Opinião

PEC 241 e seus impactos na saúde e educação

Diário da Manhã

Publicado em 12 de outubro de 2016 às 02:50 | Atualizado há 8 anos

Para que fique claro: minha intenção não é defender ou dizer que acredito nas mudanças propostas pela PEC, mas apenas esclarecer mentiras desnecessárias que andam correndo no movimento contra o golpe que não precisam acontecer. Críticas técnicas, vindas de economistas que entendem do assunto, são mais coerentes e reais do que os falaciosos “esse governo odeia pobre” ou “a mudança é apenas para beneficiar os ricos”, que a esquerda prefere reproduzir.

A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241 foi aprovada em primeiro turno nesta segunda feira, dia 10, por 366 votos a 111 e duas abstenções, fixando um teto para os gastos públicos por 20 anos. O texto ainda precisa passar por uma segunda votação, onde também serão discutidos destaques específicos da PEC.

A PEC cria um limite para as despesas primárias federais, que só serão ajustadas pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor, o IPCA, impondo limites para os poderes Executivo, Judiciário e Legislativo. Na prática, o Novo Regime Fiscal propõe limitar o ritmo de crescimento dos gastos da União à taxa anual da inflação.

Quando passou à frente da área fiscal, Henrique Meirelles, ministro da Fazenda, tinha três objetivos: impedir que a dívida continue crescendo, reverter o déficit orçamentário do País e fazer a economia sair da recessão em que se encontra. A estratégia costumava ser óbvia na história econômica do Brasil: se aumenta os impostos e a responsabilidade de pagar a conta cai no colo do cidadão. Contudo, as experiências frustradas no assunto (com os últimos vinte anos de contínuos aumentos de carga tributária) fizeram o ministro apostar em algo diferente.

Para superar o problema atual e voltar a crescer, o Brasil precisa economizar pelo menos 2% do PIB, um valor de R$ 120 bilhões. Somando ao que o país gasta além do que recebe (R$ 170,5 bilhões), o valor chega a assustadores R$ 300 bilhões. Tentar resolver isso com cortes de gastos do governo é totalmente impossível, mesmo que vários ministérios fossem cortados e 100% dos funcionários públicos federais fossem demitidos.

Então a solução de Meirelles, apesar de impopular, é prática: crescimento. A PEC sugere que o governo não aumente impostos e nem corte gastos em programas sociais, e compense gastando menos, pautado na realidade financeira do país, nos próximos 20 anos.

As posições diante do tema são muitas no conflituoso cenário da política nacional. Opositores ao governo Temer acusam o ajuste de não ser a solução para o desequilíbrio fiscal do país, e que a lei ameaça diretamente as áreas da saúde e da educação.

Um dos principais questionamentos é que, ao congelar os gastos, a PEC paralisa também os valores que podem ser repassados a áreas fundamentais do país, como a educação e a saúde, além dos gastos em programas sociais. Hoje, os investimentos nesses segmentos podem crescer todo ano.

Mas a realidade não é bem essa, se o texto da lei for lido. Existem exceções dentro da PEC. Entre elas, está o Fundeb, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica. O fundo tem um orçamento previsto para 2016 de R$ 138 bilhões, 35% a mais que todo o Ministério da Educação. Isso não será alterado pelo novo regime.

Dentre os 6,6% do PIB brasileiro gastos em educação em 2015, um valor de R$ 389 bilhões, apenas 21% disso foi gasto pelo governo federal. Todos os 80% restantes foram recursos tirados dos cofres dos Estados e municípios, que também não serão afetados pela lei.

Ainda assim, o gasto federal em educação não necessariamente ficará congelado como está hoje. De acordo com a regra, o valor de 2017 será calculado com base no que for empenhado e não naquilo que for efetivamente gasto em 2016. Com esta pequena mudança, o orçamento para 2017 será maior do que em 2016, e depois disso será mantido igual, com reajuste pela inflação. Na prática, no entanto, o que mais importa aqui é que, com a PEC, os cortes na área feitos em 2015 e 2016, no governo Dilma, se tornam proibidos.

Mas se quiser, o Congresso pode sim aumentar os gastos com Educação e Saúde, contanto que mostre de onde esse recurso está vindo. Ou seja, de onde dos 80% restantes do orçamento que não estão voltados para esse objetivo.

No caso da saúde, não é muito diferente. Assim como na educação, uma porcentagem considerável é de responsabilidade dos Estados e municípios, 25,5%, ou da área privada, 56%. Dos 19% que sobram para o governo federal, a PEC definitivamente irá trazer uma perda, apesar de ser impossível contabilizar de quanto será.

O que pode ser dito é que, com a nova regra, os gastos em saúde irão sair de 13,7% do PIB para 15%. Com isso, em 2017, a área da saúde irá ganhar R$ 10 bilhões a mais. De acordo com a pesquisa do Conselho Nacional de Secretários da Saúde, os gastos na área irão perder R$ 31 bilhões até 2026.

Processo

Com cinco anos de políticas voltadas ao incentivo do setor produtivo, o governo federal foi responsável por injetar mais de R$ 450 bilhões em aportes para que bancos públicos realizassem empréstimos a juros menores para grandes e médias empresas. Além dos R$ 458 bilhões que deixaram de ser arrecadados pelas desonerações fiscais. No fim desse processo, a dívida pública cresceu R$ 2 trilhões. Apenas entre 2013 e 2016, a dívida saltou 15 pontos do PIB.

Para fechar as contas é preciso cortar gastos, gastos estes que são resguardados pela Constituição e não podem ser mudados. Para fugir das regras, a PEC propõe que os gastos se mantenham como estão hoje, e que o crescimento do país e a inflação anual vão cobrindo a diferença.

As críticas são muitas, as opções mais radicais também. Mas em busca de criticar e ir contra tudo que o governo de Michel Temer faz, por ser golpista, a atual oposição está se valendo de argumentos falaciosos, e muitas vezes mentirosos, para deslegitimar o processo.

A solução dada por Meirelles é sim controversa e ortodoxa, e se mostra difícil e dura, principalmente por seu prazo de 20 anos. Mas existem coisas positivas, a PEC proíbe que existam cortes em programas sociais, não haverá aumento de imposto, o funcionalismo público não terá perdas reais em seus salários (como ocorreu entre 2011 e 2016), a dívida pública irá estabilizar e os juros irão cair em médio prazo.

Enfim, para finalizar, é sempre bom lembrar que, em ao menos três ocasiões, Lula tentou convencer Dilma a indicar Henrique Meirelles ao cargo de ministro da Fazenda. Na última delas, o ex-presidente já tinha certeza que quando assumisse a Casa Civil, o economista faria parte da equipe, e o ajuste fiscal tomaria seu rumo.

Tamanha confiança detida por Lula de que Meirelles era a pessoa certa para o cargo não nasceu do nada. Em seus oito anos no comando do Banco Central, quando topou sair do PSDB para ocupar uma das posições mais importantes do governo Lula, Meirelles foi um dos nomes responsáveis pela bem-sucedida política que permitiu ao país reduzir a taxa de juros de 26,5% em fevereiro de 2003 para 10,75% em dezembro de 2010.

 

(Matheus Cruvinel, jornalista e editor do Diário da Manhã)

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