Opinião

“O Supremo virou a casa da mãe Joana?”

Diário da Manhã

Publicado em 26 de dezembro de 2017 às 22:26 | Atualizado há 7 anos

Não ima­gi­na­va que ain­da fos­se en­con­trar o Ca­far­naum. De­pois de tan­tos anos sem dar as ca­ras, pen­sei que ele já es­ti­ves­se abai­xo de se­te pal­mos de ter­ra, nal­gum lu­gar des­te pla­ne­ta.

Cla­ro que vo­cê se lem­bra de­le. Pe­lo sim, pe­lo não, na­da me cus­ta re­fres­car a sua me­mó­ria. Ca­far­naum é aque­le que às mar­gens do Rio Ni­lo, de­pois dos ser­mões que pro­fe­riu nas se­te igre­jas do Ori­en­te Mé­dio, foi en­fi­a­do num po­ço de mer­da até o pes­co­ço e de meia em meia ho­ra um su­jei­to ti­po be­du­í­no, de es­pa­da em pu­nho, gri­ta­va: “Abai­xa a ca­be­ça!” e pas­sa­va a lâ­mi­na ren­te ao po­ço obri­gan­do o Ca­far­naum a fi­car to­do en­co­ber­to. Jus­to ele, um fer­vo­ro­so, egres­so dos cur­sos de le­tras apa­ga­das e ci­ên­cias ocul­tas (se­gun­do in­for­ma­ções do pró­prio), li­te­ral­men­te en­fi­a­do na mer­da. De­ve ter de­sa­gra­da­do, pra ca­ram­ba, com as su­as pre­ga­ções na­que­la re­gi­ão on­de não fal­ta ran­cor, um ver­da­dei­ro rei­no de con­cei­tos fun­da­men­ta­lis­tas, in­de­pen­den­te se cris­tão, is­la­mi­ta, ateu ou mui­to an­tes pe­lo con­trá­rio.

Das ou­tras ve­zes que ele me apa­re­ceu foi en­cren­ca das bo­as.

Pois é, e o li­vre-pen­sa­dor (jei­to ele­gan­te de não cha­má-lo de de­vas­so) es­tá de vol­ta.

O Su­pre­mo foi a bo­la da vez do Ca­far­naum. Mas, tam­bém, a Al­ta Cor­te vem fa­zen­do por me­re­cer. Su­as Po­tes­ta­des es­tão exa­ge­ran­do ao ado­ta­rem o prin­cí­pio de que “ga­nha quem gri­tar mais al­to”, com ra­rís­si­mas ex­ce­ções. Fi­ca a dú­vi­da se é mui­ta in­com­pe­tên­cia, vai­da­de ao ex­tre­mo, po­li­ti­za­ção des­ca­ra­da ou sei lá que di­a­bo é.

Na es­fe­ra cri­mi­nal o Su­pre­mo es­tá na con­tra­mão do tex­to que a ele ca­be guar­dar, a Cons­ti­tu­i­ção. Che­ga a se­rem de­pri­men­tes as ses­sões da Cor­te que se igua­lam aos de­ba­tes de câ­ma­ra de ve­re­a­do­res de ro­ça, além do cô­mi­co pren­de e sol­ta, sol­ta e pren­de dos pro­ces­sa­dos de co­la­ri­nho bran­co de fo­ro pri­vi­le­gi­a­do.

O Ca­far­naum me dei­xou, em pe­da­ço de pa­pel de pa­da­ria, um bi­lhe­ti­nho on­de só apa­re­ce a per­gun­ta: “O Su­pre­mo vi­rou a ca­sa da mãe Jo­a­na?”

 

(Iram Sa­rai­va, mi­nis­tro emé­ri­to do Tri­bu­nal de Con­tas da Uni­ão)

 

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