Povo vê impeachment como briga da elite
Diário da Manhã
Publicado em 13 de abril de 2016 às 02:39 | Atualizado há 9 anosLevantamentos indicam que para 71% das classes C e D, opositores da presidenta Dilma Roussef agem por interesses próprios e 92% concordam com a frase de que “todo político é ladrão”
O povo é mais esperto do que pensam as elites. É o que constatam os pesquisadores, Renato Meirelles, o presidente do Instituto Data Popular e Marcos Coimbra, diretor do Instituto Vox Populi. Segundo os pesquisadores, a ampla maioria da população não acredita no impeachment da presidente Dilma Roussef como solução para os problemas do país. O povo desconfia dos políticos e das elites, e mais do que discursos, quer soluções objetivas para os reais problemas do país, que estão muito mais além do que o combate (necessário) à corrupção.
Segundo Meirelles, as classes C e D enxergam a discussão sobre o impeachment da presidenta Dilma Rousseff como uma disputa de poder, uma briga da elite. “Isso acontece porque ela (essa camada da população) acha que essa é uma briga da elite. Ela não vê as pautas que realmente interessam presentes nessa manifestação”, disse Meirelles em entrevista à Agência Brasil.
De acordo com Coimbra, para maioria do chamado povão, os protestos atuais seriam de uma “classe média contrária ao PT”, que quer “apenas defender seus próprios interesses”. Em artigo na revista Carta Capital, o pesquisador do Vox Populi informa que em pesquisas qualitativas feitas nos últimos meses, percebe-se que as manifestações contra o governo e o PT do ano passado em diante passaram a ter, aos olhos da maioria da sociedade, a imagem de movimentos de “objetivos estreitos”, que “não lutam por direitos e melhoras para todos”, o oposto dos eventos de 2013, vistos como genuinamente universais em seu recrutamento e finalidades.
Renato Meirelles destaca que “as classes C e D são muito menos presentes nas passeatas do que são na população brasileira”. Essa parte da sociedade está mais interessada, de acordo com Meirelles, em temas concretos, como a melhoria do acesso à universidade ou da qualidade do sistema público de saúde. “Se algum dos dois lados quiser de fato ganhar a classe C, que hoje corresponde a 54% do eleitorado brasileiro, vai ter que quebrar um pouco a cabeça para mostrar que o que está em discussão vai além do debate da corrupção”, destacou.
Desconfiança
Levantamento do Instituto Data Popular, feito no início do ano, indicou que 71% dos brasileiros acreditam que os opositores à presidenta Dilma agem por interesses próprios. Além disso, 92% concordam com a afirmação “Todo político é ladrão”.
As acusações de que um não têm, na análise do presidente do Data Popular, impacto significativo sobre essa parcela da sociedade. “A narrativa sobre um eventual golpe é para uma parcela mais intelectualizada da população brasileira, para uma elite jurídica. Quando nós vamos ver na classe C e D que, em geral, é muito mais jovem do que a média da população. Eles não sabem o que foi o golpe militar e o impacto que isso teve no Brasil. Eles não entendem a discussão do golpe”, afirmou.
“O discurso sobre o golpe é muito eficiente para uma determinada parcela dos ditos formadores de opinião, mas diz pouca coisa para as classes C e D, que são a grande maioria dos eleitores brasileiros”, destacou Meirelles.
Liderança de Lula
Na avaliação de Meirelles, a presença do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode fortalecer o governo. “A presença do presidente Lula no governo Dilma ajuda a relembrar para a maior parte da população qual é o projeto deste governo”, disse.
O ex-presidente foi nomeado como ministro-chefe da Casa Civil, porém a indicação foi contestada e o Supremo Tribunal Federal vai julgar se ele pode assumir o cargo.
De acordo com o especialista, a presença dele no governo fortalece a articulação política. “Como a presidente Dilma tem uma popularidade baixa e não pode ser candidata à reeleição, ela tinha pouco a oferecer como perspectiva de poder para a base aliada. Hoje, caso o presidente Lula consiga assumir o ministério, ele consegue, de alguma forma, oferecer uma perspectiva de poder aos aliados”, analisou.
Pesquisa divulgada no último sábado pelo Instituto Data Folha aponta Lula como um dos favoritos na corrida para as eleições presidenciais de 2018, disputando a liderança com a ex-senadora Marina Silva (Rede).
Para Meirelles, a ausência de Lula do debate político nos últimos anos fez com que o ex-presidente perdesse força. “Acontece que o presidente Lula passou cinco anos sem aparecer, sem falar e sem se posicionar como um projeto de país que criou oportunidades para a população de menor renda do país. É como se o presidente Lula fosse uma poupança da defesa da imagem de um projeto de país que, em cinco anos, só sacou o dinheiro e não fez nenhum depósito”, comparou. “Isso fez com que boa parte da população se sentisse órfã de uma liderança que a defendesse”, acrescentou.
Na avaliação do especialista, os resultados dos dois mandatos à frente da Presidência ainda concedem um capital político considerável a Lula. “Nesse momento de total descrédito sobre quem pode tirar o Brasil da crise, ele é um dos poucos brasileiros capaz de dizer que enfrentou e venceu uma crise econômica como a gente vive hoje.”
Impeachment não é solução
Marcos Coimbra lembra que em dezembro de 2015, em outra pesquisa do Instituto Vox Populi, perguntou-se se “o impeachment de Dilma é a solução para o País”. Disseram “sim” 34% dos entrevistados e “não” 57%. Os 9% restantes responderam não saber. Em outras palavras: apenas um terço dos eleitores acredita que a saída de Dilma (ainda que desejada pela maioria em razão das insatisfações indicadas) resolveria os problemas atuais. O que mais chama a atenção no conjunto das respostas é quão objetivamente verdadeiras são as percepções populares a respeito de nossa vida política.
Para Coimbra, ao inverso do que supõem aqueles que se acham bem-informados e que desprezam as avaliações dos cidadãos comuns, quem está certo é o povo. De fato, Dilma errou gravemente no começo de seu segundo mandato e provocou insegurança real entre aqueles que mais precisam de um bom governo. A corrupção é grave e é de todos, embora a impunidade tenha diminuído. Mas, segundo Coimbra, quem vai às ruas gritar contra o governo não representa o País. E o impeachment de Dilma, principalmente quando se elenca quem o comanda, não é solução, alerta. “Sábio o povo, o que não quer dizer que seja ouvido. Como em inúmeras situações de nossa história, quem se acha no direito de tutelá-lo está prestes a ignorá-lo outra vez”, adverte. (Com informações da Agência Brasil e Carta Capital)
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