Prefeitura ganha eleição?
Diário da Manhã
Publicado em 15 de setembro de 2018 às 22:50 | Atualizado há 6 anosRezam as cartilhas da política tradicional que o apoio de um número significativo de prefeituras é condição necessária – ainda que não suficiente – para uma campanha de sucesso ao Palácio das Esmeraldas ou ao Senado Federal. A teoria, que beira sempre o abuso de poder político, indica que os Prefeitos alinhados colocariam suas bases políticas – muitas vezes formadas por exércitos de servidores comissionados – a serviço do candidato majoritário, dando capilaridade de palanques e número de cabos eleitorais.
No velho toma-lá-dá-cá da politicagem, candidatos estaduais que recebem este apoio, deveriam, chegando ao poder, dar prioridade aos projetos dos apoiadores, viabilizando suas respectivas reeleições, em um longo ciclo de perpetuação política. O apoio vem com uma ameaça velada, “só se elege quem tem base”, quem tem prefeito. Uma fina linha entre as relações políticas saudáveis e a intermediação para compra de votos, abuso de poder e outros ilícitos eleitorais.
São notícias velhas os casos de mandatários que obrigam ou intimidam comissionados a participar de reuniões políticas dentro e fora do horário de trabalho, sob a ameaça – implícita ou explícita – da perda do cargo.
Mas será que o apoio de uma legião de líderes locais é condição sine qua non para a eleição de um candidato majoritário estadual, ou existiria uma outra forma de fazer política?
A Levels Inteligência – startup de ciência de dados – analisou os microdados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e, pela geolocalização do voto, tentou compreender os potenciais e limites desta variável.
Nota metodológica: Este é um estudo de caso, que não tem a pretensão de aplicação universal das suas conclusões, sendo adequado apenas para aquelas condições no tempo e no espaço.
Por que 2014? Pois aquela eleição reflete embate muito semelhante ao deste ano. Na primeira, Ronaldo Caiado disputava o Senado e Marconi Perillo o governo do estado, sendo o inverso neste ano, mantendo a antinomia entre as forças políticas de cada um. Já em 2014 é possível perceber uma clara divisão dos municípios pró-Caiado e pró-Marconi.
Na disputa pela Câmara Alta, os principais contendores eram Caiado pela oposição Pemedebista, com apoio do DEM e outros cinco partidos, e Vilmar Rocha, pela base governista em um arco de dezesseis partidos. Havia outros quatro candidatos, todos de partidos de esquerda, com destaque para a Petista Marina Sant’anna. Curiosamente, o PT controlava a prefeitura de Goiânia por herança da renúncia de Iris Rezende, candidato ao governo, de modo que apoiava informalmente a coligação do PMDB.
Neste cenário, Ronaldo Caiado contava com apenas 74 prefeitos contra 128 de Vilmar Rocha. Nas cidades em que tinha apoio formal, o Democrata teve uma votação média de 49,8%, contra 45% naquelas em que era oposição. Para Vilmar Rocha, as prefeituras tiveram peso decisivo, 43,5% contra 34,5% nos municípios em que não contava com o mandatário local.
Estas médias, porém, escondem grandes variações. Ronaldo Caiado teve entre 88 e 19% dos votos válidas em cidades sem apoio, assim como foi de 89 a 23% na mesma escala nos municípios que o Prefeito estava ao seu lado. O candidato da base teve sua maior votação em município que enfrentava o prefeito (73%) e a pior (5%) mesmo com apoio da máquina local.
De tantos dados, podemos tirar algumas conclusões. Ter uma rede política de apoio facilita qualquer campanha e um dos símbolos desta rede é o número de prefeitos coligados. Porém, não existe mais a figura do mandatário-coronel que entrega a cidade de porteira fechada a uma candidatura, na média o apoio do chefe local aumenta de 4% a 8% a votação do beneficiário, mas esta não é uma regra estática. Depende de diversos outros valores e, em verdade, pode muitas vezes ter efeito contrário.
O eleitor está cada vez mais independente e criterioso, capaz de distinguir os projetos e capacidades pessoais do candidato independente de pressões locais e mesmo do poder financeiro, situação que tende a se aprofundar com a possibilidade de comunicação cada vez mais direta permitida pelas redes sociais.
(Jelder Lourenço, sociólogo (UnB) e cientista de dados (Universidade John Hopkins); Fabio Monteiro Lima, advogado (UnB) e Leonardo Volpatti, cientista político e advogado (UnB))
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