Politica

Dilma caiu por falta de autoridade e luta, diz Ciro Gomes

Welliton Carlos da Silva

Publicado em 9 de maio de 2017 às 02:03 | Atualizado há 2 semanas

Ciro Gomes em encontro com a comunidade brasileira em Paris, França. “A Presidenta cometeu um erro político ao nomear Lula para ministro e perdeu completamente a autoridade ao aceitar o veto à nomeação por parte de um ministro do STF”. Durante dois dias o ex-ministro foi questionado por estudantes, professores, artistas e intelectuais brasileiros e franceses, em diversos encontros.

Ciro Gomes aproveitou um dos participantes da mesa de debates no Institut Alter’brasilis, como exemplo, ao dizer que “eu nomeio o Tede Silva como ministro, vem o Supremo e diz que não pode, eu vou lá na Constituição Federal, cito o artigo tal, rubrica tal, e confirmo, sou autoridade máxima do Executivo, tenho minhas prerrogativas. E a portaria é publicada e ele começa a trabalhar. Quem vai impedir? Vão mandar prender o presidente da República? Cria-se uma celeuma e o assunto morre aí.”

Primeiro a denunciar o então vice-presidente como “capitão do golpe”, o ex-ministro tem visto a maioria de suas previsões serem confirmadas pelos fatos, incluindo a queda do ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, que foi denunciado na própria tribuna do parlamento pelo seu irmão, ex-governador Cid Gomes, que depois entregou o cargo de Ministro da Educação por causa do episódio.

 

DM – Um ano depois do início do processo, como avaliar o impeachment?

Ciro Gomes – O ato político mais imbecil que vi em minha carreira de 37 anos foi a tentativa de nomear Lula como ministro. Naquele passo morreu o resto da autoridade que a Presidenta já não tinha. E toda contribuição política que ele poderia dar, podia perfeitamente ser de fora. O que o Lula iria fazer no governo, a não ser dizer ‘Dilma, voce não tem mais autoridade, deixa comigo’. Aquilo foi a gota d’água que entornou o caldo, o pretexto final para o golpe. O que faz o Gilmar Mendes? Deu a liminar, suspendendo a posse do Lula. O que a Dilma faz? Obedece. O Renan Calheiros não podia ter desobedecido ao STF mais recentemente. Mas ela? Chefe do Estado Nacional brasileiro? O protagonismo político do judiciário foi e é indisfarçável. Mas ele se dá no vácuo do colapso da chefia de autoridade do Estado nacional brasileiro. A Constituição prevalece sobre tudo e todos. Contra o ato inconstitucional pode se insurgir qualquer um do povo. A Presidenta do Brasil, em linha com a Constituição Federal em pleno vigor, que afirma explicitamente e de forma não duvidosa que é de sua faculdade a livre nomeação de seus auxiliares ministros, deveria ter recusado o ato. Em linha com dispositivo constitucional explícito, que não admite dúvida, tratando-se de uma pessoa que nem era réu naquela data para ser nomeado. Ela deveria responder assim: com todo respeito, o ato de Vossa Excelência é arbitrário e invade as prerrogativas exclusivas da minha magistratura e a qual eu jurei defender, etc, etc., de maneira que desconsidero sua decisão. Posse do Lula. O que iria acontecer? Um grande escândalo. Iriam dizer que era desobediência, que estava trabalhando às margens da lei… O Gilmar iria representar por desobediência… No Supremo. Iria mesmo? Pois representa. Teriam que abrir um processo. Abre o processo. E a Presidenta poderia abrir uma discussão para o mundo inteiro admirar, denunciando a manobra… Sabe o que acontecia? Nada. Sabe qual seria o próximo escândalo? Nenhum. E sabe qual impeachment teria prosperado a partir daí? Nenhum. Porque autoridade não está escrita em manual. Ou você tem ou não tem. Se eu fosse a Dilma, o pau tinha cantado. Eu disse para ela. Não é por você não, é pela democracia, nós temos que lutar. E quem define a arma da luta é o opositor. Estão dando um golpe no país, na minha geração morreu gente pela volta da democracia. Eu Presidente da República, no primeiro ano do meu mandato, vou ser cassado com Michel Temer na vice e Eduardo Cunha na Câmara? Eu os denunciava, trazia para o cacete. Dilma fraquejou primeiro quando conciliou com Eduardo Cunha ao aceitar a demissão de Cid Gomes no Ministério da Educação.

 

DM – Mas essa não foi a maneira que ela encontrou de resistir, lutar?

