Dias piores estão por vir
Diário da Manhã
Publicado em 8 de dezembro de 2016 às 01:56 | Atualizado há 3 semanasVisto do 21° andar do imponente edifício sede do Banco Central do Brasil, em Brasília, o panorama da economia brasileira é desolador. Ali, naquele 21° andar, é onde se reúne, mensalmente, o Comitê de Política Monetária do Banco Central, o popular Copom.
Essa semana foi divulgada a ata da 203ª reunião do magno conclave monetarista, ocorrido dias atrás, quando anunciou-se uma pequena redução da taxa referencial de juros, a Selic, atualmente fixada em 13,75%. A ata do Copom, que agora atende pelo nome oficial de “notas do Copom”, resume o substancial das discussões que levaram os comissários a decidir sobre a taxa Selic.
Os dois primeiros parágrafos resumem o quadro conjuntural percebido pelo Compom. Depois de mais de sete meses de governo Temer-Meirelles, com uma política de super austeridade fiscal, o resultado, segundo o Compom, é o que se segue. Vamos abrir aspas.
“O conjunto dos indicadores divulgados desde a última reunião do Copom sugere atividade econômica aquém do esperado no curto prazo. Houve reduções nas projeções para o PIB em 2016 e 2017 e interrupção no processo de recuperação dos componentes de expectativas de índices de confiança. Após ter interrompido uma longa sequência de quedas no segundo trimestre, a medida de investimento nas contas nacionais voltou a recuar no terceiro trimestre”.
Ou seja, o Compom admite que a situação da economia brasileira piorou. Agrava-se o quadro recessivo. Uma das causas eficientes desta piora, talvez a fundamental, é a dramática redução da oferta de bens e serviços. Em suma, a recessão propriamente dita. A oferta caiu porque a demanda encolheu. A demanda encolheu porque a retração de oferta implica elevação de preço. É um ciclo vicioso. Ninguem compra porque não há o que comprar. Não há o que vender porque ninguém compra.
Em bom e escoreito economês, diz o Copom que “a economia segue operando com alto nível de ociosidade dos fatores de produção, refletido nos baixos índices de utilização da capacidade da indústria e, principalmente, na taxa de desemprego. Após os recuos dos indicadores de atividade econômica relativos a agosto, a ausência de uma reversão nos meses seguintes torna menos provável o cenário em que esses movimentos refletiriam oscilações naturais da atividade econômica em torno de momentos de estabilização. Aumenta, portanto, a probabilidade de que a retomada da atividade econômica seja mais demorada e gradual que a antecipada previamente”.
Trocando em miúdos, dias piores virão. Os cenários otimistas desenhados em reuniões anteriores do colendo sodalício monetário já não vigoram. A ficha do Compom caiu.
Incertezas à frente
No âmbito externo, o cenário apresenta-se especialmente incerto, diz o Compom. O aumento da volatilidade dos preços de ativos indica o possível fim do interregno benigno para economias emergentes. Há elevada probabilidade de retomada do processo de normalização das condições monetárias nos EUA no curto prazo, bem como incertezas quanto ao rumo de sua política econômica.
Ou seja, os tempos das vacas gordas para os países em desenvolvimento, e o Brasil é um deles, estão encerrados. A política de juros quase nulos das autoridades americanas poderá ser revista por Trump, não se sabe ao certo. Se o FED aumentar os juros, o capital vadio vai correr lá para os EUA. O cenário externo é absolutamente incerto para o Compom. Daí a recomendação de seus membros no sentido de acompanhar os acontecimentos com cautela, sem tomar decisões precipitadas. O futuro a Trump pertence.
Mas nem tudo são espinhos. Colhem-se ainda algumas flores. A inflação recente mostrou-se mais favorável que o esperado, em parte em decorrência da reversão da alta de preços dos alimentos, mas também com sinais de desinflação mais difundida. Esses resultados contribuíram para um recuo das expectativas apuradas pela pesquisa Focus para a inflação medida pelo IPCA2 para o ano corrente, que se situam em torno de 6,7%. As expectativas de inflação apuradas pela mesma pesquisa para 2017 recuaram para em torno de 4,9% e as expectativas para 2018 e horizontes mais distantes permanecem em torno de 4,5%.
Apesar da pressão desinflacionária – efeito da retração do consumo causado pela recessão –, o processo inflacionário continua resiliente. Ou seja, a inflação teima em cair. O Copom analisou bem este processo e o explicou. Em resumo, a causa está nas altas já verificadas dos preços administrados ou monitorados.
Supondo que a inflação vai se estabilizar mesmo na taxa projetada pelo Copom, e supondo ainda que outras variáveis se mantenham estáveis – a taxa de câmbio, por exemplo – chegaremos ao fim de 2017 com uma inclinação em torno de 6,6% ao ano, bem acima dos 4,5 fixados pelo Conselho Monetário Nacional como meta. Para a trajetória de preços administrados por contrato e monitorados, que compõem as projeções condicionais para a inflação produzidas pelo Copom, projeta-se variação de 5,5% em 2016, 5,9% em 2017 e 5,3% em 2018.
No frigir dos ovos, porém, ainda que a inflação não caia – o Compom acha que pode até cair –, a estabilização dos preços já é algo muito positivo. Mas o que reforça este processo é a recuperação gradual e mais demorada da economia. Se não houver uma retomada do crescimento, é provável que o processo de desinflação, na margem, acelere o seu ritmo.
Para o Copom, os passos no processo de aprovação das reformas fiscais têm sido positivos até o momento, o que pode sinalizar maior celeridade e probabilidade de aprovação de outras medidas já anunciadas. Mas o processo é longo e envolve incertezas. A redução da incerteza potencializaria, segundo o comitê, os efeitos da política monetária, reduzindo os custos do processo desinflacionário ora em curso.
Mas, aí, entra em cena o nebuloso cenário externo. O possível fim do interregno benigno para economias emergentes pode produzir efeitos que dificultam o processo de desinflação. É possível, especula o Copom, que tais efeitos sejam mitigados por movimentos favoráveis nos preços de commodities, com relevância para os termos de troca do País, o que manteria o caráter estabilizador. No entanto, o fim do interregno benigno pode implicar condições financeiras externas mais apertadas, o que adicionaria um componente desinflacionário. Resumo da ópera: não há, afirma o Compom, relação direta entre o cenário externo e a condução da política monetária.
Mas o que interessa mesmo é o seguinte: os juros vão continuar elevados ou o Copom vai reduzi-los? Membros do Compom ponderam que é razoável esperar uma intensificação do processo de flexibilização monetária caso a atividade econômica não dê sinais mais claros de retomada, posto que nesse caso as projeções de inflação devem se reduzir. Traduzindo em linguagem de gente: Os juros poderão ser reduzidos se a economia continuar piorando, já que, neste caso, as projeções indicam que a inflação vai cair. A condição necessária para o Compom reduz juros é a estabilização ou a queda dos índices inflacionários. Já tivemos, no passado, a perversa combinação de recessão com espiral inflacionária. É rezar para que tal combinação não se repita.
Em todo caso, o melhor, segundo o Copom, é aguardar os acontecimentos até a próxima reunião.
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