Politica

Fidel Castro, morto aos 90, já entra para a História dos séculos XX e XXI

Diário da Manhã

Publicado em 27 de novembro de 2016 às 01:00 | Atualizado há 2 semanas

  •  Revolucionário fez reforma agrária, estatizou empresas, sofreu embargo e virou farol do socialismo internacional
  •  Convertido em ditador, fuzilou contrarrevolucionários, perseguiu homossexuais e apoiou as invasões da URSS
  •  Ele escapou de centenas de tentativas de assassinato e enviou espiões aos EUA para impedir terrorismo em Cuba
  •  Advogado marxista, depois de 49 anos, deixou o poder, em 2006, para o irmão, o também  comunista Raúl Castro
  • – A história me absolverá!

     

    Autor da frase pronunciada no turbulento ano de 1955, o revolucionário e depois ditador de Cuba, ilha de apenas 11 milhões de habitantes, colonizada por espanhóis, Fidel Castro Ruz morreu na noite da última sexta-feira, aos 90 anos de idade. O anúncio foi feito pelo presidente do país, o seu irmão, Raúl Castro. Em cadeia nacional de TV e rádio. A ilha é um dos últimos redutos do socialismo. ‘El comandante’, como era chamado, exerceu o poder por 49 anos. O funeral inicia-se hoje, e o enterro deve ocorrer no próximo dia 4 de dezembro.

    Nascido no dia 13 de agosto de 1926, em Birán, leste do País, ele era filho de um proprietário de terras natural da Galícia, Espanha. Formado em Direito, casou-se, pela primeira vez, com Mirtha Diaz-Balart. O seu primeiro filho também chama-se Fidel. Em 26 de julho de 1953, com um exército maltrapilho, tenta tomar de assalto o Quartel de Moncada. A estratégia era derrubar o presidente de Cuba, Fulgencio Batista. Um sargento mulato ligado aos Estados Unidos. A operação fracassa.  Fidel Castro e Raúl Castro são presos. Em 15 de maio de 1955 é anistiado.

    O homem que queria fazer a revolução é exilado na Cidade do México. Nas terras calientes de Pancho Villa conhece um médico argentino, Ernesto Guevara de La Serna, El Che. Com uma obsessão, remover do poder o ditador de plantão, em 2 de dezembro de 1956, um total de 82 homens embarca no barco de nome Granma em direção à ilha. A repressão política e militar de Fulgencio Batista entra em cena. Revolucionários morrem. Com sete vidas, Fidel Castro, Raúl Castro, Ernesto Guevara de La Sierna se deslocam para a ‘Sierra Maestra’.

    Em 1º de janeiro de 1959 a revolução triunfa. Os barbudos executam a reforma agrária, expropriam as empresas nacionais e estrangeiras, desenvolvem acelerado processo de nacionalização, deflagram campanha de alfabetização e aproximam-se da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas [URSS]. Os EUA fecham a sua embaixada em Cuba. O presidente americano é John Fitzgerald Kennedy. Em 16 de abril de 1961 Fidel Castro declara que Cuba tornara-se um país socialista. O modelo adotado é o soviético.

    Com monopólio do poder político pelo PCC [Partido Comunista], economia estatizada, sem mercado, além de formular a estratégia de exportar a revolução para a América Latina e a África. Registros da história: em 17 de abril de 1961, 1.297 exilados cubanos treinados e apoiados pela CIA, a Agência Central de Inteligência dos EUA,  invadem a Baía dos Porcos. Com a bênção de John Fitzgerald Kennedy. O ataque fracassa. Apenas dois dias depois. A retaliação do Tio Sam veio a galope. Cuba é suspensa da Organização dos Estados Americanos [OEA].

