Opinião

Perdoa-nos, Ana!

Diário da Manhã

Publicado em 24 de fevereiro de 2017 às 02:06 | Atualizado há 8 anos

Era para ter sido feliz o dia do seu aniversário de sete anos. Sua ida até a casa da vizinha foi interrompida pela barbárie. Você não voltou para a sua casa.

Foram-se os sonhos de menina e as expectativas de um futuro abençoado e promissor. O criminoso não agiu com covardia apenas com você, mas atingiu também, mesmo que de raspão, o coração do povo goiano, que sente-se ameaçado a todo tempo.

Perdoa a gente, Ana Clara. Estamos cercados de gente maldosa. Imprevistos acontecem, mas nada justificaria a barbaridade que aconteceu com você. Seu fim trágico assemelha-se aos de tantas outras crianças, ávidas por viver, carregadas de sonhos, mas que sofreram caladas, sem dar pistas de onde estavam. Poderíamos ser cúmplices e esconder de você casos de crianças que partiram de nós da forma que você se foi. Sentimos remorso e muita dor na alma.

Foram cinco dias de angustia e dor na sua antiga casa no Residencial Antônio Carlos Pires, em Goiânia. Sua família com a ajuda da polícia e da comunidade o procurava desde aquela sexta-feira, dia 17. E ninguém imaginava que o suspeito autor de interromper os seus sonhos fosse seu vizinho.

Não deu tempo de conversar mais vezes com você sobre os dias maus que assola o mundo e alerta-la sobre a violência que assola a vida dos goianos. Não deu tempo. Perdoa-nos. Não conseguimos mostrar para os adultos que as crianças são dádivas de Deus. Não foi sua culpa, nunca será. Confesso que não vou desistir de lutar por mais equidade, amor e respeito para as crianças da nossa época.

Goiânia parou. Foi alarmente. Nem ao menos sua festinha de sete anos com seus amiguinhos e coleguinhas da escola deu para fazer.

Aqui, em Goiânia, muitas crianças vivem nos escombros do medo e da angústia, assoladas por gente cruel. Você é o símbolo da inocência e dignidade sacrificada.

Agora, me diz uma coisa Ana: quero saber se no céu tem brinquedos, chocolate, brinquedos, festa de aniversário, liberdade pelas ruas e gente boa…

Esqueça qualquer atitude deplorável e da dor da indefesa diante das garras desumanas.

Ah! Me diz uma coisa: no céu os anjos cantam? Aqui, em Goiânia, as músicas perderam a melodia na manha de quarta-feira (21) quando descobriram o seu fim trágico. O sol nasceu sem brilho, Deus chorava pela sua indefesa, a ira do povo se acendeu e os pássaros silenciaram.

Você se foi de nós. Como sua família, também nós, entramos em luto. Perdoa-nos pelos fracassos da nossa sociedade que nunca lhe transmitiu segurança. Não foi possível que você crescesse junto da gente.

É. Sabemos que você foi acolhida no colo do Pai. Agora, por favor, peça a Deus que traga a humanidade do céu para terra, que traga o respeito, a consciência, a equidade, a liberdade e o amor. Estamos arrasados, carregados de dor e vazios de paz.

 

(Rafael Freitas, jornalista diplomado)

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