O Cerrado é o berço das águas brasileiras: até quando?
Diário da Manhã
Publicado em 12 de junho de 2016 às 02:00 | Atualizado há 9 anosO mês de junho, além de assinalar o início do inverno em nosso país, é, também, o mês do meio ambiente.
Isso nos permite tratar de um dos assuntos mais cruciais para a sobrevivência da humanidade nos últimos anos: a necessidade de preservarmos o meio ambiente, sob o risco de colocarmos em risco a própria sobrevivência do homem sobre a face do planeta terra.
O dia 5 de junho foi instituído como O Dia Mundial do Meio Ambiente pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 15 de dezembro de 1972, durante a Conferência de Estocolmo. Nessa mesma conferência foi aprovado, também, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente.
A preocupação da ONU teve como objetivo acentuar a conscientização da população mundial sobre os temas ambientais, principalmente quanto à preservação.
A ONU quis, também, chamar a atenção das pessoas, como agentes ativos, para o seu papel na preservação e valorização do meio ambiente.
Mesmo em meio à já tão decantada crise brasileira, tenho consciência de que não poderia deixar de abordar, mais uma vez, o tema.
O espaço geográfico onde se situa o Estado de Goiás, o Cerrado, possui uma área de 2,04 milhões de quilômetros quadrados, e representa 22% do território nacional e é o segundo maior bioma brasileiro, superado apenas pela Amazônia.
Embora ocupe a região Central do país, principalmente o Centro-Oeste, o chamado Cerrado estendido abrange o Estado de Goiás, o Distrito Federal, além de parte dos Estados de Minas Gerais, Rondônia, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Bahia, Tocantins, Maranhão, Piauí e Pará.
Além de sua rica biodiversidade o bioma Cerrado é chamado o berço das águas brasileiras e alguns pesquisadores chegam a chamá-lo de caixa d’água do Brasil, porque nele nascem as principais bacias hidrográficas do nosso País.
Somente para se ter uma ideia, o Pantanal, conhecido como uma planície inundável, depende do cerrado para as suas cheias, porque aqui estão as nascentes dos rios que o abastecem.
Tal é a importância hidrográfica desta região do Brasil que a ONG WWF-Brasil (Fundo Mundial da Natureza) mapeou todas as suas nascentes. O resultado é que o Fundo passou a considerar o bioma como um dos 35 prioritários em todo o mundo, ao lado do Pantanal, para a conservação.
A importância do Cerrado é absolutamente notável: o bioma tem 20 mil nascentes e irriga nada menos do que seis das doze regiões hidrográficas brasileiras; dá sustentação hidrográfica para o abastecimento de 1 mil e 500 cidades em 11 Estados, que vão das fronteiras do Paraná até o Piauí, incluindo o Distrito Federal.
Além disso, as regiões beneficiadas por esse verdadeiro reservatório hidrográfico brasileiro são ocupadas por 88,6 milhões de pessoas. E, o que é paradoxal, as regiões que mais têm água no Brasil, Pantanal e Amazônia, dependem das nascentes do Cerrado.
Para a Bacia do Rio São Francisco, o chamado Rio da Integração Nacional, que corre para o Nordeste brasileiro, as nascentes do Cerrado contribuem com 94% das águas que fluem nos seus rios e córregos. Portanto, as águas do Brasil Central chegam aos Estados que estão no litoral do Norte e Nordeste.
O que é extremamente preocupante e alarmante é que essas fontes estão secando de forma absolutamente dramática. Há provas de morte no berço das águas.
O fato grave é que os recursos hídricos do Cerrado estão seriamente ameaçados. As águas de muitos cursos hídricos, até há pouco consideradas inalteráveis, chegaram a um limite de não recomposição de forma natural. Muitas fontes naturais se exauriram pelo mau uso e manejo incorreto dos cursos d’água.
Como comprovação, estudos da ONG ambientalista Conservação Internacional Brasil trazem evidências de que o Cerrado desaparecerá até 2030.
Pesquisas indicam que 57% dos 204 milhões de hectares originais já foram completamente destruídos, e nada menos do que a metade das áreas remanescentes está tão alterada que não poderá mais servir à conservação da biodiversidade.
A taxa anual de desmatamento no Bioma chega a escandalosos 1,5%, ou 3 milhões de ha/ano.
São levantadas como causas das pressões sobre o Cerrado a desordenada expansão agrícola, as queimadas descontroladas e o caótico crescimento das áreas urbanas.
Os estudos da Conservação Internacional, CI-Brasil, foram feitos em parceria com a ONG Oréades, que tem sede em Mineiros, e têm como base imagens de satélites. Segundo Ricardo Machado, um dos autores do estudo, “O Cerrado perde 2,6 campos de futebol por minuto de sua cobertura vegetal. Essa taxa de desmatamento é dez vezes maior do que a da Mata Atlântica, que é de um campo a cada 4 minutos”.
O pior é que há vozes que defendem que o desmatamento do Cerrado não é muito problemático, por não ter grandes coberturas de florestas tropicais, como a Amazônia.
O professor Ricardo Machado diz que tais pessoas ignoram que o Bioma abriga a mais rica savana do mundo, grande biodiversidade, além dos riquíssimos e imprescindíveis recursos hídricos.
Vamos repetir: nas chapadas do Cerrado estão as nascentes dos principais rios das bacias Amazônica, do Prata e do São Francisco.
Em Goiás, especificamente, preocupa a degradação do Vale do Paranã, que é alvo de preocupação do Conselho Estadual do Meio Ambiente, que criou, há algum tempo, uma Comissão Técnica temporária para tratar da questão.
Diante dessa tragédia anunciada, faz-se necessário que a política ambiental brasileira invista em ações de conservação, na proteção de mananciais hídricos, na recuperação de áreas degradas e na manutenção de áreas de conservação.
E todos tenhamos despertadas as nossas responsabilidades.
(Lúcia Vânia, senadora (PSB), ouvidora geral do Senado e jornalista)
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