     

    Crise dos mísseis

    O ucraniano Nikita Kruschev, que, em 1956, no XX Congresso do PCURSS, havia denunciado os crimes de Josep Stálin, e em 13 de agosto de 1961 iniciara a construção do Muro de Berlim, que separaria a Alemanha em duas, a Oriental [RDA], comunista, e a Ocidental, capitalista, instala mísseis soviéticos em Cuba. A crise ocorre de 22 a 28 de outubro de 1962. John Fitzgerald Kennedy ameaça Cuba para forçar a remoção dos mísseis nucleares. Dias depois, os soviéticos concordam em retirar as armas. Os EUA decidem não invadir Cuba. Fidel Castro explode em ira

     

    – Criar um, dois, três, mil Vietnans!

    É o que proclama Che Guevara. O argentino que fez a revolução na ilha embarca para a África. Para deflagrar a revolução no Congo.  A revolução falta ao encontro. Clandestino, volta a Cuba. O próximo projeto revolucionário é na Bolívia. Che tem uma passagem clandestina pelo Brasil. O Partido Comunista Boliviano, aliado ao Kremlin, que adotara desde 1945 a política de coexistência pacífica com os EUA, Inglaterra e França, se recusa a implementar a estratégia de luta armada para incendiar, pelas selvas do País, a revolução na América Latina.

    Che Guevara é capturado e executado em 9 de outubro de 1967. O seu rosto estampado em camisas, bandeiras e souvenirs se espalha, como um rastilho de pólvora, pelos cinco continentes. ‘Hay que endurecer, sem perder a ternura jamais!’ A revolução em Cuba, não custa lembrar, fuzilou contrarrevolucionários, enviou homossexuais para campos de concentração, de reeducação e trabalhos forçados, adotou o realismo estético, perseguiu os dissidentes e deu sustentação moral à invasão de Praga, em 1968, e do Afeganistão, em 1979

    Fidel Castro abençoa, em Havana, no ano de1967, a Conferência da Organização Latinoamericana de Solidariedade [Olas].  Carbonário baiano filho de um italiano com uma negra da etnia Haussá, Carlos Marighella, ex-deputado federal comunista pela Bahia, em 1946, sem autorização do PCB [Partido Comunista Brasileiro], cujo secretário-geral era Luís Carlos Prestes, o ‘Cavaleiro da Esperança’, participa do fórum. Expulso do Partidão, ele cria o Agrupamento Comunista e funda a Ação Libertadora Nacional [ALN], para detonar a luta armada no Brasil.

    O apoio de Cuba à luta armada no Brasil ocorre antes do golpe de Estado civil e militar de 31 de março de 1964, que instalou uma ditadura que durou 21 anos. Primeiro, com o exército de sem-terras de Francisco Julião. Depois, com Leonel Brizola. O investimento político, militar e financeiro principal é com a ALN. Três exércitos da organização fizeram treinamento em Cuba. Em um deles, Maria Augusta Thomaz e Márcio Beck Machado, que seriam assassinados em Goiás, na madrugada fria de 17 de maio de 1973, com a participação do capitão Marcus Fleury [GO].

    Em 24 de fevereiro de 1976,  Fidel Castro se converte em presidente de Cuba, então sob nova Constituição. A denominada ‘Fuga de Mariel”, que levaria 125 mil cubanos para os EUA, ocorre em 1980. Ela contribuiria, assim como a invasão da embaixada americana em Terrã, em 1979, para a derrota do democrata Jimmy Carter para o republicano Ronald Reagan, que obteria ainda a reeleição e implantaria o neoliberalismo com Margaret Thatcher, a ‘dama de ferro’ da Inglaterra.  Em 25 de dezembro de 1991, Mikhail Gorbatchev anuncia o fim da URSS.

    Período especial

    Cuba entra no período especial. A crise ameaça a estabilidade na ilha.  Em 14 de agosto de 1993, o governo cubano permite o uso do dólar. Nova crise. Em 24 de fevereiro de 1996: caças cubanos derrubam pequenos aviões de um grupo de cubanos anticastristas baseados em Miami. A operação havia sido denunciada pela Rede Vespa. Um grupo de revolucionários cubanos treinados pelo serviço de inteligência para infiltrar-se entre os anticastristas e descobrir alvos de atentados terroristas que seriam executados na pequena ilha socialista do Caribe.

