Opinião

A reforma trabalhista e os discursos arraigados

Júlio Nasser

Publicado em 9 de maio de 2017 às 01:18 | Atualizado há 8 anos

A chamada Reforma Trabalhista (PL nº 6.787/2016 de iniciativa do Governo Federal), cuja aprovação do texto base na Câmara dos Deputados – realizado à toque de caixa pelos parlamentares após aprovação do regime de urgência na quarta-feira passada – tem gerado grandes embates ideológicos e discursos arraigados, evidenciando ainda mais a polarização das forças políticas e sociais em nosso país.
De um lado, o Governo e os simpatizantes da Reforma, dizem que a atual legislação dificulta a geração de empregos, engessa o mercado de trabalho e, desta forma, impede que o país retome o crescimento econômico e o desenvolvimento.
De outro lado, os sindicatos laborais, as centrais sindicais e seus apoiadores criticam o projeto, dizendo que o governo não é legítimo para fazer as reformas e que “de uma forma geral o projeto tem como objetivo anular os direitos conquistados em mais de 70 anos de lutas sindicais e sociais no Brasil” (extraído do site da CUT).
Mas, realmente, o que está por trás destes discursos e até onde as mudanças são benéficas ou prejudiciais aos trabalhadores e empresários brasileiros?
Inicialmente, devemos nos ater a alguns fatos, antes de tecer opiniões.
Fato 1: a legislação trabalhista brasileira possui como base a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), datada de 1943. À época, o Brasil era detentor de uma estatística deplorável: mais de 60% dos brasileiros eram analfabetos. Não havia facilidade no acesso à informação. Para se ter uma dimensão mais precisa, a televisão chegou ao Brasil em 1950, quando Assis Chateaubriand fundou o primeiro canal de televisão no país.
Não há como se negar que o empregado de hoje, regra geral possui um nível de informação e de escolaridade muito maior do que o trabalhador de 1943. O acesso à internet e aos meios de comunicação, assim como a difusão dos sindicatos e escritórios de advocacia trabalhista no país, permite que os empregados facilmente se informem acerca dos seus direitos.
Este fato nos possibilita compreender a hipossuficiência histórica do empregado em relação ao seu empregador, o que hoje não mais se sustenta.
Fato 2: os custos mensuráveis, fixos e variáveis, que um trabalhador registrado traz aos empresários que atuam no Brasil estão entre os maiores do mundo. Já os passivos trabalhistas em potencial – entendidos estes como os direitos que os trabalhadores podem pleitear na Justiça do Trabalho e, eventualmente, ganharem por inobservância técnica da legislação, ou impossibilidade de cumprimento pelo empregador – são imensuráveis. Isso causa uma enorme insegurança jurídica e dificulta a atividade empresarial no país, inibindo inclusive investimentos internacionais.
É certo que nas relações de trabalho o empregador, que sofre os riscos da atividade econômica, possui por este motivo maior poder de mando do que o empregado, vez que este apenas dispõe de sua mão de obra sem maiores riscos e ônus.
O empresário é quem tem a ideia do negócio, investe seu tempo, dinheiro e nome, está sujeito a processos de natureza cível, criminal, ambiental, societária, tributária, trabalhista, entre outras. Ou seja, é ele que está na linha de frente sempre.
Fato 3: a Justiça do Trabalho, criada para atender especificamente as demandas oriundas da relação de trabalho, possui jurisprudência extremamente protetiva ao empregado no sentido de não haver ônus a estes na ocasião de demandas infundadas e/ou improcedentes. Atualmente, basta a assinatura de uma declaração por parte do trabalhador para que este não pague custas processuais, depósitos recursais, eventuais perícias e honorários advocatícios.
Todas essas contas acabam sendo pagas pelo Estado, ou seja, pelo contribuinte (eu e você). Isso estimula o aumento do número de ações trabalhistas e inibe ainda mais a atividade empreendedora nacional.
O novo projeto prevê o pagamento das verbas acima descritas pelo empregado, no caso de demandas infundadas e/ou improcedentes, além de estipular o pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais na Justiça do Trabalho, inibindo este tipo de demanda.
Além disso, o projeto prevê que o advogado do empregado que recorrer à Justiça defina, previamente, exatamente quanto quer receber com a ação trabalhista.
Isto posto, e analisando a atual conjectura econômica, política, social, e tecnológica do país, passamos a tecer maiores comentários a respeito da Reforma Trabalhista.
Ante aos fatos acima exposto, resta nítida a necessidade de modificação da legislação trabalhista brasileira, que não mais se coaduna com o seu tempo.
Um dos pontos centrais e mais discutidos da proposta diz respeito à flexibilização das leis em razão de acordos individuais firmados entre patrão e empregado.
Estes acordos poderão versar sobre temas como divisão das férias em até três períodos (sendo que um deles deve ser de pelo menos 15 dias), banco de horas (compensação de horas extras com folgas ou diminuição na carga diária), jornada de trabalho (que poderá ser de até 12 horas – neste caso com descanso de 36 horas), intervalo intrajornada (que poderá ser de 30 minutos, hipótese em que o empregado deverá sair 30 minutos mais cedo), entre outros.
Não poderão, contudo, os acordos versarem sobre temas como 13º salário e FGTS.
Outra importante medida é a mudança na cobrança da Contribuição Sindical, que hoje tem natureza de imposto é obrigatória e paga no importe de um dia de trabalho ao sindicato da categoria laboral, sendo o empregado filiado ou não ao sindicato.
Isso estimula a criação de “sindicatos fantasmas”, que pouco ou nada faziam pela sua categoria mas eram largamente financiados pela referida contribuição.
De acordo com o novo projeto, apenas os sindicatos que realmente trabalharem em prol de suas categorias é que continuarão em atividade, vez que as contribuições passam a ser facultativas.
O projeto abre, ainda, a possibilidade da “demissão em comum acordo”. Nesse caso, a multa do FGTS paga pelo empregador cai para 20%, e o trabalhador passa a poder sacar 80% do fundo – mas para isso teria que abrir mão do seguro-desemprego (pago pelo contribuinte).
O trabalho à distância (ou home office), que antes não possuía regramento jurídico, passa a ser regulamentado e sujeito a contrato individual. Esta modalidade de trabalho é cada vez mais difundida e tornou-se uma tendência no mundo contemporâneo em virtude dos avanços tecnológicos que permitem sua aplicação.
Assim, tendo em vista os pontos aqui elencados, assim como as demais alterações trazidas pela proposta, nota-se não se tratar de uma mitigação ou usurpação dos direitos laborais, mas sim uma modernização da legislação, possibilitando aos trabalhadores e empresários do Século XXI que determinem como querem reger suas relações de trabalho, dentro dos limites legais, tendo em vista que a antiga hipossuficiência do empregado já não subsiste, conforme exposto acima.
Sei que, com este artigo, decepcionei a visão de vários leitores. Aqueles que me conhecem sabem que sou um aguerrido defensor dos direitos do trabalhador e do cidadão brasileiro, mas tudo precisa ser pesado corretamente, para que não nos tornemos massa de manobra de um lado ou de outro.
Por isso, é preciso analisar os fatos, ler o texto da proposta e racionalizar os discursos para que se chegue às melhores conclusões. Chega de polarização, precisamos de união. Trabalhador e patrão devem andar juntos, visando o crescimento individual, local e nacional.
Não à precarização da mão de obra.
Não à penalização do empresário.
Precisamos de entendimento e união.

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