Ciro Gomes – Não. Foi a maneira que ela encontrou de “não lutar”. Quando a crise econômica explodiu, ela imaginou que trazendo um quinto escalão do Bradesco para o ministério da economia, ela iria cooptar a plutocracia brasileira… Outro erro.

 

DM – Como foi a experiência de ter atuado na preparação do Plano Real no Governo

Itamar Franco?

Ciro Gomes – Quando fizemos o Plano Real, o PT cometeu o desatino, como antes quando ficou contra a Constituinte, de atacar a medida. Ao ser chamado para ser ministro de Itamar, liguei para Lula e para o Brizola. Eles articulavam a chapa conjunta para serem candidatos, um à presidente e o outro a vice. Eu disse ‘Lula, seu pessoal está te enganando, o que o Mercadante está dizendo é falso, o Plano Real não vai ser como o Plano Cruzado, não é um truque para ganhar a eleição, é uma coisa diferente, vem para ficar. Pede ao Mercadante para dar uma olhada na experiência argentina, chilena, israelita, porque nós estamos imitando e já deu certo, amadureceu. Não entra nesta, apoia, assume, vamos fazer o consenso, é a hora, o Itamar Franco é do nosso lado. E o Lula respondeu vagamente “é companheiro, pois é…” E foi para a eleição com o papo furado de que o “Real” era um truque. Em 1998 é o auge da queda do Lula, FHC consegue se reeleger manipulando tudo para não haver debates pois sabia que somente eu poderia tirar a máscara dele, pois eu havia sido ministro. Eu iria dizer, “está falseando o Real, sentou em cima, desequilíbrios do Real que eram transitórios estão se agudizando… E vem aí uma crise cambial… Ninguém quis ouvir.’Terrorista, invejoso…’ 1999 se arrebentou e o Lula entrou no processo de ascensão ao poder.

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DM – Em um eventual novo governo podem ser revertidas imediatamente mudanças que

estão sendo aprovadas no atual período?

Ciro Gomes – Temos que lutar agora, quando precisamos de um quinto de votos na Câmara Federal para obstruir. Depois vamos precisar de dois terços para reverter. Perdemos na terceirização, mas podemos corrigir, é legislação ordinária, não exige quórum qualificado. Na previdência, não. No futuro precisaremos de três quintos para mudar. Mas estou fazendo tudo que posso para lutar agora. Somente eu estou falando isto. A Marina Silva, por exemplo, cala-se diante de questões mais complexas. A única ideia concreta que eu vi ela defender foi a independência do Banco Central, coisa que nem FHC teve coragem, isto por causa da relação dela com os bancos.

“Privatização à moda FHC? Pegou dinheiro do BNDES e dos fundos de pensão, chamou Daniel Dantas, disse ‘compra a Brasiltelecom’. Ele respondeu, ‘mas eu vou me arriscar em um negócio desses?’ E FHC, ‘você tem um real? Bota um real aqui, e por um acordo de acionistas com o BNDES e fundos de pensão, você vai ter o controle’. Então, o cara compra com um real a Brasiltelecom e a propina correu frouxo, saindo dos fundos de pensão. Quem apresentou o Marcos Valério para o Zé Dirceu foi o Daniel Dantas. O que aconteceu? Trocaram os caras do FHC pelos do PT”. – Ciro Gomes

DM – Qual vai ser o tom da campanha presidencial no próximo ano?

Ciro Gomes –  Ninguém pode arriscar a ser presidente do Brasil sem propor concretudes, sem dar a cara para bater. Porque está lá o exemplo do Lula, da Dilma, do FHC, é o mesmo filme. Antes de ser presidente, Fernando Henrique era o iluminista, o príncipe dos sociólogos, o meu guru. Mas a teoria da dependência já era uma pista da prostração ideológica e da covardia dele, que transformou-se em um traidor. Mas eu o ajudei a ser eleito Presidente da República, fui ministro da Fazenda antes, ajudei a fazer o plano Real. Quem mudou foi ele. Por que ele se desmoralizou completamente e deu passagem ao Lula? Ele se desmitificou, desconsiderou a inteligência popular. ‘Todo mundo está errado, eu sou o caminho a verdade e a vida, só se vai ao pai mor mim’. Vem o Lula e faz a mesma coisa. ‘Deixa que eu chuto’. A Dilma fez a mesma coisa, deixa que eu chuto. Explodiu a crise internacional às vésperas da reeleição, o equilíbrio externo foi falseado, pelo valor da matéria prima. É preciso mostrar a cara, vou forçar Marina e Bolsonaro a se abrirem. E vão me desqualificar, debochar do que eu falo, agora virou deboche o cara saber ler, ter experiência, “o homem de Harvard”, vão dizer que “só ele pensa que é sério”.

