Uma lição de marketing político
Diário da Manhã
Publicado em 30 de agosto de 2018 às 22:09 | Atualizado há 6 anosEsta história, que transcorreu num bairro movimentado de uma cidade grande, tem dois lados, tal como uma moeda que tem cara e coroa.
O lado “cara” da história é uma jovem que é vista todas as tardes andando a cavalo pelas ruas do bairro.
O lado “coroa” é literalmente um coroa: Um senhorzinho, beirando os 70, que também é visto amiúde andando pelas ruas do mesmo bairro, porém a pé.
Vamos à moça.
Aparecer um homem montado em um cavalo já seria novidade na cidade, imagine uma mulher! E não era uma mulher qualquer. Era uma mulher bonita! Isto chamava muito à atenção. Paravam, até, para vê-la passar.
Ouvi um comentário de alguém, ao vê-la surgir, no início de uma rua: “Lá vem a deusa em seu cavalo!” E ela chega rápido, passa, e,com os cabelos esvoaçando ao vento gerado pelo galopar de seu cavalo, já ao longe, lá vai a cavaleira solitária!
Não há ninguém no bairro que, ao menos uma vez, já não a tenha visto por aí andando a cavalo.
Não se sabe seu nome, mas quem a conhece diz ser uma doçura de pessoa.
Com simplicidade e inocência, ela freia o seu cavalo para qualquer um que, pelo caminho, lhe dê com a mão para ela parar, e, educadamente, escuta o que a pessoa tem a lhe dizer ou perguntar.
Quanto ao senhor de 70, trata-se do Seu Sebastião, morador do bairro já há um bom tempo. É aposentado e ganha salário mínimo.
Homem simples, do bem, honesto e gente boa, Seu Sebastião é bem popular ali no pedaço do bairro onde mora, senão vejamos. Quando sentado num banco, na praça, por exemplo, passa uma pessoa: “Oi, Seu Sebastião!” Passa outra: “Bom dia, Seu Sebastião!” E mais outra: “Olá, Seu Sebastião! E assim tantos quantos passarem, enquanto ele ali estiver sentado, certamente, dirão: “Olá, Seu Sebastião!”Já, ele andando pela rua, passa um carro, alguém põe o braço para fora do veículo, acena e grita: “Oi, Seu Sebastião!”Passa outro veículo, a mesma coisa: “Olá, Seu Sebastião!” E um terceiro também. E assim quase todos os veículos que por ele passarem naquela rua naquele momento farão o mesmo. No Supermercado, então, em cada corredor que ele entra para fazer suas compras há sempre alguém que lhe cumprimenta: “Oi, Seu Sebastião!”Até quando ele passa, fazendo sua caminhada diária, por um parquinho público, cheio de crianças brincando, sempre, uma voz esganiçada de alguma criancinha grita lá do meio:” Oi, Seu Sebastião!”
Seu Sebastião tentou, ao longo da vida, com muito trabalho, através do exercício de diversas profissões diferentes, conquistar uma boa situação financeira e ser feliz, porém, não teve sucesso e nem se realizou profissionalmente.
Mas, desta vez, a popularidade toda que ele tinha o fez animar-se com uma ideia, que seria sua última cartada: Se candidatar a vereador. Afinal é um excelente salário! Mas não era só por isso que ele queria ser vereador. Ele tinha também interesse e prazer em cuidar da comunidade. Bem…, assim dizia ele, né?
Porém essa popularidade, como já dito anteriormente, era apenas num cantinho do bairro, podemos dizer assim, onde estava situada a sua residência. Daí a ganhar uma eleição onde se necessitava de mais de quatro mil votos, tem uma grande distância!
Seus parentes, amigos e conhecidos viam que suas chances de ganhar as eleições eram mínimas. Mas, como a vontade ilude (já dizia Machado de Assis), Seu Sebastião alimentava esperanças de, quem sabe, ser eleito. Inscreveu-se, e já começara a propaganda distribuindo “santinhos” pela cidade.
A cavaleira solitária é neta do Seu Sebastião, e o tem na conta da pessoa mais querida de sua vida, pois além dele a ter criado desde a infância, ele é, até hoje, seu amigo, seu companheiro, seu conselheiro, seu confidente, seu anjo da guarda, seu provedor, seu cuidador, seu tudo. “Sem meu avô não sei o que seria de mim!” – vivia dizendo ela.
A linda moça queria muito ajudar o seu querido avô nessa sua empreitada política, mas não sabia como. Para esse tipo de projeto, necessitava-se de dinheiro. De muito dinheiro! Sua família não tinha recursos e ela sequer tinha salário, pois ainda não trabalhava, só estudava (e andava a cavalo). E mesmo que tivesse – é sabido – que não é com o pequeno dinheiro de salário que se consegue ganhar uma eleição!
Ela teve uma ideia, a qual pôs em prática, sem revelar nada ao seu avô: Colocou uma placa na bunda do seu cavalo:
“Vote no meu avô para vereador. Seu nome é Sebastião. Seu número é 5544. Ele é o melhor “vô” do Mundo! Eu o amo! Ele vai ser um bom vereador!”
E por muitos dias, diariamente, até a chegada do pleito, ela circulou pelo bairro com aquela placa no cavalo.
Aquelas palavras tocavam e sensibilizavam positivamente cada pessoa que as lia, mesmo aquelas que nem conheciam Seu Sebastião.
Resultado: O “veínho” ganhou as eleições com uma larga margem de votos sobre o seu principal oponente.
Com sua simplicidade e inocência, sua neta, sem se dar conta, deu uma lição de marketing nos mais experimentados e renomados marqueteiros políticos da cidade.
Seu Sebastião fez um bom trabalho como vereador nos quatro anos de mandato. Descobrira sua profissão, e, apesar da idade, vem galgando posições na carreira política: Já foi prefeito da cidade, deputado estadual e hoje é senador da República.
E pensar que… Tudo começou pela bunda de um cavalo e uma moça bonita montada nele!
Um abraço, e até a próxima história.
(José Maria Moreno, aprendiz de escritor. Email: falecomjosemaria@hotmail.com)
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