Cotidiano

O preço da depressão

Redação

Publicado em 14 de abril de 2016 às 02:29 | Atualizado há 9 anos

Os pacientes veem melhora na saúde e maior disposição para trabalhar, o que gera lucros à economia do país

Entre os anos de 1990 e 2013, a quantidade de pessoas que sofrem de depressão ou de ansiedade no mundo subiu quase 50%. Atualmente, há no mundo 615 milhões de pessoas que precisam conviver com essas doenças. A Organização Mundial de Saúde (OMS) prevê que durante situações de emergência, uma entre cinco pessoas poderá desenvolver depressão ou ansiedade.

Por meio de um estudo da OMS e do Banco Mundial, os benefícios econômicos dos investimentos aplicados no tratamento de saúde mental foram calculados. Segundo o documento, o custo de casos de depressão e ansiedade à economia global é de US$ 1 trilhão, o que equivale a cerca de R$ 3,5 trilhões.

Todavia, o retorno é maior do que o gasto, tendo em vista que para cada US$ 1 investido em tratamento para ansiedade ou depressão, o retorno é de cerca de US$ 4.  Isso porque os pacientes veem melhora na saúde e consequentemente conseguem ter maior disposição para trabalhar.

Desse modo, o retorno do investimento feito é significativamente maior do que o investimento inicial, pois a participação na força de trabalho e a produtividade aumentarão, o que gerará lucros para a economia do país.

Depressão no trabalho

Maurício da Cruz (nome fictício), conta à reportagem do Diário da Manhã, que quando trabalhava como agente comercial em um banco de Goiânia no ano de 2014, foi acometido pela depressão, que influenciou significativamente na função que desenvolvia em seu trabalho.

“Eu tive uma sequência de coisas que aconteceram na minha vida. Fim de relacionamento, sérios problemas familiares, além do  meu desgosto com o curso que fazia na faculdade. Acho que tudo isso influenciou para que eu desenvolvesse depressão”, conta Maurício.

Ele recorda que o trabalho que desenvolvia no banco exigia que ele se relacionasse com pessoas todo o tempo, o que se tornou tarefa complicada. “Já era difícil antes, trabalhar com vendas em um banco, porque você precisa ser o máximo que uma pessoa simpática pode ser. Tem de convencer as pessoas e mostrar os benefícios daquilo que você tá vendendo. Acontece que quando entrei em depressão (e demorei a descobrir que estava), eu não conseguia convencer nem a mim mesmo sobre nada” conta ele.

A rotina do trabalho contribuía para que o estado mental de Maurício piorasse a cada dia, mas ele conta que o usava como ‘bode expiatório’ para justificar tudo o que considerava errado em sua vida.

A depressão o arrastou para um estado de tamanha desilusão a respeito de tudo na vida, que ele acabou pedindo demissão. “Pra mim, nada valia a pena, nada parecia ser bom o suficiente. E por mais que eu quisesse acreditar que estava tudo bem, ou que o produto que eu estava vendendo era positivo, só conseguia ser frio e distante. E fui um desastre nas vendas nesse período. Até pedir demissão”.

Ele acredita que o ato de abandonar o emprego o ajudou a dar um pontapé inicial na cura para a depressão. “Nos meses que se seguiram à minha saída do trabalho eu fui um inútil. Não produzi nada pra ninguém, muito menos para mim mesmo. Mas com a ajuda profissional eu consegui ir melhorando aos poucos, até que me curei e voltei a trabalhar em outro lugar”, conclui ele.

Profissões de risco

Sam Cyrous, psicólogo e psicoterapeuta no Instituto de Psicologia e Saúde Âme e docente na área de gestão de pessoas, explica que existem profissões que parecem ter uma incidência maior de transtornos como depressão e ansiedade. Ele esclarece que as profissões que lidam diretamente com segurança (policiais, generais de exército, bombeiros), ou que não têm poder de decisão final em determinados processos (co-piloto de avião e o controlador de tráfego áereo), ou ainda aqueles que querem ter uma missão mas que acabam caindo num redemoinho de outras coisas por resolver (professor alfabetizador, professor que instrui em alguma ciência, arte, esporte, enfermeiro, parteiro) podem ser mais propensas à desenvolverem doenças mentais como a depressão e a ansiedade.

“A depressão e a ansiedade acabam por se manifestar então pela falta de senso de propósito em nossas ações, pelo excesso de informação (e sensação de responsabilidade) e défice de controle e decisão e, pelo medo de que algo pode ocorrer a qualquer momento e não há nada que possamos fazer para mudar o curso das coisas”, revela Sam.

Segundo Sam, em decorrência da depressão, o trabalho acaba ficando relegado para segundo plano. “Da mesma forma que quando o nosso corpo não aguenta o trabalho sofre (quem com fome ou abstinência de sono consegue realmente focar a 100% no seu trabalho e produzir eficazmente?), quando a mente não aguenta o corpo e o trabalho juntos sofrem. Sintomas físicos (dores de cabeça, estômago e/ou costas), a sensação que algumas veias estão pulando querendo fugir do corpo, queda de cabelo, ciclo menstrual alterado, baixa de produtividade tanto em quantidade e qualidade, aumento de absenteísmo, e em muitos casos as pessoas acabam utilizando todas as desculpas para não ir trabalhar e nem percebem que estão apenas desenvolvendo esses sintomas”, argumenta.

Ele esclarece que a depressão ocorre quando as emoções estão fortes e acabam dominando a vida da pessoa. “É preciso, portanto, descobrir um equilíbrio entre as várias dimensões da vida — o corpo, o trabalho, os relacionamentos e o senso de propósito. O foco portanto não pode estar no passado (o medo de repetir erros e a culpa são características muito usuais) mas no futuro (dando a si mesmo a possibilidade de errar e aprender com os erros)”, explica ele.

O psicólogo destaca que meditação, filmes, leitura e exercício físico são estratégias que podem ajudar, mas a psicoterapia é fundamental. “Conversar em si é bom, ter amigos com quem contar, um líder que nos acompanha mais do que demanda, um grupo de apoio no trabalho com um ambiente agradável são de forte ajuda, mas a conversa “terapêutica” com alguém que compreenda realmente esses processos e que possa nos acompanhar no caminho de encontro da nossa missão — pessoal e organizacional —é fundamental para encontrar esse equilíbrio entre as várias dimensões da vida”, finaliza ele.

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