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Nébula: livro-silêncio

Diário da Manhã

Publicado em 20 de junho de 2018 às 00:56 | Atualizado há 2 semanas

O silêncio, por muito tempo, caracterizou o livro. A lei­tura é individual, no canto do quarto ou no ônibus. Essa pos­sível natureza vem da impressão ágil iniciada por Johannes Guten­berg, por volta de 1450, quando inventou a prensa popularizando o papel e a leitura quieta. Antes desse período, a literatura tinha muito mais relação com a oralida­de, por exemplo, os trovadores do período medieval. Recentemente, alguns poetas retomam a poesia falada como mote. Surgiram com isso os slams (batalhas de poesia), videopoemas e outros formatos menos individualizantes. O poe­ta paulista Bobby Baq é um dos inquietos nesse meio criativo. Já foi vencedor do Menor Slam do Mundo, uma edição onde os poe­tas podem apresentar poemas fa­lados de até 30 segundos.

Bobby Baq também é um dos escritores que conseguem transitar entre o silêncio e o som dentro do poema. As provas mais reais desse fato estão contidas no livro Nébula, publicado pela editora Riacho no final de 2016. Memória, fotos apa­gadas em tom sépia, vazio e a ce­gueira ao andar em meio à nebli­na. Nébula é um livro calado, cheio de pontos vazios que apresentam toda incompletude do real. Quem procura um caminho mais direto, aqui estará perdido.

“Um livro que presentifica as au­sências e silêncios do leitor (aberto ou fechado)”. A descrição de Nébu­la já apresenta essa sensação de es­paço vazio, silêncio e falta. Perceber o que preenche cada um desses lo­cais (a nébula, a névoa, a neblina) é também perceber quão grande é o nada que nos circunda.

PROCESSO

Composto por 60 poemas e 60 colagens, o original traz aos olhos personagens fluidos. Cada colagem faz relação, mesmo que sublimi­nar, com o texto que a acompanha. “As colagens servem para dialogar com o texto, mas com um sentido de abrir ele, quase como se fosse uma obra só”, diz o autor.

Os signos – tanto em texto quanto ilustrados – criam e des­troem caminhos, deixando o lei­tor livre para trilhar sua leitura dentro da nebulosa – talvez como um cego tateando os objetos na procura de uma rota. Bobby Baq pensa que as ilustrações e os poe­mas conseguem existir separada­mente, mas são dois objetos artís­ticos que se completam.

O autor conta que durante o processo de criação do livro es­tava imerso na obra do poeta que tem mais apreço: Roberto Juarroz. “É um autor que tam­bém trabalha muito o vazio nas suas obras. Bebi das fontes dele, como o zen-budismo, um pou­co do sufismo”, diz. O sufismo é uma corrente mística e contem­plativa do Islão e o zen-budismo é o método prático de realização da natureza de Buda.

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