Opinião

‘Cultura’ do medo, projeto de governo?

Diário da Manhã

Publicado em 21 de março de 2016 às 23:39 | Atualizado há 9 anos

Começo esse artigo de opinião agradecendo ao presente jornal pelo espaço e pela possibilidade de exposição das ideias que se seguem. A imprensa, quando isenta de tendências partidárias ou devedora de favores ao poder público, é um dos fatores mais importantes para o amadurecimento da nossa recente democracia. Nesse caso, um caro leitor poder expressar sua opinião é de louvável valia social.
O tema que proponho para o momento tem como viés analisar a importância de se construir politicas públicas culturais condicentes com as carências e demandas de seus principais interessados, a sociedade.
Tendo em vista as várias interpretações e significações que a palavra Cultura pode nos dar, aqui, a delimito, para melhor desenvolver das ideias: por relações sociais e políticas (nesse sentido, compreenda política como pluralidade das ações e transparência, e não a canalhice dos agentes políticos que usam de cargos públicos passageiros como se fosse profissão) distintas, que se interagem atribuindo à sociedade uma relação de pertencimento e memória, com seus costumes, crenças, valores e paixões, num caráter identitário e de auto compreensão e socialização.
O exercício de reconhecer-se numa conjuntura externa é tão importante quanto o saneamento básico, a segurança pública, a saúde pública, o desenvolvimento urbano e a educação. Essa última, por sua vez, dialoga profundamente com a Cultura. No entanto, os modelos implantados até então são limitados por fronteiras permeadas a muros e redomas alienantes. É como consertar um carro nova geração com ferramentas do século passado. Enfim, para esse tema seria necessário outro artigo, mas, vamos adiante.
Esse encontro, atrelado à relação de pertencimento dum grupo, tradição, formas de se vestir, comer, cultuar deuses, enfim todas as representações coletivas, necessitam de artifícios mínimos para fruírem. O poder público, componente central na regulação das escolhas e hábitos de cada indivíduo, tem por obrigação cria-los. Ou seja, a formação da identidade individual e, consequentemente, coletiva quando não amparada pelas instituições normativas torna-se um trauma social.
A falta de constituição de ações operacionais na pasta da Cultura tem como herança perniciosa, por exemplo, o alto índice de violência urbana. Em Aparecida de Goiânia, município que compõe a Região Metropolitana de Goiânia, em 2015 passou a ser convida a configurar a lista das cidades mais violentas do mundo. O levantamento publicado por uma organização não governamental mexicana, trouxe à tona o resultado que já era esperado, tendo em vista a incessante negligência dos agentes públicos locais. O estudo, que colocou Aparecida em 29º lugar, levou em consideração a taxa de homicídios a cada 100 mil habitantes. Atualmente o município registra 47 homicídios para cada 100 mil habitantes, e o máximo considerado pela Organização Mundial da Saúde é dez.
Quantos indivíduos comporão essa lista de finados futuramente? Talvez, eu. Talvez o senhor (a), nobre leitor (a). O que a administração municipal vem tomando como ação para reverter esses dados?
Não há respostas, ou melhor, ações. Comandante de segurança novo não é o suficiente, se isto fosse, por que tantos outros antes foram remanejados?
Como questão de clarividência o município nunca teve tamanho investimento em infraestrutura. R$ 717,8 milhões, administrados entre 2009 e 2015, fomentaram as áreas de vinculações, vulgarmente conhecida como verba carimbada: educação e saúde. E, claro, o asfalto a manutenção da memória política tem de ser preservada, não é mesmo? E a Cultura? O que vamos fazer com “N’s” equipamentos públicos se não há nenhum investimento para os agentes culturais ocupa-los? Será se esse é o plano do governo, preservar a continuidade da Cultura do Medo, deflagrada nos parágrafos antecessores?
A omissão dos gestores executivos, legislativos e dos demais agentes públicos de não se preocuparem em construir ações que coadunam com o anseio social, promove a constituição da cultura do medo.
O corpo gestor que em seus cargos de auto escalão são ocupados por representantes escolhidas por nos, simplórios eleitores, ao não perceber ou se negligenciar da necessidade de instituir ações efetivas, torna-se ultrapassado: obsoleto. Isso é da própria dinâmica da vida pública, o que não acompanha tal, se torna ilegítimo.
O desserviço promovido pelo governo local aos agentes culturais é estrangulador. A isso é possível presumir que acontece ou por termos votado erroneamente, tendo em vista todas as mazelas do nosso sistema eleitoral, que, também, necessita de um objeto especifico para reflexão, onde o que impera é o dinheiro, troca de votos por gasolina, e tantas outras formas de corrupção. Ou por omissão dolosa do corpo tecnocrata instituída, tendo em vista, a mesquinharia política existente na composição dos cargos públicos.
Com isso a gestão pública tem a responsabilidade cívica de construir ferramentas que possibilite a criação de um corpo de leis específicos para as ações culturais. Corpo esse que nunca existiu no município.
Tendo em vista ano eleitoral, é necessário refletir, antes de votar, para saber se os futuros gestores públicos tenham a sensibilidade de tomar a Cultura como prioridade. Investindo em longo prazo em uma sociedade mais harmoniosa. Destituindo o discurso da mera falácia, e não tratando Cultura como mera abstração.
Que sejam exorcizados os fantasmas da ineficiência.

(Pablo Lopes, gestor cultural formado pela UnB e estudante de Ciências Sociais pela UFG. Participante do Movimento Mais Cultura em Aparecida de Goiânia-GO – [email protected])

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