Quem matou Marielle Franco?
Diário da Manhã
Publicado em 20 de março de 2018 às 22:03 | Atualizado há 7 anosO assassinato da vereadora do PSOL e líder comunitária carioca Marielle Franco e de seu motorista, Anderson Gomes, na noite do último dia 14, veio trazer uma grande comoção nacional, com repercussão no exterior, quando, merecidamente colocaram o Brasil .na incômoda posição de um dos líderes mundiais na violência. Mas, convenhamos, fato virou palco de embates ideológicos. Politizaram sua morte.
Aí vem a pergunta: por que tanta comoção, se mais de 60 mil brasileiros morrem por ano em condições semelhantes, aí incluídos centenas de policiais? Por que só a morte da vereadora teve peso para mobilizar tanta gente em busca de identificar o autor do atentado? Fica-se na dúvida se está se consagrando a hipocrisia ou o desrespeito.
A enorme quantidade de políticos sem compromisso com seus representados, com a sociedade e sobretudo com a segurança, mostra que os partidos e seus agremiados nada fizeram, nada fazem e nada farão pela segurança, cujos reflexos se mostraram nesse brutal assassínio da vereadora e no de tantos outros líderes, sem se falar nos policiais e no anônimo zé-povinho massacrado nas favelas, muitas vezes por quem deveria dar-lhe segurança, colocando-se por vezes no fogo cruzado entre policiais e traficantes..
Até o momento em que escrevo estas linhas, não se tem notícia de quem cometeu o crime, norteando-se a mídia por indícios, mas não é de todo impossível admitir que pode haver o dedo dos líderes das manifestações de protesto contra a intervenção federal na Segurança Pública do Rio de Janeiro.
Por que só foi dada ênfase à morte de Marielle? Existem centenas de mulheres “incríveis e corajosas” que morrem todos os dias no Brasil, em consequência da falta de honestidade, de pulso, de coragem, de energia e de efetividade no combate ao crime, dos que demagogicamente são paparicados pelos mesmos que choram a sua morte com lágrimas de crocodilo em busca de poder.
Abro um parêntese para, quebrando a rigidez da narrativa, explicar a expressão “lágrimas de crocodilo”: enquanto o grande réptil mastiga e devora a vítima, o céu da boca comprime as glândulas lacrimais vertendo lágrimas naturais, mas obviamente não significam que o animal se emocione ou sinta pena da sua presa. Daí vem a expressão, querendo dizer que, embora a pessoa chore, suas lágrimas retratam mera hipocrisia, pois, na verdade, expressa o oposto.
Dada essa pequena explicação de cultura inútil, voltemos ao que interessa.
Não se pode negar um sincero lamento pela morte da vereadora, e de outros brasileiros que se foram nas mesmas condições, mas é de se repudiar, com profundo nojo, a exploração do fato, porquanto tem por finalidade exatamente fazer crer os espertalhões que em nome dos “direitos humanos” desrespeitam a vida e se colocam contrários ao combate, sem tolerância, aos criminosos de todos os tipos, matizes e cor de colarinho que insistem em dominar o Brasil e em continuar a matar, impunemente, outras tantas Marielles! Os direitos humanos no Brasil sintomaticamente só são invocados quando se matam bandidos.
É da praxe humana conferir qualidades a quem morre, seja pela tradição medieval de que o morto voltaria para assombrar seus maledicentes, seja pela hipocrisia do gênero humano, que elogia até seu mais figadal inimigo depois de morto.
Depois não me venham acusar do crime de desrespeito aos mortos pela sinceridade do que falo, mesmo porque se considera desrespeito assacar o que seria calúnia ou injúria aos que já partiram. Falar a verdade não ofende a memória de quem morreu.
Convenientemente, o setor hipócrita da imprensa esconde que a combativa vereadora era uma ultra esquerdista, uma eterna defensora de bandidos e da liberação das drogas, era contra a intervenção federal na segurança do Rio de Janeiro, defendia a doutrinação de esquerda nas universidades e escolas, pregando o ódio em tempo integral e a divisão entre as pessoas (brancos x negros, homens x mulheres, ricos x pobres e assim por diante).
Uma de suas últimas manifestações, em postagem nas redes sociais, acusava a PM de cometer excessos, mas nunca, em momento algum, se incomodou com a ocupação dos morros pelos traficantes, com o absurdo da venda de drogas em mercado aberto nas favelas, jamais se escandalizou com o total domínio dos traficantes, que andavam e andam armados até os dentes com armas de grosso calibre pelas ruas de forma provocativa e petulante, e as pessoas têm de conviver com isso como se fosse algo natural.
A vereadora assassinada jamais se comoveu com a invasão de traficantes aos barracos de moradores pobres favelados, obrigando-os a esconder drogas e armas; quando os expulsavam de suas miseráveis casas de teto de zinco; ou quando esses criminosos castigavam moradores, sob a alegação de que seriam “alcaguetes” ou “X-9” na linguagem da malandragem, raspando as cabeças das mulheres, espancando os homens, queimando-os com cigarros, quando simplesmente não os matavam sem julgamento no chamado micro-ondas (onde a vitima é envolta em pneus, encharcada com gasolina e queimada viva).
Longe de mim referendar a barbárie da morte de Marielle, mas ela só virou santa/heroína/ícone porque morreu, e é até decepcionante ver pessoas que estão usando o lamentável fato apenas para aparecerem.
