Os sonhos, o íntimo e o tempo
Diário da Manhã
Publicado em 7 de janeiro de 2017 às 01:52 | Atualizado há 8 anosCarlos Drummond de Andrade, num poema, disse bem (como é de seu feito e feitio): “Quem teve a ideia de cortar o tempo em fatias, / a que se deu o nome de ano, / foi um indivíduo genial. / Industrializou a esperança / fazendo-a funcionar no limite da exaustão”. Ora, nós sabemos, o homem primitivo concebeu a ideia do ano por observar as estrelas, o Sol, a Lua – a natureza, posto que tudo isso se transforma a períodos certos.
Dias e noites primeiro; a semana, após, que são as fases da Lua, em quatro etapas, que resultam em meses. A cada três meses, na Zona Temperada (as duas faixas entre os trópicos e os círculos polares) dão-se as estações, que são quatro também, e eis que se fez o ano. Ao homem coube notar, memorizar e deduzir.
Recebemos, qualquer de nós, centenas ou até milhares de mensagens de otimismo pela passagem do Novo Ano. E, de uns tempos para cá, tenho visto críticos precipitados a censurar o que chamam de ignorância – achar que mudando o ano tudo muda. Houve até quem me enviasse uma mensagem dizendo que “se branco nos desse a paz, os médicos não teriam depressão” e outras na linha “se amarelo chamasse fortuna” e “se o verde garantisse a esperança” – em todas as frases, a conclusão pessimista de quem anda de mal com a vida.
Por isso voltei a Drummond, fui reler o famoso poema “Cortar o tempo”. A ninguém dou o direito de invadir-me o íntimo e criticar meus sonhos. Deus permitiu-me a vida e incumbiu-me de defini-la; meus pais cuidaram dos meus primeiros passos, primeiras palavras e despertares – e eu fiz do caminhar o meio para a escolha do destino; das palavras, a ferramenta para conviver; e, da capacidade de observar e acordar, fiz meu modo de criação. De tudo isso fiz meus sonhos, e de minhas ações fiz as conquistas.
Usarei branco, amarelo, verde, vermelho ou azul, ou sejam lá quais tons se me tocarem para vestir-me de feliz. Eu não ensaiei a felicidade, não a escrevi, não acreditei que todos os momentos seriam felizes, não. Aprendi que um momento se torna feliz quando paro e o observo, avalio e agradeço ao Criador por permitir-me vivê-lo, experimentá-lo e aprender com ele.
Os sonhos, pois, muitas vezes são exclusivos, dizem respeito à nossa satisfação pessoal e íntima. E também muitas vezes os sonhos são sociais – do casal, da família, do círculo próximo e mesmo da sociedade a que nos integramos. E o tempo, este tempo natalino que se une ao de trocar o ano, é tempo histórico. Sempre nos referimos a algo do nosso passado, que igualmente se confunde com o passado coletivo, ou seja, a História. E há sempre a atenção para como tempo geográfico, o tempo-clima, o que nos sugere a praia ou o edredom, a roupa leve ou os casacos de lã. No nosso caso, neste paralelo 17ºS, só cuidamos se teremos céu límpido ou chuva. Vestimo-nos de quaisquer cores e calçamo-nos com conforto porque queremos festejar e dançar, queremos esticar a noite última do ano e a primeira madrugada com intensidade para, ao fim, “pegar o Sol com a mão” e fortalecer os sonhos, renovando energias.
Com esperança, fé e alegria. Com companheirismo, solidariedade e caridade. Com muitos abraços, muitos olhares de boa luz e beijos de amor.
E termino com os votos do poeta de Itabira:
“Para você, / Desejo todas as cores desta vida. / Todas as alegrias que puder sorrir. / Todas as músicas que puder emocionar. / Para você neste novo ano, / Desejo que os amigos sejam mais cúmplices, / Que sua família esteja mais unida, / Que sua vida seja mais bem vivida” (do poema citado).
Feliz 2017!
(Luiz de Aquino é jornalista e escritor, membro da Academia Goiana de Letras)
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