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Guerra de narrativas – A crise política e a luta pelo controle do imaginário

Redação

Publicado em 22 de agosto de 2018 às 02:56 | Atualizado há 6 anos

Em Guerra de narrativas – A crise política e a luta pelo controle do ima­ginário, o escritor e jornalista Luciano Trigo fala sobre a disputa sem trégua que tomou conta do Brasil nos últi­mos anos – disputa marcada pela po­litização insana de todos os aspectos da vida cotidiana, que divide a socie­dade entre “nós” e “eles”.

A polarização decorrente da cri­se que resultou no fim do ciclo do PT no poder se acirrou. Longe de ser um embate passageiro, a con­trovérsia em torno da queda de Dil­ma Rousseff foi apenas a face expli­citamente política dessa guerra, que continua em outros fronts. “A esquer­da associada ao PT adotou a estra­tégia de tentar ganhar, na narrativa, a disputa que perdeu no Legislati­vo, no Judiciário e nas ruas”, afirma o autor. “Isso acaba contribuindo, pa­radoxalmente, para o aumento do apelo do populismo de direita, por­que a esquerda fica associada, no imaginário popular, ao combate à operação Lava Jato”.

Essa guerra ainda está em curso, em meio a um clima de histeria cole­tiva que ultrapassa a questão partidá­ria. Às vésperas de uma nova eleição, Luciano Trigo faz, de forma origi­nal e engenhosa, um apelo à razão, com a necessária lembrança ao lei­tor de que a política não é uma dis­puta entre o bem e o mal. Muito me­nos no Brasil.

PERGUNTAS E RESPOSTAS

Por que Guerra de narrativas?

A polarização da sociedade em torno do processo de impeachment de Dilma Rousseff não terminou com a queda da presidente, ao contrário: ela se radicalizou. Derrotado no Legisla­tivo, no Judiciário e nas ruas, o campo lulopetista, ao qual a esquerda teima em se associar, decidiu apostar todas as fichas na reiteração de uma narra­tiva própria dos acontecimentos. Ain­da que seja desmentida diariamente pela realidade, é essa narrativa parti­cular que prevalece entre intelectuais e artistas – e principalmente na uni­versidade. Acontece que esse campo não detém mais o monopólio da fala, e a divisão da sociedade entre “nós” e “eles” passa a se voltar contra ele.

Como isso acontece?

O apoio da maioria da população aos governos do PT não era ideológi­co, era pragmático. Enquanto foi pos­sível combinar as conquistas sociais dos governos Lula, que foram reais, com o crescimento econômico, a base de apoio ao PT foi preservada, tanto entre as massas quanto entre as elites. Fechavam-se os olhos à corrupção sis­têmica, que era percebida como um preço baixo a pagar por esse cenário. Mas quando ficou claro que a econo­mia estava entrando em colapso, essa base se desfez muito rapidamente, porque a continuidade do Governo Dilma já não agradava nem às elites nem aos mais pobres, que voltavam a sofrer com a inflação e o desempre­go. Ao mesmo tempo, com as mani­festações de 2013, uma vasta parcela da população percebeu que as ruas não tinham mais dono, deixando de se sentir constrangida ao silêncio.

Por que esse processo não se re­petiu com o governo Temer, que também sofre denúncias de cor­rupção e bate recordes de impo­pularidade?

É necessária uma combinação muito rara de circunstâncias para que um processo como o que levou à que­da de Dilma se repita, em dois aspec­tos que se complementam. Primeiro, é preciso que efetivamente existam as condições políticas e jurídicas para o impeachment, o que muita gente pa­rece não entender. Condições jurídi­cas existiram na época do Mensalão e em governos anteriores; mas Lula não caiu em 2005 porque não exis­tiam as condições políticas: a econo­mia ia bem, o presidente era popular e contava com uma ampla base de apoio parlamentar. E aí entra o segun­do aspecto: o que cria as condições po­líticas para a queda de um presiden­te é a soma dos comportamentos de diferentes atores sociais: o mercado, a mídia, o Legislativo, o Judiciário e as ruas. Todos confluíram contra Dilma. ContraTemer, apenasumaparcelado Judiciário e parte da mídia – incluin­do, paradoxalmente, a chamada mí­dia golpista – se manifestaram: a base parlamentar de Temer não se desfez; o povo não foi em massa às ruas pedir sua queda; e, mal ou bem, a estabili­dade econômica, depois dos anos de­sastrosos de Dilma, foi recuperada: o País inverteu a rota rumo ao abismo e voltou a crescer, ainda que de forma modesta. Sem povo nas ruas, com es­tabilidade e econômica e com apoio da base parlamentar, nenhum go­verno cai, ainda que existam tecnica­mente motivos para isso.

SOBRE O AUTOR

LucianoTrigo é jornalista eescritor. É autor de ensaios, poesia, ficção e li­vros infantis. Em 2002 foi vencedor do PrêmioJoséLinsdoRegodaAcademia Brasileira de Letras. É pai da Valentina.

 

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