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A queda da inflação

Diário da Manhã

Publicado em 28 de janeiro de 2017 às 01:20 | Atualizado há 1 semana

Gregos e troianos comemoram, respectivamente, com maior ou menor entusiasmo, a rápida redução da taxa de inflação acumulada nos últimos 12 meses, medida pelo IPCA, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo do IBGE.

Ela caiu de 10,7%, em dezembro de 2015, para 6,3%, em dezembro de 2016. Como em economia não há almoço grátis, discute-se qual foi o custo do óbvio benefício. Os gregos têm a tendência de minimizá-lo, pois teria sido criado por uma mudança da “expectativa” produzida pelo Banco Central. Os troianos, por sua vez, a atribuem ao “austericídio” da política de Temer.

Há um claro exagero de ambas as partes. Por um lado, é evidente que a firmeza do Banco Central, somada ao reconhecimento da sua autonomia operacional pelo governo, acompanhada do programa de controle das despesas que pouco a pouco foi se tornando crível, exerceu um impacto positivo sobre as expectativas da inflação.

Estudos empíricos mostram ser esse importante fator sobre a sua concretização “ex-post”. Por outro, se tomarmos o período entre agosto e dezembro, verificaremos que o grupo “alimentação e bebidas”, cujo peso no IPCA é de quase 26%, caiu do máximo de 13,9% nos últimos 12 meses, em agosto, para 8,6%, em dezembro.

Grosseiramente, portanto, em torno de metade da queda do IPCA nos últimos cinco meses foi devida ao grupo “alimentação e bebidas”. A safra 2015-2016 foi muito prejudicada pela evolução do El Niño: a produtividade em toneladas por hectare caiu quase 11% em relação à de 2014-2015.

O mais provável é que a “oferta” de alimentos só tenha crescido depois que a safra estava completamente colhida e as incertezas climáticas já conhecidas, o que eliminou, nos agentes, o estímulo para controlar seus estoques. Este é um velho hábito dos especuladores, conhecido por célebres exemplos desde a antiguidade grega e produtor da “fome” ainda no século XVIII.

Aliás, foi uma das justificativas do laissez-faire, laissez-passer. O efeito do clima foi também destruidor da infraestrutura rodoviária, que exigirá maior atenção sobre o investimento necessário para reduzir o efeito no custo do transporte.

A curto prazo, a demanda de alimentos depende, basicamente, do valor real da massa salarial. Se tomarmos a pesquisa contínua de amostra por domicílios centrada em junho e dezembro, podemos estimar que o pessoal ocupado registrou uma queda de 0,65%, mas o salário real (o rendimento habitual do trabalho) cresceu 1,35%, do que resulta que a massa salarial real cresceu muito pouco, em torno de 0,7%.

Não é difícil conciliar esse número com a queda registrada na inflação dos alimentos e, consequentemente, da taxa de inflação medida pelo IPCA. A hipótese da redução da demanda fica mais plausível se uma parte do aumento da massa real de rendimentos tiver sido dirigida para a redução das dívidas, em resposta à altíssima taxa de juro real “ex-ante” estabelecida pela Selic, que cresceu desde o início do governo Temer, e, principalmente, à estabelecida no mercado financeiro livre.

O seu custo talvez não tenha sido menor do que uma queda de 0,4% do PIB e o consequente aumento do déficit primário com o dispêndio de juros e a piora da relação entre a dívida pública e o PIB.

Nas condições objetivas de junho de 2016: déficit primário de 2,5% do PIB e dívida bruta sobre o PIB de 68,6%, não restava ao Banco Central outra alternativa. Se tivesse titubeado e cedido à pressão para começar a redução da taxa de juros, ela não seria crível e, provavelmente, todo o programa de restabelecimento de um relativo equilíbrio fiscal como preparação para a volta ao crescimento fracassaria.

Quando ficar claro que um bom avanço no equilíbrio da Previdência Social está garantido, poderemos avançar mais na queda da taxa de juros real, que será importante fator coadjuvante para a volta mais rápida do equilíbrio fiscal.

A situação é hoje muito melhor. É hora de nos concentrarmos na aprovação de pequenas, mas necessárias, medidas microeconômicas que impactam diretamente o aumento da produtividade do trabalho, que é, por definição, o próprio desenvolvimento econômico. A cooptação do competente economista João Manoel Pinho de Mello para a equipe econômica do governo reforçou essa esperança.

 

(Delfim Netto. Formado pela USP, é professor de Economia, foi ministro e deputado federal)

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