Opinião

Jataí, agosto de 1952

Diário da Manhã

Publicado em 14 de abril de 2016 às 02:12 | Atualizado há 9 anos

Agosto, no interior de Goiás, não é benquisto. Aceitam-no porque existe. Adiam-se ou antecipam-se casamentos para dele fugir. Afirma-se que, no seu reinado, cresce número de morte por acidentes de automotores terrestres. Muitos desses desastres são devidos à poeira das estradas. Existe algum trecho de rodovia, em Goiás, asfaltado? O automóvel da frente levanta poeira que o vento leva contra o que vem atrás, obstruindo a visão do condutor deste que entra na faixa esquerda para ultrapassar e vai de encontro a um veículo. Destroços, cadáveres, luto, pranto. Quando não é poeira é “costela de vaca”. E agosto é seco e feio. O verde da esperança se faz cinza da desolação. Nascina véspera de agosto: 31 de julho de 1944, em Jataí.

Há outra indisposição popular com referência a agosto: mês do cachorro doido.  Cadelas entram no cio e com isso assanham os cachorros. Formam-se,então, matilhas que saem às ruas. Vez por outra, ouvem-se latidos e rosnados ouo lamento de dor da mordida. Esse lamento é mais ou menos assim: “Caim, caim, caim”, como a pedir socorro a Caim, o primeiro fratricida da terra.

Jataí é um município geograficamente grande e a cidade deve ter uns 15 mil habitantes, o que a posiciona dentre as mais importantes e populosas de Goiás, que é um grande vazio populacional. Rio Verde e Jataí são as maiores do Sudoeste. Uma se diz maior do que a outra. Goiânia, a sede do governo estadual, tem, por motivo óbvio,a antonomásia de “Capital Caçula”. É pequena, mas sua construção antecipou o amanhã e anda depressa.

Hoje são 26 de agosto de 1952. Dia 12 próximo passado Jataí pranteou a morte do dr. Graham, o missionário estadunidense que ajudara, com sua esposa Ruth, a plantar a “Escola Evangélica”, que começou no centro e agora se levanta no alto da alvissareira urbe de chão vermelho e da abelha que lhe empresta o nome. Foi ele um dos passageiros do avião que caiu nos arredores de Palmeiras de Goiás. Não houve sobreviventes. Dentre as vítimas, Antônio Borges Teixeira, filho do governador Pedro Ludovico e da sua consorte Gercina. O ex-vereador e deputado estadual José Feliciano Ferreira comprara passagem para esse voo, mas na hora de despedir-se da esposa, esta lhe pediu para não ir, ele se negou a atendê-la. Zezé, filho pequeno do casal, em lágrimas implorou:

– Não vai, papai!

– Papai precisa viajar, mas volta logo.

Estava a consolar o garoto quando ouviu o barulho da aeronave, deixando-o. Nas estrelas está escrito que ele será o primeiro presidente da Assembleia Legislativa e o primeiro governador de Goiás nascido em Jataí, depois se elegerá suplente do senador Juscelino e a seguir senador.

 

(Filadelfo Borges de Lima, auditor fiscal estadual aposentado, maçom 33, autor de vários livros, sócio-fundador da “Academia Rio-Verdense de Letras, Artes e Ofícios”. Natural de Jataí, desde 1973 reside em Rio Verde)

]]>

Tags

Leia também

Siga o Diário da Manhã no Google Notícias e fique sempre por dentro

edição
do dia

últimas
notícias