Opinião

Ainda o Ato Médico

Diário da Manhã

Publicado em 7 de agosto de 2016 às 02:38 | Atualizado há 8 anos

Em respeito a todas as profissões de saúde do país, sinto-me na obrigação de tecer considerações sobre o Projeto de Lei do Senado nº 350, de 2014, de minha autoria, que altera a Lei nº 12842, de 10 de julho de 2013, que dispõe sobre o exercício da Medicina, para modificar as atividades privativas de médico.

A questão da delimitação do campo de atuação profissional do médico provoca debates acalorados desde a apresentação do Projeto de Lei do Ato Médico, no início da década passada. A polêmica matéria, que objetivava suprir um vácuo normativo relativo à regulamentação do exercício da Medicina no Brasil, criou uma cisma em meio aos profissionais de saúde brasileiros, colocando, de um lado, os médicos e, de outro, algumas profissões de saúde que se viram prejudicadas pelas disposições da proposição.

Foi nesse cenário conturbado, de ânimos exaltados, que assumi o desafio de relatar o projeto. Após dezenas de reuniões e audiências públicas com as diversas partes interessadas, mormente os representantes das profissões de saúde regulamentadas, foi possível produzir um texto satisfatório para regular o exercício harmônico das atividades de saúde no País.

A construção do texto normativo foi complexa e somente foi viabilizada pela disposição das partes em abrir mão de suas posições iniciais, a fim de obter um acordo benéfico para todas as profissões e, principalmente, para a sociedade brasileira.

Na oportunidade, o meu Gabinete promoveu um verdadeiro fórum acadêmico, com a participação dos melhores profissionais de cada uma das áreas de saúde, enviados pelos respectivos Conselhos Federais. Cerquei-me, naquela discussão, de todo o assessoramento jurídico, institucional e especializado (de cada uma das profissões), para chegarmos – como chegamos – a um consenso possível.

No entanto, apesar de todo o processo de discussão ter sido acompanhado por representantes do Ministério da Saúde e do Conselho Nacional de Sáude, os vetos apostos à lei aprovada pelo Senado Federal e aprimorada na Câmara dos Deputados desfiguraram o texto normativo ao eliminar alguns dispositivos essenciais à eficácia jurídica da norma. A apreciação desses vetos pelo Congresso Nacional ocorreu de modo atribulado, em meio à análise de inúmeros vetos apostos a outros projetos de lei, de modo que não foi possível debater satisfatoriamente matéria de tamanha complexidade.

Foi nesse contexto que apresentei o Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 350, de 2014, a fim de oferecer às duas Casas do Congresso Nacional, e à sociedade brasileira, a oportunidade de rediscutir o tema de maneira sóbria, garantindo a participação democrática de todos os segmentos interessados.

No entanto, a proposta foi recebida e entendida de maneira equivocada, provocando reações contundentes – e até mesmo agressivas – de diversos grupos, com ampla repercussão nas redes sociais. Resta claro que o propósito que motivou a apresentação do PLS nº 350, de 2014, não foi alcançado. Pelo contrário, após dois anos sem qualquer avanço em sua tramitação, o projeto passou repentinamente a ser o estopim de discussões destemperadas e improfícuas entre categorias profissionais da saúde.

As redes sociais foram usadas para manifestações contra e a favor; o meu gabinete foi demandado de todas as formas; os canais de comunicação da Ouvidoria do Senado foram acionados por representantes de todas as profissões de saúde do país; fui solicitada a dar entrevistas para os órgãos de imprensa.

Diante desse desvirtuamento e afastamento dos reais motivos que me levaram à sua apresentação, e a pedido da classe médica, inclusive, decidi requerer a retirada do PLS nº 350, de 2014, a fim de encerrar o conflito inadvertidamente deflagrado, sem, contudo, furtar-me a rediscutir o tema da regulamentação das profissões de saúde de maneira serena e democrática, sempre que oportuno e necessário.

Em qualquer momento que isso venha a ocorrer, a reabertura do processo de tramitação no Congresso Nacional, comprometo-me com uma discussão aberta à participação de todas as partes interessadas.

Portanto, que os membros de todas as profissões de saúde do país, além de esteticistas, tatuadores, pigmentadores, acupunturistas, estejam tranquilos, porque jamais encaminharei à votação do Congresso qualquer assunto que lhes digam respeito, sem que sejam ouvidos.

 

(Lúcia Vânia, senadora (PSB), ouvidora-geral do Senado e jornalista)

]]>

Tags

Leia também

Siga o Diário da Manhã no Google Notícias e fique sempre por dentro

edição
do dia

últimas
notícias