Pesquisa revela questão ambiental preocupante em Aparecida
Diário da Manhã
Publicado em 2 de junho de 2017 às 01:48 | Atualizado há 2 semanasPor longos anos, Aparecida de Goiânia amargou a fama de cidade dormitório. Nas décadas de 1970 e 1980 tornou-se cidade de aventureiros e de quem não fazia questão de morar em Goiânia. Poucos pioneiros da década de 1960 firmaram bandeira na terra e ali, realmente, decidiram permanecer.
O inchaço populacional da Capital, todavia, transbordou gente nas três últimas décadas e a cidade lateral cresceu. Ao mesmo tempo em que desenvolveu um comércio forte e uma vida política agitada, a cidade ainda não estabeleceu uma lógica cultural e uma tradição em proteger seu meio ambiente.
A qualidade ambiental de Aparecida de Goiânia foi investigada pela Universidade Federal de Goiás (UFG) por meio de uma série de estudos do pesquisador Tiago Godoi Ribeiro. Apesar de apresentar pontos positivos para o município, a pesquisa classifica a condição ambiental de Aparecida como ruim – o que preocupa, já que a cidade é uma das mais populosas do Estado.
A dissertação de mestrado apresentada pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia, do Instituto de Estudos Socioambientais da UFG, indica que existe descaso com mananciais do município e que a situação tem se agravado nas últimas décadas em determinados parâmetros ambientais.
Sob o título de “Avaliação da Qualidade Ambiental de Aparecida de Goiânia”, a pesquisa traz uma série de questões, como o planejamento do uso da terra (que tem ignorado questões ambientais), a interferência do homem no meio natural e a ocupação desordenada (que motiva assoreamento das margens de corpos d’água). E o mais grave: o lançamento de efluentes in-natura, além da deposição de resíduos sólidos em áreas inadequadas. Todos estes fatores em conjunto prejudicam a qualidade ambiental e de vida no município.
Em seu estudo, Tiago explica que fez uso de indicadores ambientais e procurou saber se o município aplica alguma espécie de referencial para proteger o meio ambiente. Para o estudo foram analisados diversos mananciais e santuários ecológicos, caso dos parques Riviera, Bonança, Village Garavelo, Colina Azul, Serra da Areia, vegetações remanescentes, etc.
Conforme a pesquisa da UFG, Aparecida de Goiânia sofre, por exemplo, com a má gestão da drenagem urbana. A dissertação de Tiago indica que o descaso afeta de forma direta a “saúde e segurança dos munícipes, mobilidade urbana, saneamento ambiental e aspectos econômicos”.
Os problemas de macrodrenagem no município são oriundos de danificações em pontos de galerias pluviais antigas, que já não conseguem sustentar o volume de água recebido. Nos períodos chuvosos, assim como ocorre em Goiânia, Aparecida se transforma em um risco para os moradores.
Mas nem todos os parâmetros acusam negatividades. Outro tópico levantado dentro do programa de pós-graduação de Geografia levou em conta a taxa de desmatamento em um período de 26 anos. “O índice para esse indicador foi obtido a partir da análise de imagens multiespectrais do tipo Landsat-5, no período de 1985 a 2011”, diz o autor do estudo.
Neste quesito, segundo a pesquisa realizada na UFG, ocorreu nítida melhora. Tiago afirma que a implantação do Plano Diretor com legislação específica para cuidado com áreas de proteção permanente foi decisivo para a melhora durante o período avaliado. “Podemos considerar que a criação de leis mais restritivas aliadas a uma política fiscalizatória influenciou de modo significativo o ganho de vegetação do ano de 1985 para 2011”. A análise da UFG indica que ocorreu um aumento de mais de 100% na vegetação remanescente.
“O indicador procede, já que nos anos 1990, por exemplo, a cidade sequer falava de meio ambiente. Lembro bem que este assunto era coisa de extraterrestre por aqui. O Plano Diretor, aliado de uma gestão mais profissional, melhorou as coisas”, diz o biólogo José Antônio Lima, que atua em uma frente não governamental em defesa dos mananciais da cidade e de Hidrolândia – município vizinho.
Apesar da boa notícia em termos de desmatamento, o estudo da UFG identifica três tipos de processos erosivos na região. Aparecida de Goiânia tem graves problemas de erosões mistas, quando ocorre a interação de ravinas e voçorocas com o solapamento das margens.
No estudo, que começou a ser realizado em 2011, existe um cadastro com 61 processos erosivos no município, caso das proximidades do córrego Santo Antônio e Jardim dos Ipês, por exemplo.
A partir de relatórios dos próprios órgãos de gestão municipal, o pesquisador da UFG analisou e identificou inúmeras irregularidades no despejo de lixo. Conforme a dissertação de Tiago, boa parte dos resíduos de construção civil acabaram utilizados para aterramento de erosões.
Relatório de vistoria da Secretaria Municipal de Meio Ambiente teria apontado “diversas irregularidades quanto a disposição inadequada de resíduos, principalmente em áreas próximas aos córregos Saltador, Almeida, Santo Antônio e Buritizal”.
