A cura do diabetes e os interesses contrariados
Diário da Manhã
Publicado em 29 de janeiro de 2017 às 00:40 | Atualizado há 1 semanaO médico goiano Áureo Ludovico de Paula está de volta ao noticiário nacional por conta de sua revolucionária técnica de cirurgia gástrica que cura o diabetes tipo 2 e outras doenças associadas. O motivo foi a exposição da nova fase do senador Romário – magro – após ter sido submetido à cirurgia de gastrectomia vertical com interposição ileal e ficar curado do diabetes. Ele foi fotografado na praia do Rio de Janeiro jogando futebol e com uma forma física classificada como “cadavérica” pela mídia.
O ponto de discórdia que alguns setores da imprensa divulgaram com base em comentários de médicos endocrinologistas é que a classificação de diabetes do ex-jogador Romário e seu índice de massa corpórea (IMC) eram baixos e que não seria recomendável a cirurgia. Áureo contesta essas afirmações e diz que isso incomoda a quem não tem dados científicos para a realização da cirurgia e que “interesses contrariados” alimentam a discordância.
Resultado
O IMC de Romário era 31, o que no entendimento de alguns entendidos no assunto deveria comportar o tratamento para o diabetes apenas com medicação, alimentando o bilionário mercado de remédios da indústria farmacêutica. Entretanto, Romário optou por fazer a cirurgia e o resultado foi “maravilhoso” segundo o próprio senador.
Áureo explicou para o Diário da Manhã o que significa a cirurgia, o que ela promove para os pacientes submetidos e quais os pontos de falha nos argumentos de seus perseguidores, dentre eles o próprio Conselho Federal de Medicina que classificava a cirurgia como experimental, mesmo sendo conhecida da medicina desde 1928 para tratamento do diabetes e suas doenças associadas, como colesterol alto e hipertensão.
O médico goiano é um sério candidato ao Prêmio Nobel de medicina, por isto desperta tanta inveja em quem não consegue alcançar seu brilhantismo e eficiência. Cirurgião gástrico e com ampla especialização em cirurgias laparoscópicas ele é chamado frequentemente para dar palestras, expor conceitos científicos e até para realizar cirurgias em várias partes do mundo.
Confira a entrevista na íntegra:
Diário da Manhã – Essa cirurgia significa de fato a cura para o diabetes e outras doenças?
Áureo Ludovico – Diabetes e a hipertensão são consideradas a primeira causa de hospitalização e mortalidade no Brasil. Em levantamento do Ministério da Saúde, as mortes causadas pelo diabetes no Brasil passaram de 24,1/100 mil habitantes, em 2006, para 28,7 mortes /100 mil em 2010, ano em que a doença foi diretamente responsável por 54 mil mortes no País. Entre 2000 e 2010 o número de mortes subiu 38%. Esse número pode ser maior, considerando que em apenas 35% a 40% dos casos as pessoas que morreram com diabetes tinham a afecção listada em qualquer lugar no certificado de óbito. Mesmo considerando o avanço do tratamento médico nos últimos 20 anos, com medicamentos novos e mais eficazes, os resultados ainda são decepcionantes, com grande número de pacientes sob o tratamento médico ainda não atingindo os resultados desejados. Certamente, esse foi o motivo que levou cada um dos pacientes operados a procurar alternativa terapêutica. Torna-se importante destacar que fui procurado, como médico e cirurgião, para tratar o enfermo. Não há oferta pública de tratamento. A decisão foi, e sempre será, do paciente e de sua família, após assinatura de termo de consentimento informado. A experiência mostra que a iniciativa de procurar tratamento cirúrgico, em geral, vem da constatação do sucesso de cirurgia em amigo ou conhecido. No caso do tratamento cirúrgico do diabete tipo 2, a universalização dos resultados disponíveis na literatura mundial seria muito bem vinda. Sabemos hoje que o tratamento cirúrgico é melhor que o tratamento clínico. A remissão do diabete é extremamente rara. Da mesma forma, torna-se importante sinalizar que não se trata apenas de controlar a glicose. O diabético não morre por hiperglicemia. É preciso controlar as consequências, principalmente vasculares, do diabete. A doença cardiovascular é a principal causa de óbito. A cirurgia também controla em porcentagens diferentes as principais doenças associadas ao Diabetes.
Diário da Manhã – Os resultados indicam sucesso alto ou relativo?