Que se lamente o assassinato, mas que não se enalteça quem em vida não fez por merecer ser enaltecida. Eu, como sou apenas um jornalista bissexto, não sou político e tampouco sou famoso, não tenho nenhuma obrigação de bancar o hipócrita ou demagogo. Lamento pela morte da vereadora, mas não tanto quanto a de centenas de policiais assassinados pelas mesmas pessoas que a vereadora defendia. Mas, nem por isso eu desejaria a sua morte. Talvez o Comando Vermelho o desejasse.
Corre nas redes sociais que Marielle teria sido eleita pelo Comando Vermelho para que defendesse seus interesses na Câmara Municipal, e que, por estar defendendo a facção criminosa Terceiro Comando da Capital, do Acari, rival daquele Comando, teria sido morta por ordem deste. Mas tudo são apenas conjecturas. Da mesma forma que não desejo a morte de ninguém, quero é que todos vivam – e vivam muito – para ver suas ideias psicóticas de esquerda serem varridas do cenário nacional, onde a mentira e o obscurantismo não mais prosperam; portanto, a tendência é o esquerdismo ser cada vez mais estigmatizado, anulado e ridicularizado, até mesmo pelas camadas mais desinformadas da população.
A desembargadora do TJ-RJ Marília de Castro Neves, em postagem no Facebook dois dias após a morte da vereadora, acusou Marielle Franco de ter pertencido ao Comando Vermelho (CV). Segundo a desembargadora, ela teria sido executada por ter descumprido compromissos com o CV. “Qualquer outra coisa diversa é mimimi da esquerda tentando agregar valor a um cadáver tão comum quanto qualquer outro”. Depois da repercussão negativa da postagem, Marilia fechou o conteúdo do seu perfil, mas não a tempo de sua manifestação ser copiada. Afirmara, ainda, a desembargadora que o comportamento dela, ditado por seu engajamento político, foi determinante para a morte.
E conclui: “há uma tentativa da esquerda de agregar valor a um cadáver tão comum quanto qualquer outro”. E concluiu sua fala: “A questão é que a tal Marielle não era apenas uma lutadora, ela estava engajada com bandidos! Foi eleita pelo Comando Vermelho e descumpriu compromissos assumidos com seus apoiadores. Ela, mais do que qualquer outra pessoa longe da favela sabe como são cobradas as dívidas pelos grupos entre os quais ela transacionava (…)”. O PSOL vai entrar com uma representação oficial no CNJ e com uma ação criminal por calúnia e difamação contra a desembargadora (como se trata de ação essencialmente privada, tenho dúvidas da legitimidade do partido para intentá-la). E o bate-boca na imprensa e nas redes sociais sobre a morte da vereadora fica entre “Não tenho por que lamentar a morte de quem defendia bandido” versus “Marielle morreu porque era negra, mulher e contra a intervenção militar no Rio”.
O interessante é que, fazendo uma pesquisa por minha conta, concluí que o espírito que se agasalha à margem esquerda do pensamento de Marielle não a autorizava a dizer-se representante dos favelados, dos excluídos. Ela jamais representou os favelados, que eram usados por ela como massa de manobra.
Um mapeamento sobre os votos que Marielle obteve em 2016 revela que ela não foi eleita pelas favelas. Cerca de 20 mil votos, quase metade dos 46 mil votos que a elegeram saíram dos bairros nobres da Zona Sul carioca e da Barra da Tijuca, Zona Oeste. Enquanto na Rocinha ela teve apenas 22 votos, no Leblon foram 1.027. Marielle obteve mais 1.900 votos em Laranjeiras e outros 2.742 votos em Copacabana. Na também famosa Cidade de Deus, foram apenas 89 votos. Já na Freguesia, área de classe média alta de Jacarepaguá, foi sufragada por de 707 eleitores. Na Grande Tijuca, seu desempenho nas urnas rendeu-lhe 6.500 votos. No Complexo da Maré, suposta base eleitoral da vereadora, foram apenas 50 votos. Se incluirmos Ramos e Bonsucesso, esse número sobe para 2.196 votos – resultado distante do obtido entre o eleitorado de maior poder aquisitivo.
Assim, Marielle não representava favelados coisíssima nenhuma, pois, se muito, recebeu menos de dez por cento dos 46 mil votos que a sufragaram nas urnas.
Temer, que decretou uma conveniente e eleitoreira intervenção federal na segurança do Rio, apressou-se em mandar para acompanhar “in loco” as investigações do assassinato a alta cúpula da Segurança, da Defesa e da Justiça, coisa que jamais acontecera em episódios tão ou mais grave, o que demonstra que, mesmo morta e enterrada, a vereadora mostrou sua capacidade de mobilização: nenhum veículo de imprensa do mundo inteiro deixou de noticiar o fato, como se Marielle tivesse sido a única vítima da cotidiana violência no Brasil, como se somente violência contra negras e faveladas fosse pré-requisito para ganhar manchetes. Nem históricas chacinas ocuparam tanto espaço na imprensa.
Voltando a Marielle, suas últimas manifestações defendiam os moradores da comunidade do Acari, cuja facção criminosa, Terceiro Comando da Capital, é tradicionalmente inimiga do Comando Vermelho. As palavras da desembargadora Marília de Castro Neves começam a fazer sentido.
Que a morte de Marielle foi encomendada, não há dúvida. Resta saber por quem.
(Liberato Póvoa, desembargador aposentado do TJ-TO, membro-fundador da Academia Tocantinense de Letras e da Academia Dianopolina de Letras, membro da Associação Goiana de Imprensa – AGI e da Associação Brasileira de Advogados Criminalistas – Abracrim, escritor, jurista, historiador e advogado – liberatopo[email protected])
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