RESÍDUOS
Para Tiago, os locais possuem grande acúmulo de resíduos e estão desprovidos de vegetação nativa. Há cinco anos, um relatório apontou a existência de 130 locais de descarte irregular de resíduos. “Apenas dois estão devidamente licenciados para descarte dos resíduos sólidos: o Aterro Sanitário Municipal e o Aterro de Resíduos da Construção Civil da Pedreira Isaíra”.
A aplicação do Índice de Qualidade das Águas (IQA) na realidade de Aparecida demonstrou outra boa notícia: o Índice de Qualidade da Água médio para o município é de 57,8, sendo classificado como água de boa qualidade.
Todavia a qualidade não é uniforme: em alguns pontos de amostragem a água foi considerada de péssima qualidade.
Outra análise diz respeito a qualidade dos parques. Uma das críticas do autor do estudo diz respeito a falta de equipamentos urbanos nos parques. Em parte significativa, quando foi realizado o estudo, inexistem infraestruturas nestas ilhas verdes, o que dificulta o acesso e aproveitamento por conta da população.
Apesar das conquistas do município, caso das áreas verdes, no geral, o Índice de Qualidade do Meio Ambiente aponta para um padrão ruim.
“O índice de qualidade ambiental foi definido a partir de uma escala de valores entre 0 e 1, segundo critérios discutidos anteriormente, considerando os aspectos naturais identificados, organizados como indicadores de estado, as pressões dos indicadores, classificados como indicadores de pressão e as ações tomadas, frente as pressões exercidas que foram citadas nesta pesquisa, sendo os indicadores de resposta. A integração destes valores resulta no Índice de Qualidade Ambiental do município de Aparecida de Goiânia”, diz o pesquisador.
A análise leva em conta vários fatores, o que corrobora para acumular uma situação negativa para a cidade – e que deve ser questão fundamental para os gestores daqui para frente. “Considerando que o valor encontrado para o IQMA em Aparecida de Goiânia é de 0,483, temos que a qualidade ambiental no município é ruim”.
A ONG CaminhosWay, que atua em Aparecida, por meio de sua diretoria, informou ao DM que espera dos novos gestores da cidade e iniciativa privada, além da população em geral, uma real preocupação “técnica e científica quanto aos mananciais, já que a cidade é hoje monitorada a todo tempo por pesquisadores”.
Mudança de hábito nas bacias hidrográficas
Outros estudos apontam para a necessidade urgente de mudança de comportamento por parte da população e do poder público em Aparecida de Goiânia. Wesley Belizário, a partir do estudo da qualidade ambiental de nascentes em áreas urbanas, sugere que os mananciais da cidade estão ameaçados. “No caso das bacias hidrográficas em análise no município de Aparecida de Goiânia é preciso uma mudança urgente na forma como a população, o poder público e a iniciativa privada veem a questão dos recursos hídricos e, sobretudo, a importância das nascentes”, conclui.
Em sua pesquisa, Wesley, que é especialista em Gestão e Química do Meio Ambiente e pesquisador do mesmo programa que Tiago Ribeiro, analisou nove nascentes e procurou classificá-las quanto ao padrão de qualidade e enquadrá-las em classes de A a E – níveis ótimos a péssimos, respectivamente.
Conforme o pesquisador, de todas as nascentes pesquisadas, duas delas são de Classe B – ou seja, a qualidade ambiental das nascentes é boa.
Apenas uma nascente pode ser considerada de ótima qualidade (Classe A). Já as restantes “estão com a qualidade ambiental comprometida, sendo duas de Classe C, duas de Classe D e duas de Classe E”.
SAIBA MAIS
Município surgiu de doação para católicos
Aparecida de Goiânia teve origem oficialmente a partir de 11 de maio de 1922. Na época, um grupo de fazendeiros doou quatro alqueires de terra para a Igreja Católica. A partir de uma capela, surgiu o povoado que seria a cidade atual.
Inicialmente, explica Tiago Ribeiro, o povoado estava submetido territorialmente a Pouso Alto (Piracanjuba). Pouco depois, em 1930, tornou-se povoado de Grimpas, cidade que seria batizada modernamente de Hidrolândia.
A região era esquecida das correntes migratórias até que, a partir de 1933, surgiu o movimento para a construção de Goiânia, tendo o município de Campinas como a base mudancista. Daí em diante, o sítio teve grande valorização territorial, tornando-se espaço para reserva de terras que serviriam Goiânia e depois, nas décadas de 1970 e 1980, ofereceria mão de obra, numa clássica relação centro-periferia.
O biólogo José Antônio Lima explica que a partir das três ultimas décadas é que “ser de Aparecida”, de fato, tornou-se um “predicado”, já que antes quem visitava o município pensava apenas em se beneficiar da venda de terras e o mais rápido possível se mudar para Goiânia. “Existe hoje um Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) em evolução e uma população que cresceu economicamente graças, principalmente, ao trabalho que suas gerações familiares executaram em Goiânia e aqui”.
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