 

DM – Como governar com um Congresso dominado por parlamentares corrompidos?

Ciro Gomes – Tem um terço de parlamentares picaretas da pior espécie, que negociam o mandato, tem um terço de honestos e o restante cai para um lado ou outro, dependendo do ambiente político e da condução do maestro que, em nosso sistema, é o presidente da República. Itamar Franco fez a maior mudança econômica no Brasil, enfrentou e venceu a inflação, com esse tipo de Congresso. Mas não transigiu na ética, muito pelo contrário. Ele enfrentou a tropa de choque de ACM, que tentou fazer chantagem, ele demitiu seu mais próximo auxiliar, e terminou o mandato elegendo o sucessor, também com o meu apoio. Mas ninguém imaginaria que FHC seria o traidor que foi.

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DM – Você já tem um projeto de governo?

Ciro Gomes – Em 1980 a China com 900 milhões de habitantes e o Brasil com 170 milhões, cada um representavam um por cento do comércio mundial, nossa economia era mais rica. Hoje eles são 12,5% do comércio mundial. Estamos definitivamente errados. Não estou falando que o modelo chinês tenha que ser replicado, estou falando de paradigma de economia política. Temos um passivo estrangulado no setor privado. 300 maiores empresas de capital aberto no Brasil não fizeram caixa, não é nem lucro, para honrar a dívida vencida no mesmo período. Ou seja, desse mato não sai coelho. No setor público também estrangulado, e em constrangimento, se o orçado para este ano for consumado, vamos investir 1,6% do PIB, união, estados, municípios e estatais juntos. E vamos entregar para bancos e dez mil barões do rentismo, vamos entregar quase 12% do PIB em juros. É por isto que sou satanizado, eu mostro que o rei está nu. Outro fator a considerar é o desequilíbrio das contas externas. Ensinam que o liberalismo é bom, a globalização é o caminho, temos que tirar a mão suja e corrupta do estado do meio, etc. Mas a única coisa realmente globalizada é a informação. Vivemos ciclos de consumismos populistas insustentáveis. Iludem a população e depois deixam a amargura, destroem o estamento político. Temos quer ter consciência que só vai para frente quem tem parcimônia, poupa, investe, produz, trabalha. Somos induzidos a construir nossa felicidade com um padrão de consumo que não é compatível com nossa capacidade de produção, bom bonito e barato, pois a taxa de juros não é globalizada. A América, Japão, Europa trabalham com taxas de juros negativos. Aqui na França se você pega 1000 euros para investir em um negócio, no final do ano está devendo 930, porque o juro é negativo, menor que a inflação. Na Suíça você paga para hospedar dinheiro. O Brasil, no pior momento de depressão da história, está cobrando 11% de juros para uma inflação projetada de 4%. Também estamos perdendo na competitividade tecnológica, que não é global, é uma variável nacional. Cada vez mais leis de propriedade industrial são impostas pelos centros do império global aos países periféricos. O FHC aceitou a imposição dos Clintons, pois estávamos quebrados e precisávamos do FMI. Ele fez passar uma lei de propriedade industrial através da qual o Brasil é obrigado a pagar bilhões de dólares por patentes vencidas. Pagamos onze bilhões de dólares por ano apenas de royalties, preço do nosso atraso tecnológico. Eu não estou fazendo campanha, ainda não tenho um projeto, estou aqui para provocar e ser provocado. Essas são algumas pistas por onde temos que começar um novo caminho.

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DM – Como enfrentar o problema da previdência?

Ciro Gomes – Existe um problema exponencial na previdência. Minha geração tem responsabilidade nisto, pois fomos adiando, fazendo remendo aqui, um puxadinho ali. Mas ainda não tem déficit na previdência. Mentira de todos eles. Apesar de tudo, ainda vamos ter superávit neste ano. Nós políticos mentimos juntos sobre o assunto. Tudo para jogar no poço sem fundo da dívida. A gente somente resolve o problema ao transitar de um modelo para outro. A reforma de agora não mexe com os verdadeiros privilegiados. 1,6% de beneficiados recebem 40%, incluindo políticos com aposentadorias escandalosas. Aos 36 anos de idade, pela minha precocidade, eu teria direito a três pensões, deputado estadual, ex-prefeito e ex-governador. Nunca aceitei receber nenhuma. Acho imoral. Vejam os militares. Sabe quantas pensionistas o governo paga? 580 mil. Magistados e promotores também estão aí. Somente mexe com isto quem topar uma transição. Muito pior fará quem se omitir. Ou apenas estaremos trocando encarregados de roubar os fundos de pensão. E tem mais, eu vou criar um mercado de capitais no Brasil, coisa que não existe.

