O espaço vazio do Natal
Diário da Manhã
Publicado em 25 de dezembro de 2017 às 22:08 | Atualizado há 7 anosNatal, tempo para os sonhos, para as festividades, para o comércio, para as luzes, para as competições dos ornamentos natalinos inusitados. Mas o que enternece uma noite de natal talvez fique na obscuridade, na singularidade, enfim no anonimato.
Não seriam contraditórios tantos preparativos que se iniciam no final do mês de novembro para a chegada do Menino Jesus? Ou seria apenas um mundo luz, para ser chamado de Natal? Paradoxos que nos convidam, de um lado, a refletir diante da movimentação para adornar as casas, as repartições públicas, o comércio. Do outro lado, a movimentação nos remete às cenas do confronto social – a do consumismo: Tudo é a ocasião. O tempo. Tempo de Natal.
Pela fresta deste canto de magia, posso ver uma luz singela que reflete mais que o sol, brilha mais que as estrelas e sonha mais que uma lágrima: Jesus. Menino franzino que adormece e sonha de ver um mundo de paz, colorido de felicidade, enfeitado de amor. E o Natal permanece silencioso para um pequenino, escondido na singeleza de uma manjedoura, esperando um olhar fraterno, esperando mais uma vela para iluminar um mundo que vive na escuridão do egoísmo, na penumbra do incrédulo, na lama da avareza.
Nesse confronto do ser e do ter, existe um espaço para se enxergar o mundo que não cabe no contexto do consumismo. São os meios de se desejar felicidade ao próximo. Mas como se vive o mundo do contraditório, as pessoas se consomem para encontrarem novas formas de saudar o próximo ou de desejar um feliz natal e um próspero Ano Novo: É o caso das mensagens virtuais que invadem nossa privacidade em performances multicoloridas. Os cartões de fim de ano são outro desafio à criatividade humana, pois todas as suas variações também já foram inventadas, porque as pessoas não se contentam em apenas desejar que o Natal seja feliz e o Ano Novo seja próspero. Assim prosseguem na angustia e na busca da poesia, de pensamentos inspiradores, má literatura e o anseio desesperado do diferente – um cartão em forma de sapato, de dentro do qual sai uma meia: a meia para o Papai Noel encher de presentes e o sapato para entrar no Ano Novo de pé direito, coisas assim.
E o que fica de tantos preparativos para que nada saia do usual, do costume de família? O olhar, que era para ser fraterno ficou perdido dentro do presente que custou uma fortuna. O abraço, que era de muita paz ficou esquecido diante dos afazeres e dos compromissos para honrar a agenda de fim de ano. E mais um Natal se vai… mais um ano se vai… E aqui ficamos na ilusão de que confraternizamos sem o afago do abraço, sem o olhar de ternura.
E assim, o Natal fica na história, fica no comércio, fica num espaço vazio, para lembrarmos apenas do que não fizemos pela falta de tempo e que caberia apenas num sorriso e num abraço.
(Ana Maria Carrijo. Mestre em Literatura; Professora e Chefe de Gabinete da Secretaria Municipal de políticas para as Mulheres)
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