“Invasão tática” é último recurso em sequestros
Diário da Manhã
Publicado em 30 de novembro de 2017 às 01:44 | Atualizado há 7 anosNo último sábado, um assaltante menor de idade e um homem, que conduzia um veículo e estava sendo feito refém, foram mortos pela Polícia Militar em uma abordagem ao veículo. O auxiliar de produção, de 31 anos, Tiago Messias Ribeiro, foi obrigado a dirigir seu próprio carro, um VW Gol, enquanto transportava o adolescente, de 17 anos, em Senador Canedo. O veículo foi interceptado na Avenida Dom Emanuel por homens do Grupo de Patrulhamento Tático (GPT), que efetuaram 19 disparos contra o carro. Diversos tiros atingiram o sequestrador e um deles o peito do auxiliar de produção, que morreu no local.
Em seguida, os agentes retiraram o corpo de Gilmar do veículo e o colocaram no porta-malas de uma viatura da Polícia Militar, enquanto outro oficial do GPT efetuou disparos no para-brisa do carro, de dentro para fora. Imagens de uma câmera da Prefeitura de Senador Canedo e de um posto de combustíveis registraram a ação. Os autores dos 19 disparos foram o sargento Gilmar Alves dos Santos, de 39 anos, e o oficial Paulo Márcio Tavares. O capitão da Polícia Militar Pedro Rodrigues dos Santos Junior encaminhou um pedido de prisão preventiva dos militares envolvidos no caso à Justiça Militar Estadual.
O major da Brigada Militar do Rio Grande do Sul, Francisco Lannes Vieira, de 41 anos, que é especialista em negociação em casos de cárcere privado, explica como funciona o processo. Segundo ele, a negociação em torno de um sequestro tem uma duração média de 24 horas. Do início da ocorrência até 4 horas de cárcere privado, a negociação entra na chamada “fase afetiva”, em que o diálogo tende a ser difícil e o policial deve mais ouvir do que falar. “O sequestrador geralmente não está consciente de tudo o que faz e só quer se livrar da situação. É o momento de saber com quem estamos lidando e pesquisar quais as características do indivíduo e suas intenções”, explica o major Vieira.
Após esse período inicial de reconhecimento do sequestrador, a fase seguinte é chamada de “cognitiva”, na qual o negociador já possui condições de dialogar e propor medidas. Ele deve ouvir as exigências e considerá-las dentro do limite da legalidade. Em um terceiro momento, na “fase caótica”, segundo o major, acontece a pressão por um desfecho, analisando as propostas e exigências. Nesse período, o negociador considera que o sequestrador já passou por um processo de reflexão e está desgastado após várias horas de tensão.
Caso, ainda assim, o processo não tenha encontrado um desfecho, pode ser empregado o armamento com menor potencial de letalidade, como balas de borracha, gás lacrimogêneo e até cães. Essa ação é chamada de “invasão tática” e, em alguns casos, atiradores de elite são acionados. “Pelo alto índice de letalidade, a invasão tática fica em último na fila das ações policiais para esses casos”. Considerando o ocorrido no último sábado em Senador Canedo, a invasão tática foi a primeira opção escolhida pelos policiais que não são negociadores.
Em entrevista ao jornal O Popular, o comandante-geral da Polícia Militar, coronel Divino Alves, desconsiderou que o caso possa representar despreparo da PM em abordagens. “Nós tivemos inúmeras outras atuações da PM que não tivemos situações desastrosas, danosas, com perda de vida. Essas ocorrências nos fazem pensar alguns pontos. Primeiro é deixar evidenciado que o ato é individual, não coletivo, e que nós vamos responsabilizar os policiais pelos seus erros”, afirmou Alves.
Wallacy e Robertinho: casos recentes de excesso
Em setembro deste ano, Wallacy Maciel de Farias, de 24 anos, foi abordado por policiais militares, a cerca de 1 km de sua casa, e alvejado com dois tiros. O jovem morreu no local e, em nota, a PM disse que houve troca de tiros e que os policiais agiram em legítima defesa. Os familiares se mobilizaram, pedindo esclarecimento e justiça sobre o caso. O comandante-geral da Polícia Militar, coronel Divino Alves, confirmou que houve excesso por parte do policial que matou Wallacy, após a divulgação de um vídeo da abordagem.
Já em abril, outro caso de homicídio envolvendo PMs resultou na morte do estudante Roberto Campos da Silva, conhecido como Robertinho, de 16 anos. Na ocasião, três policiais à paisana desligaram o padrão de energia da casa do jovem e, quando ele e seu pai, Roberto Lourenço da Silva, abriram o portão, foram recebidos a tiros pelos PMs.
Segundo os militares envolvidos Paulo Antônio de Souza Junior, Rogério Rangel Araújo Silva e Cláudio Henrique da Silva, eles agiram em legítima defesa após o pai do jovem efetuar um disparo. Após investigação do caso, o Ministério Público de Goiás (MPGO) denunciou os soldados pelos crimes de tentativa de homicídio, homicídio triplamente qualificado, abuso de autoridade e fraude processual. Em agosto, a reconstituição do crime e a coleta dos depoimentos das últimas testemunhas foram realizados. O inquérito ainda não teve conclusão.
]]>