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DM – Privatizar ou estatatizar?

Ciro Gomes – Privatização à moda FHC? Pegou dinheiro do BNDES e dos fundos de pensão, chamou Daniel Dantas, disse ‘compra a Brasiltelecom’. Ele respondeu, ‘mas eu vou me arriscar em um negócio desses?’ E FHC, ‘você tem um real? Bota um real aqui, e por um acordo de acionistas com o BNDES e fundos de pensão, você vai ter o controle’. Então, o cara compra com um real a Brasiltelecom e a propina correu frouxo, saindo dos fundos de pensão. Quem apresentou o Marcos Valério para o Zé Dirceu foi o Daniel Dantas. O que aconteceu? Trocaram os caras do FHC pelos do PT. E a prática continuou a mesma. Temos outras formas de aumentar recursos para o Estado trabalhar. Sabe quanto é o imposto sobre herança no Ceara? 8%. No Brasil é 4%, na França é 40%. Eu presidente não sei se vai para 20, mas vai. Nós somos o único país da OCDE que não cobra impostos sobre lucros e dividendos, além da Estônia. A gente cobrava e FHC revogou. Eu criei uma alíquota de 35% no imposto de renda para os mais ricos e de 12% para os de menos recursos. FHC revogou no outro dia em que assumiu o Ministério da Fazenda.

 “Aqui na França se você pega 1000 euros para investir em um negócio, no final do ano está devendo 930, porque o juro é negativo, menor que a inflação. Na Suíça você paga para hospedar dinheiro. O Brasil, no pior momento de depressão da história, está cobrando 11% de juros para uma inflação projetada de 4%. Também estamos perdendo na competitividade tecnológica, que não é global, é uma variável nacional” – Ciro Gomes

DM – Como moralizar a vida política brasileira?

Ciro Gomes – Primeiro matando as ilusões. A corrupção é uma inerência, a vida humana é corrupta potencialmente, todos somos frágeis e tentados ao erro. O que minimiza isto são regras e punições, controle social. E isto ainda assim acontecerá. Mas proponho também a morte ao ceticismo. Senão caímos no curto circuito. Nem sempre foi tão grande e nem sempre foi assim. Eu fui ministro do Itamar Franco que entrou pela porta do impeachment e saiu com a audácia histórica de ter rompido o pacto inflacionário que era uma grande negociata de quarenta anos. Ele não confraternizou com bandidos, não se rendeu às chantagens da plutocracia, aguentou os deboches da TV Globo. Sou o único ex-ministro da Fazenda, além do Ricúpero, que não foi trabalhar em banco depois de deixar o cargo. 37 anos de vida pública, com oportunidades para não ser sério. Pois é mais fácil ser sério sem ter tido oportunidades. Mudei de partido a vida inteira para pensar a mesma coisa. Aceitei ser ministro no primeiro governo mas não no segundo do Lula nem no da Dilma, por contestar algumas coisas em privado e depois em público.

“Quando fizemos o Plano Real, o PT cometeu o desatino, como antes quando ficou contra a Constituinte, de atacar a medida. Ao ser chamado para ser ministro de Itamar, liguei para Lula e para o Brizola. Eles articulavam a chapa conjunta para serem candidatos, um à presidente e o outro a vice. Eu disse ‘Lula, seu pessoal está te enganando, o que o Mercadante está dizendo é falso” – Ciro Gomes

DM – Como governar com um partido com bancada pequena?

