Orixás agredidos
Redação
Publicado em 12 de abril de 2016 às 03:21 | Atualizado há 2 semanasEstátua de Oxalá localizada em uma praça em Brasília foi incendiada na madrugada de ontem (11). A suspeita é de vandalismo por intolerância religiosa
Uma estátua de Oxalá, localizada na Praça dos Orixás, no setor Clubes Esportivos Sul, trecho 2, em Brasília, foi totalmente queimada na madrugada de ontem (11). O caso foi registrado na 1ª Delegacia de Polícia Civil (Asa Sul) como “dano ao patrimônio público”, mas a suspeita de membros ligados à religiões de matriz africana é de vandalismo por intolerância religiosa.
O incêndio aconteceu por volta da meia noite. Segundo informações veiculadas na internet, um homem que estava na praça fazendo oferendas aos orixás percebeu que a estátua de Oxalá estava em chamas e acionou o presidente da Federação de Umbanda e Candomblé de Brasília e Entorno, Rafael Moreira, que, por sua vez, chamou os bombeiros. Um morador de rua teria visto uma mulher descer de um carro e colocar fogo na estátua momentos antes.
O lugar, conhecido com o Prainha, abriga desde o ano 2000 as 16 estátuas de divindades relacionadas à Umbanda e ao Candomblé, sendo todas do artista baiano Tatti Moreno. A estátua de Oxalá, que é uma das divindades mais poderosas para os seguidores das religiões mencionadas, já havia sofrido ataques semelhantes anteriormente.
As 16 estátuas da praça foram restauradas em 2010 por um convênio entre a Fundação Cultural Palmares, a Secretaria de Cultura do DF e o Ministério da Cultura. Toda a obra custou cerca de R$ 750 mil. Desde então, entretanto, as obras já foram danificadas novamente. Segundo informações de moradores da região, metade das estátuas da praça apresentam sinais de vandalismo. Algumas perderam adornos, dedos ou objetos que carregam.
“Oxalá é o símbolo máximo da paz”
Quando atos de vandalismo como o que destruiu imagens que além de sagradas para algumas religiões, são também obras de arte, imagina-se que a divindade ‘atacada’ represente o lado obscuro do além, sendo relacionada a demônios ou entidades trevosas.
Acontece que uma busca pelo nome da entidade na internet revela que Oxalá é associado a sentimentos e qualidades que em nada lembram o satanismo ou qualquer aspecto espiritual negativo que pudessem justificar a agressão.
A reportagem do Diário da Manhã entrou em contato com membros de religiões que cultuam Oxalá de modo a descobrir quem é e o que a divindade representa. O umbandista Raniere Plotino, 34, explica que dentro da Umbanda Popular, Oxalá é um outro nome de Jesus Cristo. “Por isso na grande maioria dos Altares de Umbanda se encontra Jesus no ponto mais alto do altar. Jesus representa Oxalá assim como Buda. Dentro do sincretismo religioso de algumas casas de Umbanda é correto afirmar Oxalá como Jesus Cristo”, defende ele.
Kênio de Oliveira Silva, 48, babalorixá (pai de santo) pertencente ao Candomblé, informa que Oxalá é o orixá da criação, que está relacionado à trilogia da vida. “Nos elementos ele é o ar, ele é a divindade do branco, o símbolo máximo da paz. Ele é o orixá responsável pelo equilíbrio. Tudo que é branco lembra Oxalá”, explica.
No Candomblé, Oxalá não equivale a Jesus Cristo, embora as duas divindades apresentem semelhanças bastante intensas que permitem a comparação. “Oxalá é uma divindade do panteão africano, que os negros trouxeram para proteger, ele não tem nada a ver com o Jesus cultuado nas igrejas católica e evangélica”, argumenta Kênio.
Para Kênio, a estátua de Oxalá incendiada em Brasília é também uma obra de arte e representação cultural de um povo. “Esse caso de Brasília é uma pena. Os autores do ato contra a estátua não estão agredindo Oxalá, porque a estátua é apenas uma representação artística da divindade. Mas infelizmente muitas pessoas não respeitam a arte e a cultura, fazer o que não é mesmo?”
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