Áureo Ludovico – Os resultados apresentados pela operação de Gastrectomia Vertical com Interposição ileal, 90% de remissão do diabete tipo 2, não nasceram prontos. São produtos de análise dos casos onde não houve remissão, mesmo que sempre tenha havido melhora da afecção, que permitiram o aperfeiçoamento da técnica cirúrgica, procurando atuar em diversos mecanismos responsáveis pela doença. Um trabalho com 202 pacientes e seguimento variando até acima de 5 anos, foi publicado em 2012, em uma das mais prestigiadas revistas de cirurgias. A remissão do Diabetes atingido por esse trabalho é inigualável por outras técnicas. Importante enfatizar que cientificamente o IMC não é uma medida fidedigna como parâmetro de indicação cirúrgica. São vários os motivos, entre eles, não especifica se é gordura ou músculo. A perda de peso ocorre em consequência da gastrectomia vertical (procedimento do estômago), que faz parte da operação e é necessária para melhorar o esvaziamento do estômago de diabéticos. Outro fator é a própria dieta inerente a cirurgia do aparelho digestivo. Por fim, a “cura” ou remissão do Diabetes determina perda de peso. Aproximadamente, 85 a 90% dos pacientes atingem remissão do Diabetes e níveis semelhantes de remissão do problema colesterol, hipertensão arterial e outros. A cirurgia de Interposição Ileal já é feita em humanos desde 1928, com publicação na revista Annals of Surgery e foi utilizada ao longo dos anos para múltiplas indicações clínicas. São inúmeros os trabalhos em animais. A cirurgia é utilizada para tratamento da obesidade e doenças associadas, desde 1985.
Diário da Manhã – Como tem sido a aceitação da prática cirúrgica pela comunidade científica e pelas autoridades médicas?
Áureo Ludovico – O conselho técnico, a Câmara Técnica de Cirurgia Bariátrica e Metabólica do Conselho Federal de Medicina, composta por ilustres médicos e professores, aprovou a cirurgia tipo Gastrectomia Vertical associada à Interposição Ileal em 2010, como “Não Experimental”. Isso ocorreu após várias reuniões e seminários. O último deles, com a presença de mais de 40 profissionais especialistas de todo o Brasil. Isso está nas atas do CFM e no processo do judiciário. Pode existir mortalidade e em pacientes com IMC abaixo de 35, o índice de mortalidade é de 0,4%. As complicações são em sua maioria decorrentes do estado de Diabetes. A cirurgia é tão segura quanto cirurgias de obesidade padrão, em pacientes de alto risco. O Estudo do Hospital Sírio Libanês comparou a consagrada técnica bariátrica tipo Bypass Gástrico com a Interposição Ileal, atingiu remissão do Diabetes em 29% e 75%, respectivamente. Esse estudo foi divulgado pela Folha de São Paulo. Após tratamento clínico, não houve remissão. A cúpula diretiva do CFM, não especialista, não referendou a decisão técnica, em exemplo único na história desse tribunal ético. Inicialmente, a discordância faz parte do esclarecimento das ideias e do aperfeiçoamento científico. A unanimidade é uma utopia. As grandes descobertas da humanidade passaram por questionamentos que, com o passar do tempo, se afirmaram como verdades e outras caíram no esquecimento. A Justiça Federal considerou a cirurgia como Não Experimental. Essa decisão está em vigência, com efeito que atinge a todos no Brasil e que retroage no tempo. Portanto, a cirurgia nunca foi experimental.
Diário da Manhã – Essa cirurgia é feita em outros países?
Áureo Ludovico – A cirurgia está documentada em dezenas de publicações em revistas nacionais e internacionais com o meu nome e diversos outros autores, além de teses de doutoramento no Brasil, Canadá, Estados Unidos e outros. É realizada em países como Portugal, Itália, Índia, Turquia, Estados Unidos, França, Geórgia, Irã, e outros. O paciente com Diabetes tipo 2, independente do peso, é o ideal para a cirurgia tipo Gastrectomia Vertical com Interposição Ileal. Minuciosa avaliação com exames de pré-operatório e subseqüente seleção, é critério indispensável. Alguns pacientes podem ser excluídos.
Diário da Manhã – Quem não pode fazer essa cirurgia?
Áureo Ludovico – Pacientes com diabetes tipo 1 e com diabetes tipo 2 com complicações muito graves.
Diário da Manhã – É verdade que o senhor responde a vários processos judiciais pela prática dessas cirurgias?
Áureo Ludovico – Sim, é verdade que respondi, mas fui absolvido em todas elas. Foram todas julgadas improcedentes. Entretanto, eu não quero mais comentar nada referente a um advogado que foi flagrado em vídeo e testemunho percorrendo o Conselho Federal de Medicina sem nenhum pejo captando pacientes para moverem ações contra mim mediante vantagem financeira.
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