    Ateu, Fidel Castro recebe, no País, em 1998, o papa João Paulo II, o polonês Karol Woytilla, que contribuiu para a derrocada do socialismo no Leste Europeu. Elián González Gonzáles, um me-nino, é a bandeira de Fidel Castro, em 2000. Em 2001, ele sofre um desmaio, em público. No ano de 2006, afasta-se do poder. Raúl Castro assume. O primeiro-irmão executa reformas liberais, controladas pelo alto pelo PCC. Barack Obama e Raúl Castro reatam as relações diplomáticas entre EUA e Cuba. Em 25 de novembro de 2016, aos 90 anos, morre Fidel Castro Ruz.

    – Revolucionário, ditador ou os dois?

     

    Renato Dias, 49 anos, jornalista formado pela Alfa, sociólogo graduado pela UFG, especialista em Políticas Públicas [UFG], mestre em Direito e Relações Internacionais [PUC] e autor de ‘Pequenas Histórias – Cuba, hoje – Uma revolução envelhecida ou a reinvenção do socialismo? – A reaproximação entre Havana e a Casa Branca’. O autor lança, em dezembro, obra sobre a Grécia, hoje. Contato:  [email protected]

     

    1959 Em 1º de janeiro cai Fulgencio Batista.É a revolução em  Cuba, que viraria socialista em 1961

    fidel

    CRONOLOGIA

    13 de agosto de 1926 –  Nasce Fidel Castro Ruz. Local: uma próspera propriedade rural próxima da localidade de Birán, leste de Cuba

    1945 – Fidel Castro começa a estudar Direito em Havana

    12 de outubro de 1948 – Ele se  casa com Mirtha Díaz-Balart, com quem tem um filho, Fidel. O casamento duraria até 1954

    26 de julho de 1953 – Fidel Cabeça lidera um ataque com 120 homens ao quartel de La Moncada, em Santiago de Cuba. O grupo é derrotado. No julgamento, Fidel Castro profere a sua famosa defesa: – A História me absolverá!

    15 de maio de 1955 – Após 22 meses na prisão, Fidel Castro é libertado. É exilado no México, onde conhece o médico argentino Ernesto Guevara de La Serna, Che

    2 de dezembro de 1956 – Fidel Castro, seu irmão Raúl Castro, Che Guevara e outros 79 revolucionários desembarcam na ilha, no barco chamado ‘Granma’

    1º de janeiro de 1959 – O ditador Fulgencio Batista deixa Cuba e os revolucionários liderados por Fidel Castro tomam o poder.

    3 de junho de 1959 – Entra em vigor a lei da reforma agrária

    13 de fevereiro de 1960 –  O vice-primeiro-ministro soviético, Anastas Mikoyan, visita Cuba e celebra acordos de comércio de açúcar e petróleo, os primeiros em mais de 30 anos

    7 de maio de 1960 – Havana e Moscou renovam suas relações diplomáticas

    17 de maio de 1960 – O presidente dos Estados Unidos, Dwight Eisenhower, aprova o treinamento de uma força de invasão anticastrista pela CIA.

    5 de junho de 1960 – Cuba nacionaliza refinarias de petróleo americanas por se recusarem a refinar petróleo soviético. Quase todos empreendimentos dos EUA na ilha são expropriados

    Outubro de 1960 – Washington proíbe exportações a Cuba, à exceção de comida e remédios

    3 de janeiro de 1961 – A embaixada dos EUA em Cuba é fechada

    Abril de 1961 – Cuba lança uma campanha de alfabetização em massa que ensinará 700 mil pessoas a ler e a escrever

    15 de abril de 1961 – Dois aviões americanos, pintados como aeronaves cubanas, bombardeiam a ilha

    16 de abril de 1961 – Fidel Castro declara Cuba um Estado socialista

    17 de abril de 1961 – 1.297 exilados cubanos treinados e apoiados pela CIA invadem a Baía dos Porcos. O ataque fracassa dois dias depois

