Opinião

O preço a pagar

Diário da Manhã

Publicado em 16 de maio de 2017 às 02:40 | Atualizado há 8 anos

O mais notável guru da administração vista como ciência, o norte-americano Peter Drucker, ensina-nos que a tecnoestrutura (ou estrutura técnica) das empresas tem muito poder.

Possui a tecnoestrutura poder suficiente para impedir ações de governos quando estes direcionam suas decisões para ângulos minúsculos da política, como é o caso do atendimento a questões hoje expostas  pela luz do sol da operação Lava Jato. Refiro-me ao caixa dois e às suas faces hoje visíveis: empreiteiros e suas obras superfaturadas; consultores e seus eternos aditivos contratuais; bancos e seus empréstimos com juros lá nas alturas. Paremos por aí, pois a lista é grande.

Um bom exemplo de estrutura técnica que enfrentou os desmandos da pequena política é o da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig); esta uma empresa que ainda se mantém estatal e fornece ao povo mineiro a melhor qualidade de energia do Brasil. Mas por que a Cemig não foi privatizada? A resposta encontra-se no passado da empresa, nos tempos em que governava a terra do grande Guimarães Rosa o senhor Newton Cardoso.

Nessa época, o governo tentou impor decisões absurdas que, certamente, levariam a empresa à falência, bem como à sua inevitável privatização. A tecnoestrutura, todavia, rebelou-se. Colocaram, todos os superintendentes, chefes de departamentos, de divisão, os cargos à disposição. Esse fato fez o governador recuar. E, se não recuasse, o preço político a pagar seria imenso, pois, sem energia, a população rebelar-se-ia. Essa atitude salvou a Cemig, que, portanto, continuou a ser o que sempre foi: a melhor empresa do setor elétrico brasileiro.

Da Cemig estatal para a Celg privatizada, revela-se uma postura completamente diferente: a tecnoestrutura celgueana, por sua vez, foi totalmente omissa ante as ações nada republicanas impostas pelos governos estaduais à empresa, a partir da década de 1980. São esclarecedoras indagações da seguinte ordem: onde estava a estrutura técnica celgueana quando os empreiteiros impuseram à empresa investimentos superfaturados inerentes aos programas de eletrificação rural e irrigação? E no momento da privatização da Usina Hidroelétrica de Cachoeira Dourada? E no criminoso contrato superfaturado de compra de energia dessa usina? Por que um diretor que chancelou esse maldito contrato se mantém vivo no poder da empresa até hoje? Quem pôs a boca no trombone para denunciar o dinheiro que a empresa pediu em banco a taxas exorbitantes?

A verdade é bem esta: bons salários levaram a uma zona de conforto, desse modo, calando a tecnoestrutura da empresa. Brutais mudanças estão por vir em nome do aumento da produtividade. A primeira delas já chegou com o primeiro Plano de Demissão Voluntária (PDV), que eliminou do seu quadro, em menos de um mês, mais de 650 funcionários. Estamos presenciando novo PDV aberto para todo e qualquer funcionário da empresa.

Pelos meus cálculos, a empresa trabalhará com cerca de 700 funcionários, fato que a levará, em cinco anos, só com a redução de pessoal, a recuperar os mais de dois bilhões e cem milhões de reais que pagou pela Celg. O avanço tecnológico fará o resto na remuneração de investimentos que, diga-se de passagem, não ficarão em Goiás.

O preço da omissão da tecnoestrutura quem pagará, mesmo, são os mais novos, pois não têm idade para se aposentar e, hoje, convivem com o fantasma do desemprego. Também, pagarão um enorme preço as gerações futuras desta terra, que, além de perderem um instrumento de seu desenvolvimento, precisam assumir uma enormidade de dívidas incorporadas pelo Estado para que a empresa se torne atrativa à privatização. Ciente disso, às urnas cidadãos!

 

(Salatiel Soares Correia, engenheiro, bacharel em Administração de Empresas, mestre em Planejamento Energético. É autor, entre outras obras, de A Energia na Região do Agronegócio)

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