‘Eufrates’: o novo romance de André de Leones
Redação
Publicado em 17 de agosto de 2018 às 20:52 | Atualizado há 6 anosRevelado pelo Prêmio Sesc de Literatura de 2006, desde então André de Leones construiu uma sólida carreira literária: foram cinco romances e diversas participações em coletâneas. Em ‘Eufrates’, o amadurecimento como escritor é inegável. Um bom texto literário é capaz de revelar e esconder, despertar desejos e reprimir lições, iluminar e ao mesmo tempo dissimular, e é exatamente isso que o olhar arguto do narrador de Eufrates faz, elogia Jacques Fux.
Neste romance com narrativa quase cinematográfica, Leones usa como cenário acontecimentos no eixo Brasil-Israel entre os anos de 1991 e 2013, e passa pelo Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília, Belém, Buenos Aires e Jerusalém. “Quando comecei a esboçar Eufrates, tinha em mente um tipo específico de estruturação com a qual já havia lidado em dois romances anteriores, Como desaparecer completamente eTerra de casas vazias”, explica ele. “Gosto dessas narrativas dispersas, com vários personagens e histórias correndo paralelas.
Jonas e Moshe são os personagens centrais dessa teia narrativa que transita e se multiplica por diferentes tempos e espaços. Ao longo do percurso, relações amorosas começam e se desfazem, afetos se transformam, laços familiares são esmiuçados, o sexo, a morte, tudo desliza e se deixa ver para que o leitor chegue até o mais íntimo de cada um.
Aqui, Leones conta a história de uma amizade construída a partir do encontro de diferenças e situações cotidianas envolvendo pessoas comuns e suas contradições. “As pessoas comuns e a vivência ordinária, por assim dizer, são coisas que me atraem”, confessa o autor. “Eu não saberia dizer de onde vem isso. Talvez porque eu goste de prestar atenção nos outros, nas mínimas coisas que fazem e dizem, nos lugares onde vivem, e por aí afora.”
André de Leones (Goiânia, 1980) é autor de Hoje está um dia morto (Record, 2006), vencedor do Prêmio Sesc de Literatura, e outros cinco romances. Participou de antologias publicadas no Brasil e no exterior, é resenhista do O Estado de São Paulo e já colaborou com O Globo, Bravo! e Jornal do Brasil, entre outros. Vive em São Paulo.
TRECHO
“À noite, em seu quarto de hotel, viu o deserto assim que se deitou na cama e fechou os olhos. O deserto, pensou, eu não sei, mas tenho a impressão de que ele cresce junto com a noite. Poderia muito bem desaparecer ali, cortar todos os laços, adeus, Iara, adeus, Miguel, adeus, Jonas, e viver anônimo naquela cidade à beira do deserto, indo todos os anos ao norte visitar o túmulo da mãe, talvez se casar com a garçonete, um estrangeiro diminuiria seu enfado, ao menos por tempo, não? Não. Provável que não. Também pensou nela antes de dormir. Na pele empoeirada, nos cabelos castanho-claros, quantos anos terá? Dezessete, no máximo. As pernas longas e firmes, como não seriam?, o dia inteiro em pé, caminhando de um lado para o outro, servindo mesas. Pensou nela adentrando o quarto, acendendo a luz do abajur, depois puxando uma cadeira e se sentando. Os cabelos engordurados, a roupa meio suja, a expressão cansada de quem trabalhou o dia todo, mas o sorriso singelo.”
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