Raquel Teixeira
Diário da Manhã
Publicado em 5 de setembro de 2018 às 22:48 | Atualizado há 6 anosTempo de colher mandato eletivo na urna é também de balanço e reflexão. O que tivemos na cultura em Goiás na última gestão pública estadual? Fui de acordo com a extinção da Secretaria da Cultura por Marconi Perillo, reduzindo para apenas 10 as secretarias de seu governo. Aliás, diga-se, com Marconi, mesmo se aparentemente indo para baixo, a cultura sempre sobe.
O mote daquele momento era ser o primeiro governo estadual a enquadrar a crise anunciada nacionalmente para ser o primeiro a dela sair. Deu certo. Na ocasião, fomos chamados tratar o assunto com o então governador em exercício José Eliton. Foi quando este, espirituosamente, nos atualizou a expressão “vamos colocar a carroça para andar que as abóboras se ajeitam”. Amaury Menezes, o decano das artes, foi outro que nos acompanhou, dizendo que não importa se agência, secretaria, escritório, fundação, enfim, “o governo querendo a cultura funciona”.
Assim foi. Assim viemos. Teria funcionado melhor. O período Raquel Teixeira na cultura não fecha favoravelmente, principalmente quando temos em vista o potencial e o apoio governamental que ele tinha. Qualquer contabilidade mostra que as exceções não salvam o conjunto mantido às duras penas e sem marcas e avanços. Isso certamente se deveu mais ao temperamento da secretária que à vontade do governador que a nomeou.
Para começar, Raquel Teixeira se colocou contra a gestão de equipamentos culturais por OSs, uma ideia acalentada por Marconi. Estavam na linha de sucessão a Vila Cultural Cora Coralina, de que se chegou a publicar um edital mal enjambrado e posteriormente suspenso, e o Centro Cultural Oscar Niemeyer, seguido mais tardiamente pela Orquestra Filarmônica e Quasar Companhia, cujos processos têm sofrido de erros conceituais, administrativos e jurídicos. As que seriam as primeiras, Vila e Oscar Niemeyer, foram intenções logo abandonadas porque a secretária, a despeito da orientação do governador, tinha uma visão contrária à participação de OSs na vida do cidadão, ignorando o seu enorme sucesso em outros estados e mesmo aqui em Goiás, na área da saúde.
Naquele momento inicial, na verdade, Raquel não tinha a exata dimensão do que falava. Prova disso é que dois anos depois ela adotou outra opinião sobre as OSs. Foi quando passou a lutar ferrenhamente pela sua implementação na gestão da educação. Onde também não conseguiu lograr qualquer êxito.
As falhas conceituais, administrativas e jurídicas no processo de contratação das esperadas OSs, infelizmente, não foram o pior. Devemos juntar a elas os editais viciados (Fica, TeN-po, Canto da Primavera, Orquestra Filarmônica) que deram vitória esmagadora a um único grupo que permanece gravitado às suas voltas.
A este respeito, há sérias suspeitas ainda impossíveis de serem comprovadas, simplesmente porque as prestações de contas dos editais já realizados, do Fica, por exemplo, desde 2015, solicitadas pelo Ministério Público e Tribunal de Contas, ainda não foram conferidas, por sumiço de partes dos processos ou mesmo sumiço do todo que os deveriam compor. Simples assim, sumiram.
Tem também o passivo da Lei Goyazes, que veio capengando com crescentes reclamações, limitações, atrasos e falta de diálogo com o Conselho de Cultura. Por que foi tão complicado assim lidar com questões já previstas por lei? E o que dizer do Fundo Cultural, que tem se revelado o principal instrumento da secretaria para acalmar o setor e que é, também, seu principal estopim?
O Fundo Cultural na era da Raquel foi acometido de caduquice. Seu cronograma, que inexplicavelmente segue às soltas sem cumprir as previsões por ele mesmo estabelecidas, não executou inteiramente os anos anteriores (2015 e 2016), faltando repasses de pagamentos a produtores e artistas. E mesmo varado, devendo ainda neste ano corrente cerca de 80% do pagamento previsto no edital de 2017, o Fundo está às voltas com a urgência de ser lançada sua edição deste ano, para não ser jogado na gaveta obscura do orçamento fiscal que vai de um ano a outro e em que tudo pode acontecer – e até não acontecer.
Alguns poderiam dizer que, em tempos de crise, a cultura da Raquel Teixeira teve o mérito de cumprir com a tabela dos eventos do calendário cultural (Fica, Canto da Primavera e TeN-Po), ainda que sem o estabelecimento de um rito que a respeitasse em termos orçamentários e cronológicos. Mas e a prospecção de novas ações e projetos, não faz parte de uma gestão cultural saudável, desejável, eficiente e pela qual se faz merecedora a relevante expressão da cena cultural goiana?
Ora, isso nem passou pela cabeça da secretária com seus tantos afazeres acumulados e sua forma centralizadora de administrar. A exceção teria sido de um projeto de grande valor arquitetônico e no entanto mal calibrado, que nem nome tem e atende pela invocativo de “circuito cultural da Praça Cívica”.
E o que dizer mais? Duas promessas da campanha passada não foram devidamente equacionadas pela secretária do governador que as fez: a construção de 20 centros culturais nas 20 maiores cidades goianas que não tenham equipamentos similares e a indexação percentual do orçamento da cultura ao tesouro estadual, como forma de não mais se depender da rara boa vontade de governantes menos sensíveis a ela.
A personalidade forte e o reconhecido comportamento torrão da Raquel Teixeira, se não fizeram dela a tão esperada super-secretária da Educação, Cultura e Esporte, talvez nos sirvam em outro lugar, vindo-lhe a calhar em novas funções públicas, pois é inegável a sua energia, a correção e o amor social com que ela se dedica ao mundo coletivo.
Oxalá, ela será uma excelente vice-governadora, superando em muito as tradicionais funções do cargo. Se não é realizadora, Raquel é articuladora nata, tem empatia e grande capacidade política.
E já que ela não é de desistir, tem lá na frente uma valorosa missão à espera de gente como ela, que é o cargo de prefeita de Goiânia, para o qual sua crescente visibilidade a encaminharia com grandes chances de vitória. Terá o meu voto. Como também o tem agora, agregada ao voto no melhor candidato que temos ao governo estadual. Da cultura, ficam os rastros rasos e os passos firmes, porém vacilantes.
(Px Silveira Instituto ArteCidadania, presidente)
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