Festa cultural na loja maçônica: a iniciação
Diário da Manhã
Publicado em 28 de outubro de 2015 às 00:18 | Atualizado há 9 anosEm cerimônia parecida com a que assistimos recentemente na Loja Maçônica Liberdade e União, no dia 7 de fevereiro de 1778, um senhor de 84 anos de idade, de nome François Marie Arouet, conhecido como Voltaire, adentrou o Templo da Loja Maçônica do Grande Oriente da França, “Les Neuf Soeurs – Loja das Nove Irmãs” de Paris, após receber permissão para assim proceder, por parte de um maçom que ele nunca vira antes e que guardava a porta do templo e que lhe ensinou como deveria caminhar pela sua nave; na sua companhia, os dois de braços dados, estava Benjamim Franklin, também maçom e embaixador dos Estados Unidos na França.
Após receber instrução para se postar entre duas colunas, aconteceu algo inusitado dentro do hermetismo do ritual maçônico: Jèróme de Lalande, o venerável mestre que dirigia a cerimônia, desceu as escadarias do altar das dignidades da loja e se dirigiu à porta do templo para receber o ilustre neófito.
Caminharam, os três, sob aplausos de uma multidão de maçons que lotava a loja e festejavam a efeméride. Aquele caminhar, rumo à cerimônia de iniciação, embora compassado pelos passos titubeantes do que estava no meio, segurando nos braços dos dois irmãos, foi uma das mais brilhantes e inesquecíveis da história da maçonaria universal.
Durante a cerimônia, Voltaire usou o avental que pertenceu ao eminente maçom, filósofo e literato francês que havia falecido sete anos antes, Claude Adrien Helvetius, que lhe foi oferecido pela viúva daquele irmão; infelizmente, três meses após aquela cerimônia, Voltaire faleceu; provavelmente não teve a oportunidade de usar o avental que pertenceu ao seu amigo Helvetius em outras ocasiões.
É claro que não estou, nem tentando, fazer um comparativo entre a iniciação do dr. Heitor Rosa em nossos mistérios na Loja Maçônica Liberdade e União e aquela cerimônia, embora fosse tentado a fazê-lo pela representatividade que meu novo irmão da Arte Real representa para a coletividade cultural e científica de Goiás e também, pelo afeto que nos une. Somos irmãos há muitos anos!
Convivo com o irmão Heitor há mais de 50 anos, mantemos um contubérnio quase que diário; começamos nossa vida profissional na mesma época, quando montamos, na década de 1960, uma clínica na Rua 70, no Bairro Popular; depois, nunca mais nos separamos.
Nosso relacionamento se estreitou de maneira extraordinária no ano de 1972 quando fomos, os dois casais (Heitor e Consuelo e Marília e eu) fazer um curso de pós-graduação em Londres por seis meses. Época de grandes dificuldades econômicas, porém, tínhamos um ao outro para apoiamento.
Não vou falar na sua carreira de médico e professor universitário, pois a coletividade, tanto universitária como a dos seus clientes conhecem-no e o admiram sobejamente; não vou falar do marido e do pai de família exemplar, pois são atributos do homem honrado e ele o é.
Gostaria de falar de algumas características da personalidade do Heitor que são pouco conhecidas: Heitor é uma pessoa espirituosa, dotado de invejável facilidade para escrever, além de ser muito culto e poliglota (fala o inglês, francês e o espanhol). É cronista, contista e ensaísta; escreveu cinco livros literários, um deles com tradução para o inglês e o francês. Em 2006 recebeu o Prêmio Eli Brasiliense – da Academia Goiana de Letras. Como pesquisador, foi autor de mais de duas dezenas de capítulos de livros utilizados em vários cursos de Medicina no Brasil versando sobre: encefalopatia hepática, fígado e vias biliares).
Gostaria de falar, também, sobre a sua expertise na música clássica; tive a oportunidade de acompanhá-lo, infelizmente poucas vezes, a concertos, principalmente durante nossa estada na cidade de Londres. Heitor acompanhava a música, dedilhando as notas musicais. Parecia que ele adivinhava ou melhor, sabia as notas, sequencialmente.
Portanto, aqui na nossa Ordem, ele poderá ajudar-nos a manter nossa tradição de “Entidade ligada à cultura”.
Participei da festa da sua Iniciação na Ordem e sou obrigado a dizer que este ato é apenas uma formalidade, pois Heitor Rosa já nasceu maçom (seu pai e seu sogro dignificaram a maçonaria com as suas aderências).
No entanto, apesar de ser aceito como um irmão maçom após esta cerimônia, acho que devo conversar com o irmão Heitor sobre alguns episódios atinentes à nossa Ordem, até porque sei que ele deve estar curioso ao ver tantos símbolos espalhados pela loja.
O conceito fundamental de maçonaria é expresso por meio de símbolos. Toda a sabedoria que acumulamos através dos séculos pode se resumir nos símbolos.
O conceito de moral é simbolizado no nosso livro sagrado (A bíblia para nós ocidentais, alcorão para os orientais ou outro qualquer, dependendo da cultura a que estamos considerando).
O conceito de irmandade que deve comandar nossas ações com outros irmãos da nossa loja e do universo da maçonaria é simbolizado pelo compasso.
Conceito de retidão de caráter é simbolizado pelo esquadro; Livro sagrado, compasso e esquadro são os três maiores símbolos do templo maçônico. Representam a luz que está acima de nós, a luz que está ao nosso redor e a luz que está embrenhada em nosso sentimento.
Estes três símbolos estão conectados com outros símbolos e assim por diante!
Os símbolos sempre representaram a maneira que os homens arranjaram para terem suas próprias visões do mundo e da vida; pensemos no profundo significado da cruz na origem e evolução do cristianismo. É através do símbolo que o homem expressa suas mais abstratas formas de intelecto.
Na maçonaria o símbolo da iniciação segue um ritual e passa ser o elo de ligação da corrente que une todos os irmãos da superfície da terra.
Quando o maçom entra em uma loja maçônica, em qualquer parte do mundo, ele poderá tomar parte nos seus trabalhos; os símbolos lhe permitem falar, independente de contingências históricas ou de idioma, pois é nossa linguagem universal, refletindo sua característica de imutabilidade.
O maçom de hoje é iniciado com o mesmo simbolismo de 250 anos atrás, temos tradição, não somente temos como meta a regeneração do homem, mas, também, procurar entender, pelo estudo, o significado de muitos símbolos que frequentemente vemos nas nossas lojas, como o “compasso” “o esquadro”; “o triângulo” e muitos outros.
Nossa entidade é a maior organização fraternal do mundo, com quase três milhões de membros nos Estados Unidos, mais de 700 mil na Grã-Bretanha e quase dois milhões no resto do mundo.
Nossos princípios e nosso simbolismo são imutáveis no tempo, haja vista o que escreveu William Preston no livro “Masonry” editado em 1801 em Londres, com minha tradução livre: “Para ser admitido na Ordem é condição ‘sine qua non’ que o candidato tenha a firme crença em um Ser Supremo, que denominamos de Grande Arquiteto do Universo; acolhemos em nossos templos homens de todas as religiões e raças e temos, como tema central, o comportamento moral, o auto-aperfeiçoamento constante e a dedicação à caridade.”
Seja bem-vindo à nossa Ordem, irmão Heitor Rosa!
(Hélio Moreira, membro da Academia Goiana de Letras, Academia Goiana de Medicina, Instituto Histórico e Geográfico de Goiás)
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