    22 de janeiro de 1962 – Cuba é suspensa da Organização dos Estados Americanos (OEA)

    7 de fevereiro de 1962 – Washington proíbe todas as importações de produtos cubanos

    22 a 28 de outubro de 1962 – O presidente americano John Fitzgerald Kennedy, que morreria em 22 de novembro de 1963, ameaça Cuba para forçar a remoção de mísseis nucleares soviéticos. Dias depois, os soviéticos concordam em retirar as armas, e Kennedy decide não invadir Cuba; Fidel Castro fica irado com Nikita Kruschev

    3 de outubro de 1965 – É fundado o Partido Comunista Cubano, com Fidel Castro como primeiro-secretário

    9 de outubro de 1967 – Ernesto Che Guevara é morto na Bolívia

    Março de 1968 – O governo de Fidel Castro encampa praticamente todos os negócios privados do país, menos pequenas propriedades agrícolas

    24 de fevereiro de 1976 – Fidel Castro se converte em presidente de Cuba, sob nova Constituição

    Abril de 1980 –  Fidel Castro permite que cubanos possam deixar o país. Começa a crise de refugiados, e cerca de 125 mil pessoas abandonam Cuba até setembro de 1980. Fuga de Mariel

    25 de dezembro de 1991 –  Fim da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas Soviéticas [URSS] acaba com a ajuda a Cuba

    1991-1992 – 1993 – Período especial

    14 de agosto de 1993 –  O governo cubano permite o uso do dólar

    24 de fevereiro de 1996 – Caças cubanos derrubam pequenos aviões de um grupo de cubanos anticastristas baseados em Miami

    Outubro de 1997 – Fidel Castro reafirma a indicação de seu irmão mais novo, Raúl Castro, como o seu sucessor

    Janeiro de 1998 – O papa João Paulo II visita Cuba

    Novembro de 1999 – Pescadores da Flórida resgatam, depois de um naufrágio, Elián González, um menino de cinco anos que havia saído ilegalmente da ilha com sua mãe. Durante sete meses, Havana e exilados cubanos em Miami lutam por Elián González. Com o apoio de Fidel Castro, o pai pede o retorno do menino. Elián González  regressa a Cuba em 28 de junho de 2000

    23 de junho de 2001-  Fidel Castro tem um leve desmaio durante um discurso sob sol forte

    16 de dezembro de 2001 – Embarcações de milho e frango congelado chegam a Cuba, representando as primeiras vendas diretas de comida americana ao País em quase 40 anos

    6 de março de 2003 – Parlamento cubano elege Fidel para seu sexto mandato de cinco anos como presidente do Conselho de Estado, órgão supremo do governo cubano

    18 de março de 2003 – Setenta e cinco dos críticos mais radicais de Fidel são sentenciados a penas de seis a 28 anos de prisão; 27 jornalistas são presos

    20 de outubro de 2004 – Fidel Castro tropeça e cai após um discurso, quebrando o braço direito

    2 de fevereiro de 2005 – Fidel Castro chama o presidente americano, George W. Bush, de “perturbado”, em resposta à declaração dos EUA de que Cuba seria um berço de tirania

    31 de julho de 2006 – Fidel Castro cede temporariamente poderes a Raúl Castro para passar por uma cirurgia gastrointestinal

    Novembro de 2006 – O presidente venezuelano, Hugo Chávez, visita Fidel Castro

    19 fevereiro de 2008 – Em carta renúncia publicada no jornal Granma, Fidel Castro anuncia que não voltará a ocupar a presidência do País

    17 de dezembro de 2014 – EUA e Cuba anunciam a normalização das relações diplomáticas entre EUA e Cuba

    20 de julho de 2015 – Cuba reabre embaixada em Washington.

    14 de agosto de 2015 – EUA reabrem sua embaixada em Havana.

    19 de setembro de 2015 – papa Francisco faz visita histórica a Cuba e é recebido por Fidel Castro

    25 de novembro de 2016 – Morre Fidel Castro, aos 90 anos

     

     

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