O papel do advogado na distribuição da justiça
Diário da Manhã
Publicado em 15 de setembro de 2018 às 23:04 | Atualizado há 6 anosÉ sabido que na estrutura do Judiciário, são indispensáveis três categorias de operadores do direito: o juiz de direito que representa o Estado, o promotor de justiça que representa a sociedade e o(s) advogado(s) que representa(m) as partes na lide processual. Nas suas respectivas funções, cabe ao Estado-juiz a prestação jurisdicional, ao Ministério Público a defesa da ordem legal e à Advocacia a postulação dos direitos e garantias individuais. Reza a Constituição federal que “o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei” (art. 133, da CF/88 c/c art. 2° e 3° da Lei 8.906/94, do EAOAB).
FUNÇÃO ESSENCIAL À JUSTIÇA
A CF/88 define claramente as funções essenciais à Justiça, no Título IV, Capítulo IV, Seção I: Do Ministério Público (arts. 123-130), Seção II: Da Advocacia Pública (arts. 131-32) e Seção III: Da Advocacia e da Defensoria Pública (arts. 133-135). A jurisdição (função de dizer o direito) compete ao juiz, mas é regida pelo princípio da inércia: o juiz não pode agir por iniciativa própria, senão quando provocado. Por outro lado, a capacidade postulatória é prerrogativa do advogado. Exceção se faz ao advogado quanto à aptidão técnica para postular em juízo, nas causas dos juizados especiais cíveis, nas reclamações trabalhistas intentadas pelo próprio empregado, nas ações penais privadas exclusivas e no habeas corpus. Por sua vez, compete ao Ministério Público a tutela dos direitos coletivos, difusos ou individuais homogêneos de natureza indisponível.
ADVOGADO, JUIZ E PROMOTOR
Em louvável artigo do advogado Joaquim de Campos Martins, sob o – “Sistema jurídico nacional – o advogado, o juiz e o promotor” (Rev.Consulex, ano XV, n°336, 15-1-11, p. 57-59), pondera ele sobre as diferentes funções: “A divisão de tarefas e de funções na máquina judiciária não implica em submissão ou subordinação. Logo, não existe nem deve existir nenhuma hierarquia, tampouco temor reverencial entre advogados, magistrados, promotores, procuradores e defensores públicos, não havendo que se falar em qualquer elo subordinativo entre eles”. Não obstante – observa – reina ainda preconceito funcional em relação aio advogado por parte de alguns magistrados que sofrem de juizite (doença que acomete alguns juízes que se acham super-homens, geralmente tomando decisões arbitrárias que acabam reformadas). Lembre-se do recente caso veiculado na mídia, da juíza de direito que se recusou a ouvir a advogada (detalhe: de cor negra), e ante seu veemente protesto, terminou por mandá-la algemar em plena audiência.
DO MAL DA JUIZITE
Lembrando Piero Calamandrei, o célebre jurista italiano, em seu livro “Eles, os juízes, vistos por um advogado” (tradução brasileira de Eduardo Brandão, São Paulo: Martins Fontes, 1998, p.54), vale ressaltar que “num regime em que, como em nosso país, o advogado se considera investido de uma função pública, advogados e juízes são colocados moralmente, ainda que não materialmente, no mesmo plano. O juiz que falta ao respeito para com o advogado e, também, o advogado que não tem deferência para com o juiz, ignoram que a advocacia e a magistratura obedecem à lei dos vasos comunicantes: não se pode baixar o nível de uma, sem que o nível da outra desça na mesma medida”. Segundo o citado articulista (Consulex, p.59), ocorre que, lamentavelmente, a doença da juizite subsiste também nas formas de promotorite e até mesmo de assessorite, que seria a síndrome do assessor ou diretor que se acha mais importante do que partes e causídicos.
DA LIDE PROCESSUAL
Vale ressaltar que na lide processual, as partes são representadas pelo procurador (advogado) devidamente habilitado, o qual estabelece uma ponte triangular entre autor, juiz e réu, quer nas ações cíveis ou criminais. Eis que no Estado democrático de direito, são fundamentais os princípios do contraditório, da ampla defesa, do juiz natural, da imparcialidade do juiz, da iniciativa das partes e do devido processo legal. (Isso, vale dizer, quando os operadores do direito são também democráticos). Para fins didáticos, este autor resume tais princípios nos seguintes versos lineares de cordel.
Princípio do contraditório e da ampla defesa – Processo é a vida da ação: a própria vida é um processo, que une dois pólos opostos dentro de um mesmo universo: buscando a superação do caminho controverso.
Princípio da reserva legal e do juiz natural – É uma ponte triangular que une autor, juiz e réu: cada um em seu lugar, cada qual em seu papel. Nulla poena sine legge, a lide não segue ao léu.
Princípio da iniciativa das partes e da imparcialidade do juiz – A iniciativa das partes na ponte é fundamental. Ao centro, o juiz é inerte, livre, neutro, imparcial. Quer-se alcançar a justiça como bem de cada qual.
Princípio da legalidade e do devido processo legal – Não mais o favor do Rei. Não mais o Estado total. Agora o poder é a Lei. E o poderoso, afinal? Não está por trás do devido, dito, processo legal?
(Emílio Vieira, professor universitário, advogado e escritor, membro da Academia Goiana de Letras, da União Brasileira de Escritores de Goiás e da Associação Goiana de Imprensa. E-mail: evn_advocacia@hotmail.com)
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