Cultura

Quem pulou a janela?

Redação

Publicado em 9 de setembro de 2015 às 20:48 | Atualizado há 5 dias

Por: Walacy Neto

A palavra “cultivar” sempre teve pra mim um significado interessante. Aos poucos, regar certa coisa até que essa vá crescendo, criando vida e cor. Da palavra cultivar advém outra que tenho também um grande apresso: a cultura. Há 14 anos a Fósforo Cultural desenvolve o Festival Vaca Amarela e assim ajuda a cultivar um ramo da música contemporânea. De todas as edições, esta que ocorreu no último fim de semana no Centro Cultural Oscar Niemeyer (CCON) foi a que trouxe mais novidades, ao menos para mim. Bandas que de longe eu percebia e desacreditava se apresentaram nesta edição carregando o público pra um nível de felicidade mais contagiante. O melhor: tanta coisa começou a ser cultivada nesses dias que, como sempre, um único olhar não é suficiente.

Seguindo uma tendência clara das últimas edições, o Vaca Amarela cresceu. Quando se fala em crescimento tem que se ter cuidado, mas neste caso falo da estrutura dos palcos, dos stands que vendiam comidas, camisetas e itens diversos. Além disso, em poucas apresentações houve algum problema técnico, fato que se torna comum em festival com uma quantidade maior de shows. Mas deixando de lado os enfeites, coisa que festival sertanejo leva bastante a sério, o Vaca Amarela fala de música e fala com extrema propriedade. Pautado na diversidade de estilos, em certos momentos era possível traçar uma linha entre as apresentações. Se eu disser que logo após a apresentação de uma banda próxima de Led Zepellin ocorreu um show de funk carioca, boa parte dos leitores não acreditaria. A novidade então está nisso, pois estando lá na hora que tal peripécia se concretizou, afirmo que deu certo e ninguém manifestou um piu de crítica.

Essa diversidade também é uma espécie de cultivo. Goiânia, sendo recente de idade, ainda é carente em relação a outras capitais brasileiras. Fator que não nos coloca nenhum pouco atrás quando se fala da produção musical independente (é daqui as bandas mais válidas do cenário musical dos últimos anos). A variedade de estilos musicais serve, portanto, como uma proposta aos ouvidos daqui. Dar a oportunidade para que músicos daqui e de fora possam divulgar o que fazem de tão variado. Assim, todo mundo acaba saindo dos dias de festival com um pouco mais a se ouvir ou seja, com uma pulguinha atrás da orelha dizendo: tem muito mais por aí.

Shows

O primeiro dia de festival contou com apresentações dos goianos Luziluzia e Carne Doce. Era meio previsível saber que ambas iriam gerar grande discussão nas mídias que tematizam a música. Do Carne Doce sabe-se da tensão das letras que desembocam, como um rio, no sorriso e eletricidade de Salma Jô. Pouco antes, durante uma entrevista para o Diário da Manhã, a vocalista havia comentado que esse show iria precisar de “mais força” devido ao tamanho do palco e certa distância que os eventos grandes imprimem. O Luziluzia se destaca pela liquidez do som. A banda tem entre os integrantes boa parte dos instrumentais do Carne Doce, estes que sempre estão presentes nas melhores criações do Estado. No vocal, Rafa Vaz, do Boogarins, dá o tom da banda. O Luziluzia merece mais ser ouvido do que citado.


Um dos detalhes mais interessantes deste festival foi o tom de homenagem aos nomes que mais fizeram história dentro e fora do Vaca Amarela. Os palcos nomeados de Carlos Brandão e Daniel Belleza já bastavam como reverência a estas figurinhas do rock goiano. Mas o organizador do festival e músico, João Lucas, tinha preparado outro detalhe: um CD onde saúda o agitador cultural, Carlos Brandão. A história que deu neste lançamento, João Canta Brandão, é extensa. O interessante, neste caso, é abrir a internet e pesquisar o título, que por sinal está disponível gratuitamente via internet. Quem fechou a noite no primeiro dia foi o rapper Emicida, uma das apresentações mais esperadas do festival, porém, ao final de tantos dias de Vaca Amarela, não pode ser considerada a mais importante.


Segundo

Entre as novidades, alguns nomes “das antigas” do rock goiano se apresentaram nessa edição do Vaca Amarela. No segundo dia, as bandas Motherfish e Violins, que andavam longe dos palcos, lembraram os tempos de Vaca Amarela no Martim Cererê, principal palco e incubadora de tudo que acontece no rock independente desta capital. Eu mesmo nunca havia visto uma apresentação do Motherfish, por exemplo, mas os olhinhos vidrados do público mais participativo indicava que aquele show era pura nostalgia.

Logo após a apresentação do Motherfish, o público se movimentava debilmente, meio perdidos. No palco ao lado, a atenção do público foi requerida e mesmo aéreos o som das guitarras conseguiu conquistar os olhos de todos. A banda Muddy Brothers foi uma das novidades que mais arrecadou provocações. O trio é do Espirito Santo e as levadas remetem ao Led Zeppelin, mas o chamativo é como a banda consegue preencher totalmente os ouvidos com uma bateria e uma guitarra. Além disso, os vocais de João Lucas merecem algumas horas de audição. Enfim, não bastasse logo em seguida o Projetonave subia ao palco ao lado do rapper Síntese.  A qualidade sonora, tanto do rapper quanto da banda, foi o principal chamariz dessa apresentação. Com letras beirando o religioso, Síntese arrematou boa parte do público, que saiu do Centro Cultural Oscar Niemyer afirmando ter sido o melhor show do festival. Mas ainda faltava o último dia.


Fim

Dentre todas as apresentações do Festival Vaca Amarela deste ano, o penúltimo show foi o mais empolgante. Com a participação, logo na abertura do show, de um dos grandes nomes da cultura goiana, o Zé Capeta, a banda Rollin Chamas veio com tudo e todos. Uma bagunça desorganizada regrada a banho de cerveja, churrasquinho e frango assado. Antes mesmo de entrarem no palco, o público agitava as bandeirinhas com a logo da banda: sou goiano e foda-se. Outro momento nostálgico, sim, nesse dia a banda comemorava dez anos de estrada. Entre pausas e retornos bombásticos o Rollin Chamas é uma das formações com cara e rosto de Goiás.


Em certo momento, haviam três bateristas batucando, dois baixistas fazendo qualquer coisa e várias pessoas cantando as músicas ao lado do vocalista Fal. E tem mais: parece que toda organização do festival, assim como outros que participaram desta edição, aproveitaram a permissividade do show do Rollin Chamas pra fazer ali a festa de despedida da edição deste ano do Vaca Amarela. Nostalgia a parte, o Vaca Amarela aconteceu e agora resta saber o que deve brotar de tudo isso.

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