Cartórios e privilégios
Diário da Manhã
Publicado em 6 de dezembro de 2017 às 22:36 | Atualizado há 7 anosO presidente do Tribunal de Justiça de Goiás, desembargador Gilberto Marques Filho, esteve na Assembléia Legislativa para encaminhar projeto de lei de sua autoria prevendo a criação de cartórios em Goiás. O projeto prevê 86 novas serventias. A idéia não é nova, nem original. Há mais de 30 anos um parlamentar de primeiro mandato apresentou projeto nesse sentido. Caiu na real depois de contactado por cartorários que, antes mesmo de o projeto tramitar, já estavam sendo prejudicados. Segundo disseram, estavam remunerando parlamentares para votarem contra. O projeto não seria aprovado, mas lhes ficaria muito onerosa a não aprovação. O jovem deputado caiu na real e o projeto foi retirado da pauta.
Suprimir direitos de pobres, a exemplo dos que ganham o salário mínimo e até menos (cerca de 70% dos trabalhadores brasileiros), é fácil. O presidente Temer, do baixo de seus três por cento de aprovação, já disse alto e bom som que, já que é assim, aproveitará para fazer o que, a seu ver, é necessário: a reforma da previdência dos pobres. Poderia partir logo para os 100% de rejeição, afinal está faltando pouco, atacando os verdadeiros privilégios. Não é difícil identificá-los. No item previdência e direitos trabalhistas, basta identificar os que fizeram ou fazem lobby contra a própria aposentadoria compulsória aos 70 anos de idade. Agem assim porque não querem abrir mão de vantagens diretas e até indiretas.
Na História brasileira, cartório sempre foi sinônimo de privilégio. Qualquer estagiário que resolver pesquisar descobrirá, pelos sobrenomes dos titulares de cartórios, quem eram os detentores do poder em cada quadra da História. Com ou sem concurso, porque muitos concursos eram fajutos. Agora, não. Os concursos são rigorosos. E muito disputados. A cada cartório, milhares de inscritos. Sabe-se da existência de concurseiros hoje titulares de vários cartórios em unidades diferentes da Federação. Ganham o cartório e o arrendam. E podem assim alternar moradias, segundo o clima, a culinária e outros itens de conforto e bem-estar, em vários lugares do planeta.
Conquistas por mérito são aceitas, até merecem aplausos. Desde que não se choquem com os interesses da sociedade. O poder constituído precisa colocar em primeiro lugar o interesse coletivo. Que tal permitir a abertura de cartórios como são permitidos, por exemplo, ter um hospital ou um posto de combustíveis. Para tudo isso existe exigências. Cada qual que as cumpra e se cuide contra prejuízos.
Se o negócio não der certo, bem, é só fecha-lo.
(Valterli Guedes, jornalista)
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