Ciro Gomes – Que tamanho tinha o PSDB quando FHC foi eleito? Eu era o único governador do partido e tínhamos 18 deputados. FHC não precisou negociar para se eleger, foi o Plano Real. Se ele tivesse um projeto e apresentasse ao Congresso, o Brasil seria outro. O PSDB e PT implantaram um ceticismo como se somente eles pudessem ser alternativas de poder. Mas eles chegaram ao poder central com menor tamanho do que outros partidos, como eram o PMDB e o PFL. Na minha vida política trabalhei com 41 vereadores quando prefeito, com a maioria de deputados estaduais quando fui governador. Houve uma coesão, pois fui o intérprete de uma vontade coletiva. Isto é o que falta ao Brasil. Qual foi o projeto de FHC? Nenhum. O Ceará em meu governo coesionou-se em torno de uma ideia, nunca perdi uma eleição lá, é o que falta ao Brasil. Propor e identificar. FHC foi eleito com a força do mundo todo. Poderia ter reformado o país no rumo que quisesse. Qual foi a primeira proposta de Lula que não passou? O FHC, que é bom de retórica, inventou o termo “presidencialismo de coalizão” para justificar as picaretagens. Qual foi a proposta concreta que foi feita por esses dois, FHC e Lula, a quem o povo brasileiro deu a oportunidade de refundar o país, com a força do mundo todo? Nenhuma. Getulio e JK viveram épocas muito piores. Naquele tempo era a truculência da sargentada, americanos financiando academias de torturas. Hoje para se dar um golpe são necessárias filigranas mais complexas. FHC teve um tapete vermelho para propor mudanças estruturais, é um traidor, Lula teve outro tapete, é um hábil, pensou assim ‘quer saber, não vou brigar com o centro do poder, faço uma aliança com eles aqui e consigo paz para tirar alguma coisa para a turma acolá’. E foi o que ele fez. Ele fez um pacto com adversário que tinha até medo de ser esmagado. Eu estava lá, eu era ministro do Lula, eu reunia sete horas da manhã com ele. Ele resistiu em um primeiro momento a fazer a aliança com o PMDB, que o José Dirceu queria desde sempre, eu vi a briga diversas vezes. Em um segundo mandato ele decidiu não brigar mais…

 

DM – Qual a sua avaliação do atual estágio da Operação Lava Jato?

Ciro Gomes – Eu ainda vejo a Lava Jato com olhar positivo mas estou inquieto com as distorções e manipulações. As delações estão destruindo o pacto conservador, que nunca esteve compromissado com a ética (o senhor ia para uma roda contar como seviciou uma escrava, políticos dão calotes em bancos estatais e arrotam discursos éticos, grandes grupos da imprensas recebem fortunas sem serviços que justiquem isto), a elite não tem amor ao valor ético. A lei de delação premiada é novidade constitucional do governo Dilma. Houve um republicanismo original na composição do STF na era do PT, com exceção do Toffolli, com a nomeação de um negro e mulheres. Era natural que o Brasil avançasse em reduzir limites da impunidade. Será que isto é um ponto de inflexão histórica? Vamos ver no futuro. Aparece de um lado uma inspiração facistóide que endeusa juízes… Como consciência jurídica, sinto necessidade de levantar a voz contra os abusos. É muito estranho o país ter um juiz como herói… E os outros juízes? Estamos cansados de impunidade. Eu denuncio excessos como gravar presidente da República e divulgar o grampo, por exemplo, tudo que pode ser anulado depois. Operação Santiagrara que o diga.

 

DM – E possível consertar o Brasil?

Ciro Gomes – JK teve êxito depois de 1954, que foi uma guerra interna e externa, americanos tinham até planos de ocupação do nordeste, eu vi, eu pesquisei na Biblioteca do Congresso nos EUA. Em 1954 Getúlio Vargas faz um manifesto e mete um tiro no peito. Não é meu modelo para o Brasil, foi um camaleão que se adaptou aos tempos, foi o homem da CLT mas também do flerte com o fascismo, da ditadura que prendeu e torturou, entregou Olga aos nazistas. Em 1955 JK ganha eleição neste campo, tem contra si tentativas de golpes e até assassinatos, mas ele consegue atravessar tudo e chegar como um dos três presidentes eleitos que conseguiram terminar um mandato na história moderna do Brasil. Dilma não pode ser contada, pois mandato com reeleição é como se fosse um apenas, com um plebiscito no meio. Eu não estou fazendo campanha, ainda. Quando eu for fazer campanha, vou avaliar a conjuntura e descobrir qual a tática eleitoral. Vou fazer o teatrinho eleitoral na hora certa. Agora o debate é o seguinte: abrir a cara, quem está vendo o problema do Brasil e de que jeito. E a frente que eu quero construir, não é eleitoral, não me interessa. A única coisa que vai coesionar o Brasil é uma ideia, um projeto que tenha começo, meio e fim, que tenha nexo dialético com o status quo brasileiro, que responda com concretudes as contradições e angústias, por isto estou sendo chato, pois esta é a última hora para fazer isto. Sabe o que vai acontecer se a gente não forçar a mão para isto? O seu Luis Inácio da Silva candidato, o senhor Dória candidato, e a gente pelo meio… Escolhe.  (“Que horror!”, gritaram vozes da plateia, em meio a risos.)

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