Opinião

A morte de muitos ecos

Diário da Manhã

Publicado em 25 de fevereiro de 2016 às 01:12 | Atualizado há 9 anos

Ao pegar minha esferográfica para compor esta crônica, veio-me a ideia de uma reclamação a Deus. Mas, recuo-me ante aquele princípio: Deus tem razão que a razão humana desconhece. A queixa que teria a fazer seria: por que todos temos que morrer? Em que pese algumas pessoas não morrer dado que ficarão apenas encantadas, como sentenciou João Guimarães Rosa (27.06.1908 – 19.11.1967) que morreu três dias depois de ser imortalizado pelo fardão da Academia Brasileira de Letras (ABL). Segundo dizem ele padecia de tanatofobia. Vejam que ele tinha razão.
Mas, enfim, esta semana fiquei amolado ao saber da morte natural de um grande personagem do mundo contemporâneo da cultura e da filosofia, o escritor italiano Umberto Eco( 05.01.1932 – 19.02.2016). Sem trocadilho, ele não foi um nem pouco mas muito aberto a todos os ramos de conhecimento, de jornalismo, de histórias, de civilizações e do pensamento ocidental. Sua influência, em todos os ramos do conhecimento, já fazia muitos ecos pelo mundo e reverberará para sempre em vastos segmentos de cultura e das ciências.
Há pessoas que dada a maneira de viver e a contribuição que dão à sua comunidade, onde inseridas ou ao mundo, não deveriam morrer nunca. E não precisam ser famosos, midiáticas. Imaginemos por exemplo um líder comunitário, um voluntário que dispõe a ser um agente transformador com as habilidades que ele tem? O quanto de falta ele faz quando morre. Esta pessoa, sim, merece o qualificativo de importante pela importância (não famosa, às vezes) que ela têm às pessoas mais carentes. Algum indivíduo importante pode ter fama, mas nem todo famoso é importante. A imprensa está infestada de famosos sem nenhuma importância. Muitos se preocupam em apenas acumular patrimônios, fortunas ,tesouros; enfim cuidando apenas de seu umbigo.
Há certas pessoas que quando se vão me deixam contrariado. Lembra-me agora uma pessoa que quando faleceu me deixou vários dias constrangido. Falo da médica e voluntária Zilda Arns (25.08.1934- 12.01.2010). Ela faleceu no terremoto do Haiti, foram mais de 300.000 mortos. Essa brasileira, compõe, o panteão daqueles que fazem muita falta quando morrem. São aqueles poucos que deveriam ter imunidade contra a morte em face do quão importantes são para todos que o rodeiam, ou que deles buscam algum amparo e consolo. Zilda Arns foi a fundadora da Pastoral da criança no Brasil.
Mas, enfim, mais um desses se foi. O livro (e filme) mais divulgado e conhecido de Eco é o nome da Rosa escrito em 1985. Sua última obra é número zero, uma espécie de cartilha do mau jornalismo. Recentemente ele deu uma entrevista para a Globo News, onde sem meias palavras fala sobre cultura, jornalismo difamatório, política e até mesmo sobre o fanfarrão e histriônico Silvio Berlusconi, ex premier da Itália.
Nessa matéria(entrevista) ele fala por exemplo sobre como o jornalismo pode ser exercido de forma tendenciosa e ideológica, quando não deveria fazê-lo. Expresso de outra forma: se um jornal não pertence a um partido ou a um grupo político seu papel é o de informar com absoluta isenção sem viés ideológico. O enredo desta obra(número zero) busca cenas da Itália nos anos 1990. Mais precisamente, segundo o próprio autor em 1992, quando o país experimentou um segundo declínio.
Por fim, o notável Umberto Eco pontuou sobre a cultura, os personagens, a influência e informações da tão propalada e massificada internet com suas mídias sociais.
E então nosso polímata e eclético escritor, semiótico e humanista não poupa adjetivos desqualificantes ao mundo dos internautas. Para ele, como subentende das estrelinhas e nas contrações labiofacias, a internet sendo de acesso sem normas e sem regras, permitiu também uma rede de imbecis, quando todos dizem as imbecilidades e asnices que querem. Ou seja o mundo virtual é uma teia de informações que mais deformam do que agregam algum valor de bom e útil a esses desocupados e vagabundos. Todas aquelas abobrinhas, futilidades, e pornocultura que o sujeito diria nos bares e botecos da vida, agora ele diz pelas redes sociais, numa confraria de idiotas e desinformados. Portanto, falou e disse esse luminar e avatar da literatura, cultura e pensamento atual.

(João Joaquim – médico – articulista DM – www.drjoaojoaquim.com [email protected])

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