Indústria: 13 anos de atraso
Diário da Manhã
Publicado em 29 de setembro de 2018 às 03:54 | Atualizado há 6 anosO Brasil é um país extraordinário. Nos seus cinco séculos de existência, já experimentou as mais perversas e mais emocionantes instituições: foi colônia, império, república democrática (três vezes) e ditadura (duas vezes), durante os quais expandiu e assegurou a posse do quinto maior território mundial.
Consolidou uma só língua, integrou lentamente o território e vai, aos trancos e barrancos, metabolizando preconceitos e confirmando a riqueza da miscigenação do ponto de vista estético e da imaginação criadora da sua periferia, como sugeriu o ministro Antonio Dias Toffoli, agora na presidência do Supremo Tribunal Federal.
Positivamente, o Brasil não é um fracasso. Somos 210 milhões de habitantes, com uma renda média de 14,103 dólares (em dólares de paridade de poder de compra de 2011), o que nos coloca como a oitava economia do mundo em termos de PIB, mas a 81ª em termos de PIB per capita. Pois bem, o PIB per capita é apenas o outro nome da produtividade média da população do País, medida em termos físicos dos bens e serviços que produz.
Estamos presos num círculo vicioso: somos pobres porque produzimos pouco e produzimos pouco porque somos pobres. Superamos esse círculo vicioso entre 1939 e os anos 1980 do século passado, quando crescemos mais que o mundo. A partir daí, infelizmente, não conseguimos reengrenar o crescimento. Temos agora uma eleição que talvez possa nos devolver o “espírito do crescimento” que nos abandonou.
O avanço do processo eleitoral oferece surpresas. A carta de Lula ao seu sucessor não honra a sua reconhecida “sabedoria” (que é muito mais poderosa do que qualquer educação formal) e muito menos o seu compromisso democrático confirmado, quando com 82% de aprovação em 2010 resistiu à tentação de aceitar um terceiro mandato, o que jamais aconteceria, nas mesmas circunstâncias, com um intelectual.
A carta propõe ao seu alter ego uma volta ao passado em ambiente social e econômico adverso interna e externamente. Essa sugestão é um típico autoengano. Admiro, desde sempre, a sua aguda inteligência, seu carisma e sua imensa liderança, e tenho Fernando Haddad em alta conta. É um intelectual visionário (provavelmente, seria um bom prefeito de Amsterdã) que administrou São Paulo com cuidado.
Foi, porém, uma das maiores vítimas da tragédia promovida pelo próprio Lula: o governo Dilma Rousseff (2011-2016). Nem Lula nem Haddad têm como fingir que não sabem que se trata do pior quinquênio da história econômica do último século. Um gráfico vale mais do que mil palavras. Proponho ao leitor que veja o triste episódio sob a perspectiva de um importante indicador da higidez da economia: o índice de produção industrial com ajuste sazonal (média 2003 = 100) desde o início do governo Lula, revelado no gráfico abaixo.
As coisas caminharam bem até a grande crise de 2008, da qual saímos rapidamente, mas sem reconhecer que os “bons tempos externos” tinham terminado. A partir daí, exageramos na dose dos Programas de Aceleração do Crescimento nunca concluídos, dos subsídios equivocados, dos abusos do BNDES e acumulamos desequilíbrios que Dilma tentou corrigir em 2011.
Entretanto, quando a economia perdeu o fôlego em 2012 (o crescimento do PIB de 4% em 2011 caiu para 1,9%), dobrou-se a aventura até entrarmos em recessão no começo de 2014 na “reeleição a qualquer custo”. Quando Dilma deixou o governo, a produção industrial tinha sido dizimada e voltou ao nível de 2003. A triste e insuperável verdade é que o PT em seus 13 anos impôs 13 anos de atraso à indústria nacional. Haddad e o PT precisam acertar suas contas com o passado e não prometer uma volta a ele.
(Delfim Netto Formado pela USP, é professor de Economia, foi ministro e deputado federal)
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