Cotidiano

Economia mundial ensaia abandonar “anabolizantes”

Redação

Publicado em 22 de novembro de 2017 às 03:22 | Atualizado há 7 anos

Um mínimo erro de cálculo ou um imprevisto no caminho po­dem custar muito caro. Os maio­res bancos centrais do mundo co­meçaram uma tarefa titânica que se assemelha ao jogo infantil de ir retirando peças de uma torre sem que o edifício inteiro venha abai­xo. A meta no caminho empreen­dido é a normalização das polí­ticas monetárias. Nos próximos anos, o Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) e o Ban­co Central Europeu (BCE) deve­rão reduzir seu balanço patrimo­nial em aproximadamente quatro trilhões de euros (15 trilhões de reais). Essa cifra, que supera o ta­manho da economia alemã, é o que engordaram seus balanços como consequência das medi­das heterodoxas − que são conhe­cidas no jargão econômico como QE (quantitative easing, ou afrou­xamento quantitativo) e consis­tem principalmente na compra de dívida pública e privada − que tiveram de adotar para atenuar os efeitos devastadores da Grande Recessão que começou em 2008.

A melhora das condições eco­nômicas e a necessidade de re­cuperar margem de atuação para quando chegar a próxima crise obriga os bancos centrais a ir fe­chando a torneira da liquidez. En­tretanto, eles sabem que devem fazer isso com cuidado. Retirar de forma abrupta os tubos da respira­ção por aparelhos poderia causar graves efeitos colaterais. “A redu­ção de balanço que precisam levar a cabo para normalizar a situação é monstruosa”, reconhece Ignacio Perea, diretor de investimentos da Tressis. “Tanto Mario Draghi [pre­sidente do BCE] como Janet Yel­len [presidenta do Fed] estão sen­do extremamente cautelosos com as mensagens que dão aos investi­dores, insistindo da previsibilidade e gradualidade de seus movimen­tos. O processo demorará anos, já que ações repentinas poderiam disparar a volatilidade dos mer­cados”, acrescenta Perea.

À espera de ver como termina a segunda parte da operação de resgate, os bancos centrais foram decisivos para sair do buraco ne­gro no qual a crise financeira tinha mergulhado o mundo. “O QE foi a única resposta de política econô­mica e permitiu duas coisas: sal­var situações de liquidez e de con­fiança, e favorecer a recuperação. Tanto nos EUA como na zona do euro, [os bancos centrais] facilita­ram a estabilidade financeira e o equilíbrio do mercado monetá­rio”, destaca Santiago Carbó, cate­drático de Economia do Colégio Universitário de Estudos Finan­ceiros (Cunef), em Madri, e dire­tor de estudos da Fundação das Caixas Econômicas da Espanha (Funcas). “As sucessivas ondas de expansão quantitativa consegui­ram reduzir as taxas de juros e os prêmios de risco em todo o mun­do, baixando portanto os custos de financiamento de Governos, famílias e empresas. Em primei­ra instância, isto permitiu reverter a crise, mas, com o tempo, propi­ciou uma notável recuperação da economia global e dos mercados”, assinala Roberto Scholtes, diretor de estratégia de investimentos do banco UBS na Espanha.

O Fed apertou o botão da liqui­dez muito antes (2008) que o BCE (2015), mas o organismo dirigido por Draghi, depois que obteve a anuência da Alemanha, abraçou o QE com unhas e dentes. Enquan­to no caso do banco central nor­te-americano a relação entre seu balanço e o PIB de sua economia tenha aumentado de 6% para 23% na última década, no BCE ela foi de 16% para mais de 40% atualmen­te. No caminho para a normaliza­ção monetária, os EUA também es­tão na frente, porque se encontram em uma fase mais madura do ciclo.

 

 

 

As sucessivas ondas de expansão quantitativa conseguiram reduzir as taxas de juros e os prêmios de risco em todo o mundo, baixando portanto os custos de financiamento de Governos, famílias e empresas. Em primeira instância, isto permitiu reverter a crise, mas, com o tempo, propiciou uma notável recuperação da economia global e dos mercados”

Roberto Scholtes, diretor de estratégia de investimentos do banco UBS na Espanha

 

 

 

UMA SUBSTITUIÇÃO NO MOMENTO MAIS INADEQUADO

Jerome Powell assumirá o comando do banco central mais importante do mundo, o Federal Reserve, em feve­reiro. Donald Trump propôs seu nome para substituir Janet Yellen e, salvo uma surpresa, o Senado aprovará a nomea­ção. Os especialistas acredi­tam que, com matizes, o Fed manterá uma linha de conti­nuidade com o primeiro ban­queiro de investimento à fren­te da instituição. “Esta eleição representa a continuidade da política monetária atual, des­de que o crescimento da eco­nomia dos EUA se mantenha estável. Esperamos que Powell lidere o processo de redução gradual do balanço do Fed e continue aumentando as ta­xas de juros, embora as pers­pectivas de inflação baixa in­diquem que é provável que a extensão dos aumentos seja limitada”, opina Samy Chaar, economista-chefe do banco Lombard Odier. Por seus an­tecedentes profissionais, Po­well é um homem bem visto por Wall Street. “Ele segue a li­nha de Yellen em aspectos ma­croeconômicos e monetários, mas é visto como alguém mais favorável aos interesses da in­dústria em temas de regulação financeira mais frouxa”, des­taca Philippe Waechter, eco­nomista-chefe da Natixis AM.

Powell faz parte do con­selho do Fed desde maio de 2012, nomeado pelo ex-presi­dente Barack Obama. Michael Gladchun, trader de renda fixa da Loomis Sayles, lem­bra que o presidente nomea­do tem uma formação econô­mica menos acadêmica que Yellen. “Acredito que o banco central sob seu mandato será mais sensível que sua prede­cessora a qualquer dado ruim de inflação”, conclui.

 

]]>

Tags

Leia também

Siga o Diário da Manhã no Google Notícias e fique sempre por dentro

edição
do dia

últimas
notícias