Tão longes, tão pertos
Diário da Manhã
Publicado em 4 de novembro de 2015 às 01:17 | Atualizado há 9 anosEsta semana iniciou-se com um feriado no qual celebrou-se o Dia de Finados, data na qual torna-se mais intensa a lembrança dos entes queridos que deixaram de viver entre nós. Esse dia apresenta distintas reações entre as pessoas. Para umas é o momento de reflexão e preces à alma da pessoa que morreu; há a concentração do pensamento sobre a condição da mor te em si. Para outras, entretanto, a data não tem muito significado, pois a ideia acerca do significado da morte é abordada sob concepção bem diferente, considerando que nada mais é do que uma alteração da matéria. No primeiro caso a morte significa ausência, perda. No segundo, transmutação da matéria em energia cósmica que se expande e, por consequência, está presente em tudo.
Quando o meu pai faleceu a primeira impressão que tive foi a de que jamais sentiria a sua presença, por não poder imaginá-lo em algum ponto físico, firme, no qual fosse possível localiza-lo, encontra-lo. Posteriormente, percebi que a morte das pessoas que amamos não significa a sua ausência, o seu esquecimento. Extraordinariamente, a morte das pessoas amadas possibilita que elas possam estar presentes aonde quer que iremos. São nossas lembranças, nossos desejos de tê-las que determinam a presença ou, ao contrário, a ausência. Em vida, temos a certeza da ausência de alguém como, por exemplo, quando viajamos para algum lugar distante. Sabemos que aquela pessoa encontra-se em algum ponto distante que nos separa e que, para encontrá-la, um dos dois terá que se deslocar na direção do outro. A consciência da distância física que os separa torna real a separação, a ausência. A morte, todavia, tem a capacidade de causar a sensação da presença, onde quer que estejamos, da pessoa querida. Quando o meu pai era vivo e eu viajava, por mais que meus pensamentos fossem tomados pelo desejo de que ele estivesse ido comigo, havia a certeza de que ele ficara onde o deixei. Atualmente, posso experimentar a sensação de tê-lo comigo onde eu estiver. Não importa o fato dele ter sido sepultado em um local específico. A verdade é que é possível sentir a sua presença onde quer que eu esteja.
Para a ciência, a vida se encerra no momento da morte. A consciência, tendo origem física, existe unicamente como resultado de correlações materiais. Algumas doutrinas religiosas ou espiritualistas, entretanto, afirmam que a consciência não tem origem física e que transcende a matéria, que utiliza o corpo física apenas como instrumento para se expressar. Outra corrente assevera que a consciência tem uma origem física e encontra-se atrelada ao cérebro, mas há uma distinção entre os estados físicos da matéria (a massa encefálica) e os pensamentos que deles derivam. Para os adeptos dessa corrente a consciência atrela-se a algum tipo de matéria com ela não se decompõe com o advento da morte. Talvez haja, realmente, uma intercomunicação com as pessoas que transpuseram o plano físico e que essas nossas sensações não sejam meras construções motivadas por doutrinas de fé. Há razões para acreditar-se, cientificamente, na interconectividade de consciências. Muitos mistérios acerca da existência de cristais em nosso cérebro motivam o surgimento de teses sobre a existência de uma consciência ou força independente da matéria. O corpo, portanto, seria um mero hospedeiro ou captador dessa energia imponderável. Trata-se da glândula pineal, localizada superior ao colículo e atrás da stria medullaris, entre os corpos talâmicos, dorsalmente à região caudal do diencefálico. É derivada de células neuroectodérmicas e, à semelhança da retina, desenvolve-se a partir de uma invaginação do teto da parede do terceiro ventrículo. O filósofo francês René Descartes (1596-1650) afirmava tratar-se de uma glândula de ponto de união substancial entre corpo e alma. A glândula pineal é considerada um órgão com funções transcendentes. É considerada como sendo um terceiro olho devido à sua semelhança estrutural com o órgão visual. Situada no centro geográfico do cérebro, seria um órgão atrofiado em mutação com relação a nossos ancestrais. Os defensores dessa teoria consideram-na como uma antena. Considerando que a glândula pineal tem na sua composição cristais de apatita, esses cristais vibrariam conforme as ondas eletromagnéticas que captassem, o que explicariam fenômenos naturais como a clarividência, a telepatia e a mediunidade. De acordo com o psiquiatra e neurocientista brasileiro Sérgio Felipe de Oliveira, a glândula pineal seria o órgão sensor que capta as informações por ondes eletromagnéticas devido às propriedades dos cristais de apatita, que as converteriam em estímulos neuroquímicos de forma análoga às antenas de aparelho celular para sinais eletrônicos.
Em uma acepção Shakespeariana, há mais mistérios entre o céu e a terra do que sonha a nossa vã filosofia. Eu, particularmente, não vejo significado algum em celebrar aos mortos. Todas as pessoas queridas que tenham cessadas as funções orgânicas, as tenho em meu coração e em meus pensamentos. Dessa forma eu as eternizo em mim, guardando-as em minhas melhores lembranças. Diante dos mistérios que envolvem a Existência, pressinto-as e com elas interajo como anjos que, embora presentes, são invisíveis. Em corpo físico estão ausentes e tão longes, porém, em força e espírito, tão pertos.
(Manoel L. Bezerra Rocha, advogado criminalista – [email protected])
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