico do curitibano Dalton Trevisan, na casa de seus 30, 35 anos, tentava co­çar as costas, bem no meio, na noi­te do último domingo, e não con­seguia, não conseguia.

Eu vi, é lógico que vi: ela não con­seguia mesmo, de jeito nenhum.

Pensei em atravessar em direção ao prédio dela e me oferecer gentil­mente para lhe coçar. Mas, depois de avaliar a situação, desisti, embo­ra eu topasse me casar com ela de papel passado e tudo o mais. Pon­derei por alguns momentos acerca de qual terno usaria no dia do casório.

Cheguei a pensar em apresentá-la para meus pais, vê se pode!

Minutos depois, apa­guei o cigarro que pita­va e recolhi minha cabe­ça para dentro da janela. Não ter ninguém para co­çar o meio das costas, este ponto crucial da beleza fe­minina, pode ser interpre­tado como um desleixo imperdoável por parte do sujeito que a deixou nessas condições. Se eu fosse de­legado, prendia logo o in­feliz que a fez sofrer.

Tu que eres compro­metida (o), ao contrário deste vagabundo literário que te enche a paciência, há de aproveitar a compa­nhia que tens. Das panca­das da solidão, coçar as costas sem ninguém é, disparado, a mais do­lorosa.

Pior até do que a falta de com­panhia para o almoço de domingo, isso não é nada. Basta pôr a lasanha de mercado, aquela que custa R$ 10, no forno, e tudo certo.

O almoço do solitário também não é nada. Se quiser, podes até con­vidar aquela mina que está afim há tempos para degustarem o (des) sa­bor de uma lasanha congelada. Mas há quem esbraveje que o pior mo­mento para se estar sozinho é quan­do se adoece. É superável, porém complicado. Vai por mim.

Mas nada, em hipótese alguma, será como coçar as costas sozinho, e não conseguir. Maldita Coceira nas Costas Crônica (CCC), meu caro Luis Fernando Verissimo.

Até a próxima crônica do lirismo solitário, da observação cuidadosa e sentimental. Abraço a todos.

 

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