As mulheres das artes
Diário da Manhã
Publicado em 7 de dezembro de 2018 às 12:13 | Atualizado há 6 anosForça orgânica. É dessa forma que as mulheres costumam descrever produções artísticas e intelectuais comandadas por seus pares. Mas ainda assim é possível vê-las em posição subalterna em relação aos homens. Ora, me diga quantas vezes você entrou em um museu e deparou-se com alguma obra de artes visuais que tenha sido feita por mulheres? Poucas, para não dizer inexistentes… Agora, faça o mesmo exercício e pergunte-se quantos quadros idealizados por homens viu expostos? Nossa, são altos, muitos… Picassos, Dalís… Pois é, o mesmo aplica-se ao cinema, à literatura e à música.Força orgânica.
É dessa forma que as mulheres costumam descrever produções artísticas e intelectuais comandadas por seus pares. Mas ainda assim é possível vê-las em posição subalterna em relação aos homens. Ora, me diga quantas vezes você entrou em um museu e deparou-se com alguma obra de artes visuais que tenha sido feita por mulheres? Poucas, para não dizer inexistentes… Agora, faça o mesmo exercício e pergunte-se quantos quadros idealizados por homens viu expostos? Nossa, são altos, muitos… Picassos, Dalís… Pois é, o mesmo aplica-se ao cinema, à literatura e à música.
Apesar de constatar a falta de representatividade nesses espaços, não é propriamente sobre isso que eu desejo falar nesta matéria. Minha ideia desde o início foi reverenciar (na condição de homem e, portanto, sujeito com incontáveis falhas por receber uma educação patriarcal) o rolê que as manas articulam por meio de iniciativas que visam – além da luta contra a dominação masculina na produção intelectual – a democratização dos meios de comunicação. Uma das iniciativas mais interessantes que vem rolando em Goiânia nesse sentido é o Jornal Metamorfose.
Formado por sete mulheres e dois homens, o coletivo produziu recentemente o videoclipe As Flores do Cerrado, composição da vocalista da banda punk goiana Guerrilha dos Coelhos Mutantes, ngela Vitorette Leite. Com pegada feminista, mas tendo como objetivo ganhar mentes e corações, o EP será lançado hoje na Casa Liberté, no Setor
Central, e contará com roda de conversa sobre produção independente feminina. Dentre as convidadas para falar sobre o assunto, está a produtora do festival de cinema Goiânia Mostra Curtas (considerado um dos mais importantes do País), Maria Abdala, 56.
Em entrevista ao DM Revista, Abdala disse que esse tipo de discussão é importante para a cidade e sempre apresenta o que está sendo feito de novo na cena cultural. “É muito bom falar sobre qualquer tipo de assunto e o que cada um vem produzindo. É interessante esse projeto e o que ele traz para a cidade, pois a arte tem esse poder”, afirma a produtora cultural. Ela destacou ainda que é de extremo perigo um Estado sem cultura e reconheceu que as produções independentes precisam ser mais fomentadas por meio de editais e leis de incentivo. “O Estado precisa devolver à sociedade às produções artísticas”, explica.
“As mulheres estão acostumadas a ocupar espaços subalternos dentro das próprias produções independentes. A gente participa dessas produções, mas nunca na condição de poder, como roteirista, videomaker e editora”, diz a jornalista e cineasta, Júlia Lee, 22, que participou das filmagens do clipe. “Esse tipo de iniciativa mostra que é possível reunir várias manas para fazer um projeto só de mulheres, que é foda e que dá super certo. É um rolê que dá muita voz porque dá visibilidade a nós. Isso é uma questão bastante importante”, comenta Lee, que faz parte do Jornal Metamorfose.
Local de fala
Integrante da banda de punk rock Guerrilha dos Coelhos Mutantes, a vocalista e compositora ngela Vitorette comentou sobre a sensação que teve quando estava gravando o videoclipe As Flores do Cerrado. Em entrevista a repórter Júlia Lee, do Jornal Metamorfose, a cantora disse que foi possível compreender qual era o lugar de fala ao juntar performance, cinematografia e artes visuais no clipe. “O espaço se tornou símbolo de resistência com isso, mais sólido. Aí o negócio é: nada vai nos abalar, é como se estivéssemos com munição e pronta para ir à guerra”, afirma ela, que também é compositora.
Em sua formação atual, a banda é composta por Danilo Brito na guitarra, Filipe Aguirre na bateria, ngela Vitorette no local e Gabriel Vitorette no baixo e vocal. Os coelhinhos mutantes, como são chamados carinhosamente pelo público, são fruto de uma mistura de estilos musicais regionais e das grandes metrópoles do Brasil, formando o famigerado mexidão goiano.
Daí, o quarteto (genuinamente do Cerrado, vale frisar) carrega em suas composições referências que perpassam pela new wave oitentista, disco music setentista e pós-punk inglês, sendo possível notar ainda o suingue quentíssimo do funk e o balão do bailão – ora, o que esperar dessa galera que tem, antes de tudo, sangue tupiniquim correndo nas veias?
A banda carrega consigo a ideia de que a música é uma mensagem e, como tal, precisa ter letras empoderadas de protesto, retratando problemas sociais que convivemos em nossos cotidianos… Tudo isso sem nunca perder o ar cômico que lhes caracteriza e que tornou-se marca registrada dessa sonoridade diversa e gosta aos ouvidos. Ah, antes que eu me esqueça, o charme deles está na voz doce e inconformada de ngela Vitorette.
Esqueça os caducos que tocam rock por aí cheios de verdades pré-concebidas sobre arte. O que deve ser ouvido, e vem pedindo para ser ouvido (o que em minha cabeça é difícil de entender por que tamanha resistência), é esta galera fodastica do Guerrilha. E aí, até quando vai ignorar?
Atraso
A invisibilidade feminina no meio artístico é um fator que afetou o desenvolvimento de várias formas de artes, como a fotografia e o design, por exemplo. Assim, comparadas à extensa lista de nomes masculinos na produção de obras do Renascimento, antecessor das artes típicos da período da reprodutibilidade técnica, as mulheres que eram citadas como artistas praticamente não tinham espaço.
Enganou-se, contudo, quem acreditou que com o passar dos anos isso iria mudar. “As mulheres que queria pintar aprendiam a fazer isso escondidas no ateliê dos pais”, disse a cientista social e professora Carla Cristina Garcia, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) em palestra na instituição.
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